Agendamento

Luiza Mello
Wiki FAC
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8 min readNov 24, 2015

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Resumo:

O seguinte verbete apresenta a descrição do termo “ agendamento”, a partir da visão de 4 autores: Davi de Castro, Donald Shaw, Maxwell McCombs e Walter Lippmann. O objetivo aqui é apresentar a origem do conceito, como ele se transformou ao longo das últimas décadas na visão destes autores, como o público percebe o fenômeno do agendamento, quais são os possíveis fatores externos que influenciam esse processo e qual é a aplicação do termo em nosso cotidiano.

Histórico:

O pensamento acerca do agendamento dos temas tratados pela imprensa teve início em 1922, quando Walter Lippmann começou a estudar a influência dos meios de comunicação em relação à definição dos interesses públicos. Ele, apesar de não utilizar o termo “agenda-setting”, foi o primeiro a discutir ideias que viriam a ser a base da Teoria do Agendamento, formulada por Maxwell McCombs e Donald Shaw.

Vários são os fatores que podem influenciar a opinião pública. Além dos clássicos aspectos econômicos, culturais e sociais, a quantidade excessiva ou não da exposição de um indivíduo aos mass media também influi em sua opinião:

“Para Lippmann (2008), as imagens mentais que nos habitam são formadas também, em boa parte, a partir dos meios de comunicação. Adquirimos conhecimentos de eventos distantes e que, não fossem os mass media, provavelmente nunca ficaríamos sabendo. Os meios de comunicação seriam uma espécie de janelas pelas quais temos acesso a informações que nos ajudam a construir imagens de eventos e nossos mapas cognitivos mentais.” (CASTRO, 2014, p. 35) ¹

A partir desses estudos iniciais, a dupla de professores norte-americanos investigaram as campanhas presidenciais de Hubert Humphrey e Richard Nixon em 1968. E, assim chegaram à conclusão de que os assuntos políticos considerados como mais importantes pelos eleitores são também os que mais ganham destaque e que mais são discutidos nas notícias.

Depois disso, eles decidiram aprofundar os estudos e aprimorar as pesquisas, definindo agendamento como “essa capacidade de influenciar a constituição das imagens em nossa mente e, com isso, estabelecer os temas em nossa agenda que passou a ser denominada a função de agendamento dos meios de comunicação (MCCOMBS, 2004).” ²

Portanto, na prática, podemos perceber que a mídia, a partir das discussões que promove em seu meio, define quase tudo o que fará parte das discussões públicas e sociais. É importante lembrar que, na Teoria da Agenda, é amplamente ressaltado que o papel da mídia não é o de definir a opinião pública, mas somente o tema acerca do qual uma opinião será formada. É claro que, por não ser completamente imparcial, ela acaba por influenciar na tomada de decisão de um indivíduo. Entretanto, essa não é a sua função primordial, aos olhos da teoria de McCombs e Shaw.

Alguns autores, entre eles Davi de Castro Magalhães, 2014, foram um pouco além da discussão central e questionaram os fatores que levam um tema a ser incorporado, realmente agendado pelos receptores. Para responder isto, foi definido que o tema deve se tornar relevante a partir do desconforto psicológico. Ele deve ser misterioso para o público, no sentido de que, são agendados aqueles temas dos quais as pessoas não têm muita informação. E, além disso, devem ser temas que não afetam diretamente a rotina das pessoas, pois essas mudanças são percebidas facilmente e não precisam estar presentes nas páginas de um jornal, por exemplo.

Ainda superando os estudos menos profundos a respeito do agendamento dos mass media, Magalhães busca algumas influências externas que podem afetar o processo de agendamento. Uma delas — e talvez a mais forte de todas — é a política, que também cria e leva a público suas próprias pautas. Outra bastante relevante é representada pelas outras mídias, que não são tão consolidadas e perpétuas quanto as impressas. Elas acabam por promover o chamado agendamento intermídia. A terceira e última delas é a opinião pública. O autor da tese de mestrado Agenda-setting e Internet: tendências e perspectivas de pesquisa, amparado por McCombs, argumenta que “os mass media ‘não são ditadores todo poderosos da opinião’ (2014, p.56) e nem mesmo possuem a capacidade de estabelecer sua própria agenda totalmente desconectado do mundo que os cerca.”, assim eles acabam por causar o processo de agendamento reverso. ³

