Lucro, Crescimento, Estilo de Vida e Propósito: qual é o drive do seu negócio?

Bruno Peroni
VC sem ego
Published in
6 min readMar 17, 2020

Por mais que possa parecer estranho, é perfeitamente possível que uma empresa que passe anos sem dar lucros seja um excelente investimento.

Esse raciocínio seria tratado como loucura há pouco mais de uma década. Cada vez mais, empresas que prometem prejuízos durante anos seguidos recebem investimentos com valuations bilionários e até abrem capital.

Ao contrário do que pode se pensar no senso comum, não se trata de racionalidade limitada ou de uma bolha de investidores fora da realidade. Estamos falando da apropriação de uma outra lógica de pensamento, que entende a temporalidade, o retorno, os riscos e o sentido do investimento a partir de outra lógica. Diferente da lógica tradicional de empresa = lucro.

No meu entender, existem quatro tipos de empresa no que tange a suas missões, aos seus objetivos finais, seu DRIVE: Lucro, Crescimento, Estilo de Vida e Propósito.

Para além de qualquer juízo de valor, essa caracterização pode ajudar a esclarecer investidores sobre o tipo de negócio que estão analisando ou para empreendedores entenderem qual é o seu objetivo ao empreender.

Drive de Lucro 💲

O dia-a-dia de boa parte dos empreendedores. Photo by Austin Distel on Unsplash

Empresas com drive de lucro são empresas voltadas para o sentido mais fundamental de um negócio no capitalismo. Isto é, foram concebidas e são administradas para auferir lucro aos acionistas que aportaram capital, otimizando recursos, tempo e investimentos.

Startups raramente são empresas com drive de lucro, pois estas procuram manter os custos operacionais baixos e geralmente tem uma baixa taxa de reinvestimento dos lucros no próprio negócio.

Quase todos os negócios tradicionais e de empreendedores por necessidade se encaixam nessa categoria. Eles tem um drive de lucro porque muitas vezes é a única opção.

Bootstraping

O Mailchimp, por exemplo, é um caso famoso de um unicórnio invisível, isto é, de uma empresa altamente lucrativa, valendo US$ 400 milhões, mas que não costuma entrar no radar dos investidores mais deslumbrados, que olham para unicórnios e valuations.

O Basecamp é outro caso emblemático de case que defende negócios de tecnologia lucrativos desde o momento zero e um ambiente de negócios mais saudável, calmo e focado no longo prazo. Recomendo fortemente todos os livros do fundadores: Remote (excelente em tempos de isolamento social), Rework e It Doesn’t Have to be Crazy at Work.

Drive de Crescimento 🚀

Os famigerados unicórnios! Photo by James Lee on Unsplash

Empresas com drive de crescimento são organizações voltadas prioritariamente para ganhar mercado. A maior parte das startups que buscam investimento de Venture Capital se encaixam nesse modelo.

Como apresentado por Peter Thiel em seu seminal livro Zero to One sobre startups, estas empresas tem como objetivo criarem monopólios.

Como os valuations de investidores de risco costumam ser calculados em função do crescimento, da tração, essa prioridade costuma estar na frente de tudo nesse tipo de negócio, que pode demorar anos para se consolidar como um investimento realmente lucrativo.

Escala > Lucro

Para empresas com drive de crescimento o lucro é muitas vezes visto como desperdício, já que o dinheiro é utilizado como combustível para crescer o mais rápido possível e dominar um mercado.

O exemplo mais clássico de sucesso desse tipo de empresa é a Amazon.com. Durante anos, o preço das ações da empresa cresceu de maneira significativa, com as receitas crescendo entre 20% e 40% ao ano, a despeito dos problemas de margem em meados de 2015 (menos de 1% da operacional).

Em 2018, a Amazon anunciou um crescimento de 24% nas vendas comparado ao último ano, de US$ 70 bilhões, comparado a um lucro de US$ 2,1 bilhões, 28% menor no mesmo período. Mesmo sendo um negócio gigante, a Amazon continua crescendo como uma startup.

