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Plataformas, negócios integrais e o fim das categorias

Bruno Peroni
VC sem ego
Published in
7 min readFeb 19, 2020

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Essa ideia tem me acompanhado durante as últimas semanas e decidi estruturar e compartilhar com o mundo para receber feedbacks e abrir para discussão.

A ideia é a seguinte:

A verdadeira disrupção não será liderada por negócios digitais, mas sim por negócios de plataforma que estão se tornando negócios integrais.

Primeiro, o que quero dizer com negócios digitais

Negócios digitais, de acordo com a Wikipedia são: tipo de entidade de negócios que focam no desenvolvimento e manufatura de produtos de tecnologia digital ou fornecendo tecnologia como um serviço.

Ou seja, são empresas que vendem software ou hardware. Vendem ferramentas que mudam a maneira como empresas e pessoas trabalham, com mais velocidade, menores custos, e maior precisão.

Alguns exemplos óbvios de empresas digitais são Apple e Microsoft (no início) ou então Slack e Zoom. São empresas de hardware e software. Elas criaram novos mercados e seus produtos formam a infraestrutura e as ferramentas de trabalho a todos os trabalhadores do conhecimento.

Porém, estas empresas não transformaram mercados estabelecidos. Certamente alguns mercados foram destruídos ou sofreram, como os mercados de mainframes, feature phones, hardware de videoconferência e publicidade física, por exemplo.

Isso faz parte da destruição criativa. Não existe inovação sem algum tipo de destruição.

Mas nada se compara com a disrupção causada por empresas de plataforma, como o Uber.

Disrupt, verb: previnir algo, como um sistema, processo ou evento, de continuar de forma usual ou esperada. Interromper, romper, quebrar, desfazer, despedaçar e rebentar.

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O Uber não é uma empresa de tecnologia, mas sim de plataforma

Apesar de listada na categoria de tecnologia da Nasdaq, eu considero a Uber uma empresa de plataforma. Ou seja, ela não vende software. Ela UTILIZA software para entregar uma plataforma de transporte que conecta duas pontas. Mas ela se responsabiliza pela oferta. Caso você tenha um problema com um motorista ou não encontre motoristas, você vai responsabilizar a Uber.

A Uber não é só um sistema de busca de táxis. No meu modelo, Easy e 99 são empresas de tecnologia. OK, elas coletam pagamentos, mas apenas por uma questão de conveniência em um momento onde nem todos os taxistas tinham máquinas de cartão.

As plataformas, por sua vez, abrem espaço para que outros players entreguem parte da oferta e quebram barreiras. Com isso, destroem papeis e abrem mercados.

E muitos negócios digitais também operam negócios de plataforma. A própria Apple que no início vendia hardware hoje opera o iTunes, a App Store e a Apple TV, três plataformas imensas. A Amazon no início era um e-commerce de livros e hoje é um marketplace para quem quiser vender o que quiser, físico ou digital, além de ter o Prime, uma plataforma de vídeo. E a Microsoft possui uma das maiores plataformas de games, o XBOX.

Plataformas utilizam tecnologias digitais no seu core, mas fornecem mais do que apenas tecnologia. São o que eu chamo de os novos intermediários.

O Uber não apenas conecta motoristas e passageiros, mas é responsável pela triagem e seleção desses motoristas.

A Amazon não apenas conecta varejistas e consumidores, mas opera um complexo negócio de logística.

A Netflix são só conecta pessoas com filmes e séries, mas fornece a infraestrutura para assistí-los.

Esse não é um conceito novo e o impacto do conceito das plataformas foi muito bem analisado por Ming Zeng, no seu framework de estratégia ainda não muito mainstream plano, linha e ponto. Basicamente ele define que as empresas devem escolher um posicionamento estratégico no novo mundo de transformação digital.

Pontos são empresas especializadas, que entregam valor para uma parte da cadeia mas não sobrevivem sozinhos. Aqui entram as empresas de tecnologia.

Linhas são empresas tradicionais que organizam uma cadeia de valor para entregar seus produtos e serviços. São as empresas que estão sofrendo mais com a transformação digital, pois as linhas estão sendo quebradas e cada vez é mais fácil organizar cadeias.

E os planos são as plataformas, onde as linhas e planos interagem.

Para quem quiser se aprofundar, vale a pena ler o seu livro sobre o case da plataforma Alibaba.