No ano de 2012, McCombs e Shaw, aliados aos pesquisadores Guo e Vargo, desenvolveram uma nova pesquisa acerca do tema. A nova pesquisa atualiza as conclusões da Teoria da Agenda ao dizer que

De acordo com essa nova formulação, a mídia pode não apenas moldar a importância de atributos e objetos separadamente, mas também “embrulhar” um objeto com um atributo e torná-lo relevante na mente do público, simultaneamente (MCCOMBS, GUO, 2013). Ou seja, a mídia pode não somente agendar um tema ou um atributo deste tema, mas influenciar o agendamento do tema e ainda a ênfase em determinado aspecto desse tema. (CASTRO, 2014, p. 57) 4

Eles definem o novo modelo de Agenda-Setting como a influência da mídia não apenas no estabelecimento do assunto e em como ele será pensado; mas um modelo que também nos dirá como relacionar temas e suas particularidades para dar sentido ao mundo.

Tratando-se da internet, pode-se dizer que é um meio de comunicação bastante democrático. Isto permite que pessoas que normalmente não teriam voz perante um grande canal midiático tornem-se produtoras de conteúdo. Tornando-as capazes de “influenciar a produção de conteúdo na mídia noticiosa, conduzindo mudanças na estrutura de poder entre a mídia e o público no processo de agendamento (tradução livre, LUO, 2011, p. 50)”. 5

Deve ser pensado ainda o fato de que com o surgimento das mídias socias, que se propagam por meio da internet, o público torna-se bem mais seletivo. Agora, com a possibilidade de seguir, curtir, compartilhar e publicar, cada um tem a opção de escolher os assuntos que realmente são relevantes para si.

Como consequência desse processo de emponderamento público, temos uma multiplicação do número de fontes emissoras opinião disponíveis. O que acaba por influenciar o andamento do agendamento na sociedade atual. Acerca deste fenômeno é possível citar o exemplo de como as grandes corporações (públicas ou privadas), ao terem que se adaptar rapidamente a esta situação, recorrem aos formadores de opinião online para divulgar seus produtos, serviços e ideologias.

O que nos faz perguntar se esse seria um novo tipo de agendamento. Além disso, essa nova aplicação da teoria provoca questionamentos como “em que isso pode influir na hipótese do agendamento?” Com todas essas diferenças em relação a acessibilidade do conteúdo “quais temas as pessoas consideram mais importante?”

Estes questionamentos criam uma nova discussão que, na verdade, ainda não alcançou um consenso. Tudo que se sabe é que, apesar da ascensão e da consolidação das novas mídias, a mídia tradicional ainda exerce uma influência considerável na agenda pública.

Isso ocorre também quando tratamos da comunicação de uma organização. Várias são as ocasiões em que as empresas levam os canais midiáticos a selecionarem o caso que mais convém tornar público, visando muitas vezes o benefício próprio. Uma situação que exemplifica esse fenômeno é o caso da última copa do mundo que ocorreu no Brasil entre os meses de junho e julho de 2014. Pouco tempo depois da realização de inúmeros protestos a respeito dos orçamentos e gastos absurdos destinados à realização da copa no território brasileiro, os grandes veículos de comunicação, inicialmente, evitaram a transmissão dos protestos, mas à medida que eles tomaram grandes proporções a divulgação destes foi inevitável. Apesar de, num segundo momento, a situação ser divulgada, a transmissão não foi fiel à real demanda do público. Os protestos quase nunca eram mencionados, e quando acontecia de serem noticiados a reportagem tinha uma conotação negativa, com o intuito de desestimular a participação dos cidadãos nas manifestações, ao mesmo tempo em que as partidas de futebol eram constantemente transmitidas e promovidas de todas as maneiras.