Um negócio que nunca pagou dividendos, mas que em valor de mercado cresceu 13x nos últimos 10 anos, se tornando uma das maiores empresas do mundo.

Drive de Estilo de Vida 😎

Empreendedora trabalhando da Tailândia. Photo by Anton Shuvalov on Unsplash

Empresas com drive de estilo de vida são empresas concebidas com o objetivo de construir uma vida específica para seus fundadores. Isso pode incluir trabalhar de qualquer lugar, ganhar dinheiro trabalhando apenas quatro horas diárias, conseguir empreender dentro do setor de arte, dentre outras coisas.

Aqui, estamos diante de empresas que são o oposto do modelo tradicional de startup, em todos os aspectos possíveis.

Muitas vezes empreendedores de estilo de vida querem apenas ser empreendedores. Embora pareçam querer criar negócios com drive de lucro ou de crescimento, o que buscam na verdade é poderem ter o cargo de CEO e vender suas empresas rápido para sustentar um estilo de vida extravagante.

Esse é um tipo muito perigoso de empreendedores para qualquer investidor de risco.

Exemplos desse tipo de negócio se encontram no mercado imobiliário, com corretores de imóveis de alto padrão, empresas de software distribuídas, consultorias, empresas de cursos e influenciadores, como é o caso do Tim Ferris ou aqui no Brasil do Érico Rocha e dos seus seguidores (fórmula de lançamento e empreendedorismo de infoprodutos).

Drive de Propósito 🌱

Mulheres na fila para pedir microcrédito na Índia. Fonte: The Conversation

Empresas que podem ser classificadas com drive de propósito foram criadas e existem para realizar sua missão institucional, mesmo que isso prejudique o crescimento, estilo de vida e o lucro. Costumam ser fundadas por visionários, que não raro dão com a cara na parede.

Porém, como baseiam seus produtos numa mensagem de sentido, quando conseguem se estabelecer em cima de uma boa tese, tornam-se praticamente insuperáveis no seu nicho de atuação. Nas palavras de Simon Sinek, elas começam com o Porquê.

Quase todos os negócios de impacto se encaixam nessa tipificação.

Dois casos do mesmo mercado de empresas Purpose-driven são Kickstarter e Natura. As duas são empresas muito diferentes mas são Benefit Corporations ou Empresas B, um tipo de certificação de empresas que as obriga legalmente a seguir os interesses de todos as partes envolvidas e não apenas dos acionistas e prestar contas sobre o seu impacto.

A primeira, foi a grande plataforma de crowdfunding de recompensa, que escalou esse modelo e que permitiu o desenvolvimento de milhares de projetos criativos em todo o mundo. De acordo com a sua carta de princípios, a missão do Kickstarter é ajudar projetos criativos a ganhar vida e que isso é mais importante do que lucro.

A Natura, mesmo sendo um incrível case brasileiro de inovação, também é uma amostra de que mesmo grandes empresas, de capital aberto, podem ser Purpose-driven. Esse compromisso fica muito claro na visão de sustentabilidade da empresa.

Acredito que esses quatro tipos de negócios não são excludentes. Toda empresa possui um mix de cada uma dessas categorias.

Afinal, renegar terminantemente o lucro jogaria a organização para o plano de organizações sem fins lucrativos.

Não pensar em crescimento, por sua vez, significa estar sujeito permanentemente a riscos de superação em face de outros players do mercado em um mundo extremamente veloz.

Por outro lado, cada organização traz na sua organização interna e cultura um estilo de vida que acredita como atrativo para os seus fundadores, diretores, colaboradores e stakeholders.

Finalmente, ignorar completamente o propósito da sua marca acaba tornando muitas companhias escravas de estratégias de marketing que não se calcam em vínculos emocionais mais duradouros com seus clientes.

O que é fundamental é que esse drive esteja claro em todas as organizações, principalmente para os fundadores e diretores do negócio, para que sócios, colaboradores e investidores possam saber onde estão se metendo.

Sem fit, não se vai para lugar nenhum.

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Bruno Peroni
VC sem ego

Venture Capital, Inovação e Startups; VC @ Astella ; Host @ A Virada Podcast