O Jogo Virou: a comunicação é a bola da vez.

Porque os comunicadores são os profissionais mais importantes do mercado, atualmente.

Ricardo Cestari Junior
VETOR cultura digital

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Você, comunicador. Você artista. Você jornalista, publicitário, radialista, músico, escritor, pintor, artista de rua, cineasta. Quantas vezes você já ouviu esse tipo de comentário?

Você vai morrer de fome.

Isso não é profissão de homem.

Que faculdade de vagabundo!

Tá, além de (insira sua profissão aqui), você faz o que?

É, eu sei. Bastante. Eu também ouvi demais. Na verdade, mais do que eu queria.

Pobre nascido na periferia de São Bernardo do Campo, com o sonho de ser escritor desde cedo, tive que interrompê-lo para iniciar uma odiável (para mim) carreira em uma empresa metalúrgica. Uma das mais cobiçadas da região: a Karmann Ghia do Brasil.

Eu tinha 14 anos quando me vi obrigado a seguir algo que não queria, mas era necessário. Meus pais, que não tiveram muitas oportunidades na vida, sabiam que aquele era o destino mais seguro para mim.

Se eu queria? Não. Eu queria ser escritor. Falei pra todo mundo na firma e passaram a me chamar de “O Poeta”. Um de meus chefes, também preocupado com meu futuro, me abordou uma vez e disse que eu não podia sair por aí falando que não queria ser metalúrgico, porque pegava mal. Ele tinha razão, mas eu tinha muita certeza do que queria. E assim se seguiram longos 7 anos de uma carreira que eu odiava, que eu não queria e que todos me diziam que era melhor aguentar, pelo meu futuro.

A verdade é que, dadas circunstâncias econômicas e condições tecnológicas, trabalhar com comunicação e artes não era mesmo um caminho próspero financeiramente e, muitas vezes, nem socialmente. Escolher tais profissões para seguir carreira, além de demandar uma estrutura familiar propícia (ou seja, com grana) para que se tivesse alguma chance, também lhe dava poucas perspectivas de futuro estável. Mas eu estava disposto a arriscar. E arrisquei certo. E hoje, estou vivendo o melhor momento de minha carreira. Sou um cara de sorte? Eu até poderia dizer que sim, mas o mundo tem me mostrado possibilidades bem interessantes.

Crise na Indústria

Pátio da Volkswagen

Em meio à crise econômica que afeta não só o Brasil, mas o mundo, é possível percebê-la descaradamente na indústria e, por aqui, especialmente na indústria automotiva. Recentemente, Volkswagen e Mercedez-Benz (ambas com bases em São Bernardo do Campo) anunciaram demissões em massa e seus funcionários têm ido às ruas protestar. Os pátios estão cheios, as vendas de carros declinaram-se vertiginosamente. E isso é o que vemos nos noticiários, pois são as maiores. Já pararam pra pensar nas menores, as que prestam serviços para as gigantes? Pois bem. A Karmann Ghia, casa do meu primeiro emprego, também sofreu com o impacto e se vê em uma crise interna que conta com atraso nos salários.

Não sou ninguém para discutir economia, mas isto é algo muito sério. Empresas que eram vistas como a garantia de um futuro estão em apuros por conta de uma crise. Mas seria só econômica ou também uma demanda industrial que vem se mostrando cada vez menos necessária? Afinal, onde vamos colocar mais carros para rodar nas ruas?

Por outro lado, e o nosso mercado, esse que nós conhecemos bem? Nas agências de publicidade e propaganda, nas redações de jornais e revistas, nas emissoras de rádio e TV. A perspectiva é boa? Não necessariamente.

A Mídia Tradicional

A Globo vem registrando queda abismal em sua audiência ao longo dos últimos anos, mas foi entre 2014 e 2015 que a coisa realmente ficou feia. Não teve Dança dos Famosos, não teve Big Brother Brasil, não teve Novela das 9 com beijo lésbico entre idosas que a salvasse da queda de audiência. Aliás, sobre o último exemplo, a própria Globo levou um tiro pela culátra: sua audiência moldada em valores conservadores armou um levante e a boicotou. Nada de senhoras se beijando para a audiência da toda poderosa. Táca-lhe pau nessa queda de audiência!

Pouco mais de um ano atrás, mais precisamente no dia 30 de setembro de 2013, a MTV Brasil chegou ao seu (triste e melancólico) fim, mas esse seria apenas o início de uma fase de trevas para o Grupo Abril como um todo. Com rumores de que várias de suas publicações seriam encerradas (como Playboy e Capricho), o que aconteceu recentemente de concreto foi o encerramento das Veja BH e Veja Brasília, gerando mais de 40 demissões. Pesado e assustador, não?

Como justificativa para o novo projeto, a empresa explica que o “processo está associado à desaceleração econômica que impacta a publicidade e a mídia de maneira geral”, e que “está alinhado às transformações do mercado e às exigências dos leitores”.

Eu até acredito na Abril sobre a segunda justificativa, mas a primeira me parece apenas uma desculpa esfarrapada para não encarar uma realidade profunda sobre o novo mercado e assustar gerações e mais gerações de jornalistas, radialistas, publicitários e artistas, quando, na verdade, serão os maiores beneficiados por essa virada de mesa. E eu explico.