Existem também casos em que empresas que cometeram erros catastróficos e que foram acobertados ou omitidos pela mídia. Um exemplo disto é a situação da mineradora Samarco, em Mariana — MG. Em Novembro de 2015, tremores foram percebidos nas barragens. Horas depois, a barragem se rompeu e isso provocou deslizamento de lama por grande parte de um município da cidade. O resultado foi a morte de várias pessoas, enquanto muitas outras ficaram feridas. A tragédia quase não foi mencionada na mídia brasileira.

Alguns dias depois, um ataque terrorista na França causou pânico e horror ao público de todo o mundo (inclusive o brasileiro), que mais uma vez teve a sua atenção desviada de uma catástrofe tão grande quanto a de Paris. Foi somente depois da pressão de pessoas que presenciaram a tragédia que o desastre de Minas começou a ganhar destaque nos veículos midiáticos. Uma possível explicação para este caso é definição de um acordo (provavelmente financeiro) com os veículos midiáticos e os principais canais televisivos para que todo o escândalo fosse acobertado.

Analisando esses dois exemplos, é possível constatar, que, infelizmente, a (grande) mídia ainda tem abertura para esse tipo de acontecimento. Seja por motivos políticos ou econômicos a mídia se tornou a principal ferramenta para a execução do agendamento. Espera-se, no entanto, que com o advento da internet — e de todo o poder de influência que seus usuários têm — esse cenário mude em breve e que o agendamento seja utilizado de maneira transparente e de forma que os principais eventos noticiados sejam de real e verdadeiro interesse do público.

Tipologia:

Em latim, a palavra agenda é o singular feminino da palavra agendus que significa which is to be done or made. Em tradução livre: o que tem que/deve ser feito.

Em inglês, a palavra setting deriva de set, que significa estabelecer/determinar/cenário e a palavra agenda tem o mesmo significado de pauta em português, assim como agenda-setting em inglês significa agendamento em português.

Tendo como base os significados individuais de agenda e setting podemos presumir cruamente que o termo agenda-setting é usado para determinar o que ter feito/dito/falado/discutido.

Saiba mais:

Filmes:

Wag The Dog (1997) traduzido como Mera Coincidência em português, é uma comédia norte-americana que ilustra como os meios (neste caso, profissionais) de comunicação conseguem desviar a atenção do telespectador. Se trata de um candidato comunicação conseguem desviar a atenção do telespectador. Se trata de um candidatoà presidência dos Estados Unidos que se envolve em um escândalo sexual cerca de 10 dias antes das eleições. Para abafar o caso, o relações públicas do candidato, junto com um diretor de Hollywood, “produzem” uma guerra na Albânia. A guerra não aconteceu realmente, era uma mera produção cinematográfica (que contava com atores para produzir as cenas de horror da guerra que seriam noticiadas nos jornais) que seria usada para distrair o público até o dia das eleições.

Para assistir o filme online:

http://megafilmeshd.net/?s=mera+coincidência&x=0&y=0

Para assistir ao trailer:

https://www.youtube.com/watch?v=CNo0BicRM8k

Entrevistas:

  • Entrevistas McCombs:

https://www.youtube.com/watch?v=9yFENr7ABcc

https://www.youtube.com/watch?v=87xguw8jI0E

https://www.youtube.com/watch?v=J_ghyXz3Upg

Livros:

  • Agenda Setting — Readings on Media, Public Opinion (David L. Potress and Maxwell McCombs, 1991)
  • Agenda Setting in a 2.0 World (Thomas J. Johnson, 2013)
  • Beyond Agenda Setting (Oscar H. Ghandi Jr., 1983)

Referências:

  • Agenda-setting e Internet: tendências e perspectivas de pesquisa (Davi de Castro de Magalhães)
  • Langenscheidt’s Pocket Portuguese Dictionary
  • Mega Filmes Hd: megafilmeshd.net
  • Teoria da Agenda — A mídia e a opinião pública (Maxwell McCombs)
  • Wiktionary: https://www.wiktionary.org
  • YouTube: youtube.com.br

Autoras: Letícia Camargo e Luiza Mello

Este verbete foi produzido na matéria Teorias da Comunicação Organizacional do curso de Comunicação Organizacional da FAC/UnB

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