Aliás a equipe de executivos da Magazine Luíza, descreve muito bem o conceito de plataforma em sua última mensagem aos acionistas, disponível no final desse documento.

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Qual é o próximo passo do Uber e das plataformas? Ser uma empresa integral

Desde o IPO do Uber, os seus planos de futuro ficaram mais claros. A empresa pretende desenvolver e operar veículos próprios, integrar outros modais e fornecer soluções financeiras. O Uber está cada vez mais se distanciando de uma empresa de plataforma para se tornar uma empresa de transportes integral.

Na minha visão, negócios integrais são: negócios tech-enabled que utilizam tecnologia como um diferencial para substituir players existentes, de modo a entregar uma experiência de usuário completa.

São o terceiro estágio do processo de transformação digital.

Esses negócios tendem a ser grandes consolidadores de setores, pois tendem a utilizar as suas vantagens competitivas de tecnologia de forma proprietária para entregar uma experiência extremamente superior às existentes. São as empresas que vem depois das plataformas.

Isso faz muito sentido em um momento na história onde a tecnologia é onipresente. Todos os setores já são impactados por tecnologia, afinal, software is eating the world.

As empresas integrais realizam integrações da cadeia de valor em massa por meio de tecnologia, de forma vertical, ou seja na mesma cadeia, ou de forma horizontal, avançando em outros setores.

E não é só o Uber que está nesse movimento.

Exemplos de integrações verticais:

  • O QuintoAndar não é uma plataforma de conectar inquilinos e proprietários, mas uma imobiliária online. Integrou diversos serviços, incluindo reforma do apartamento, financiamento e seguros.
  • A Loft também. Até integram a prestação de serviços de customização dos imóveis vendidos e um pós venda que ajuda o comprador a ter uma melhor experiência.
  • A Warren não é uma corretora que funciona como plataforma, mas também uma gestora e administradora. Já possui inclusive produtos de previdência e criptoativos e tem planos de inserir serviços bancários. E mesmo a XP tem integrado cada vez mais serviços proprietários, como a XP Asset, Previdência e M&A.
  • O Ifood Loop vai além da plataforma de entrega e verticaliza o serviço de preparação de refeições simples e baratas, já que conhece como ninguém os hábitos de consumo. E a Rappi já está investindo em cozinhas compartilhadas para os players do seu ecossistema.
As refeições vendidas pelo próprio iFood
  • Os produtos da Amazon Essentials, são produtos de alto volume e baixa complexidade vendidos pela própria Amazon com marca própria.
  • A Netflix e o Spotify já fizeram movimentos consistentes de verticalização, produzindo conteúdo próprio para suas próprias plataformas.
Carro elétrico lançado pela Sony na últimas CES

Exemplos de integrações horizontais:

  • A Sony lançou recentemente um carro elétrico.
  • A Apple lançou recentemente um cartão de crédito e há tempos fez o movimento para música, servidores e vídeo.
  • A Toyota está lançando uma cidade inteligente.
  • A Nestle acabou fazendo máquinas de café.
  • O Google já opera em telefonia, internet, carros autônomos, turbinas eólicas e saúde.
  • O Facebook entrou no segmento de games com a Oculus.

Como visto, diversas outras empresas que construíram negócios digitais ou de plataforma de grande sucesso agora estão se tornando negócios integrais, integrando velozmente de forma vertical e horizontal. Todas as big techs estão nesse movimento.

É o início do fim dos setores e das categorias de negócio.

E não sou só eu que estou falando disso. A PwC já falou disso em 2017 e o fundo a16z fala neste vídeo porque todas as empresas serão fintechs.

A tecnologia está permitindo a criação de novas entidades integrais potencializados por tecnologia que realmente irão comer os incumbentes. E quem já está na melhor posição para criar negócios integrais são as plataformas.

De acordo com a teoria de Zeng, os planos irão engolir as linhas e talvez até alguns pontos. Irão engolir até os players do seu próprio ecossistema. Se tornarão universos.

Isso já está acontecendo e está sendo pouco falado.

E como se posicionar neste mundo de grandes negócios integrais?

Como se proteger da integração vertical e horizontal massiva?

O que fazer se você opera em um setor tradicional?

Vou falar disso nos próximos artigos.

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Bruno Peroni
VC sem ego

Venture Capital, Inovação e Startups; VC @ Astella ; Host @ A Virada Podcast