O Brasil é líder na previsão de crescimento do investimento publicitário em 2015, ao lado de China e Índia, com notável aumento no crescimento do investimento em Internet. Ou seja: sim, os leitores tem novas exigências. Mas o mercado publicitário continua muito bem, obrigado. O mercado de mídia tradicional, nem tanto. Não por não ter investimento (afinal, a TV ainda apresenta a maior fatia do bolo publicitário, seguida dos Jornais), mas porque não consegue se livrar de velhos paradigmas de lucro. São corporações grandiosas que querem todo o mercado para si. Mas não entendem que a Internet é pulverizada e, por mais que ainda sejam os maiores dominantes nela, as pequenas iniciativas começam a se beneficiar de um sistema mais livre e democrático de comunicação. E é aqui que chegamos a todo o objetivo desse texto: o jogo virou. Tem vaga pra comunicação, minha gente. E não é qualquer uma.

As Assustadoras demissões em Massa em Empresas de Mídia

Tudo bem, você tem ouvido falar constantemente de empresas de mídia demitindo, e isso é realmente assustador. Então vamos falar disso.

O número de demitidos em redações e empresas de mídia foi praticamente o dobro de 2014 para 2015 (e considere isso somente até junho de 2015). Desse total de 2015, praticamente 1/3 eram de jornalistas. As informações estão mais completas nessa excelente análise de dados do Instituto Volt Data Lab, publicada aqui no Medium sob o título “O Silêncio dos Passaralhos”.

Isso é realmente assustador, e a impressão que dá é que os jornalistas e comunicadores em geral vão ficar sem emprego por conta de uma crise econômica, se considerarmos, também, que estão demitindo, em alguns casos, para recontratar por valores mais baixos. Isso já dá uma noção que a oferta é enorme, mas a demanda é menor.

Mas se existe um corte de profissionais, porque o negócio de mídia não está tão ruim assim no Brasil? Vejamos esse trecho da análise:

Afinal, os investimentos publicitários no Brasil, maior fonte de receitas para veículos jornalísticos, cresceram 8% em 2014 na comparação anual, para R$ 121 bilhões, fazendo do país o quinto maior mercado do mundo nessa área — especialmente no segmento de TV, que abocanhou mais da metade desse montante, de acordo com estudo do Ibope Media.

Assim, mesmo em tempos de apertos na economia, a receita líquida consolidada da Globo Participações cresceu mais de 10% de 2013 para 2014,totalizando R$ 16,2 bilhões. Não obstante, na ponta impressa, o jornal do grupo, O Globo, demitiu pelo menos 40 repórteres desde 2013.

Esse contraste faz algum sentido se formos falar de crise econômica? Pra mim, não faz. Pelo menos não faz sentido dizer que a crise econômica brasileira é a culpada pelas demissões, como a Abril usou de justificativa, ao lado de tantos outros veículos.

O que me parece, porém, é que existe uma crise envolvendo a mudança de paradigma nos setores de comunicação, mídia e publicidade. Enquanto criadores autônomos entregam um caminhão de conteúdo online de qualidade, competindo diretamente com jornais, fica difícil lotar redações com o objetivo de criar conteúdo: ele já está criado. Falta só fazer a curadoria.

Quem colabora para essa linha de pensamento é o Portal Terra. Fez um corte de 80% de jornalistas de suas redações e fechou uma série de sucursais. Deram na lata que consideram a reestruturação do negócio em relação ao Mercado, e não à crise econômica.

À IMPRENSA, Paulo Castro, CEO do Terra, explicou as mudanças que, segundo ele, não têm relação com a atual crise econômica enfrentada pelo Brasil. “É uma reorganização dentro do Terra que responde a uma mudança do mercado. Não é uma coisa conjuntural de hoje, mas uma mudança de como o mercado contrata publicidade, de como o mercado remunera a atividade da mídia”.

É claro que não vou dizer que está fácil, pois não está. No entanto, tenho uma visão otimista de como o mercado da comunicação e mídia vai se reestruturar nos próximos anos, sendo, inclusive, um dos motores em tempos de crise econômica.

Um Novo Mundo Para os Comunicadores

Qual o papel da comunicação nesse mercado? Fundamental, no mínimo.

Adriana Garcia, co-fundadora da Orbital Lab destaca que “toda empresa é de mídia e toda empresa de mídia é de tecnologia. A empresa se comunica com as partes e com o público. Não existe mais o fato de alguém ser dono da informação, deve-se envolver todas as partes, público interno e externo”.

Percebem? A informação não deve (apesar de ainda) pertencer a “donos”. Todos agora são publicadores e as empresas e marcas tem o poder de se comunicar diretamente.

Vamos ser sinceros? O mundo mudou depois da Internet.

Por mais clichê que soe e seja algo perceptível no nosso dia-a-dia, essa mudança não é algo que se consolidou e todos estão tentando entender o que ela realmente significa. Para nós, comunicadores, isso é ainda mais forte. Nossa profissão está intrinsecamente ligada as mudanças de paradigma que a comunicação digital trouxe. Afinal, o que é um meme ou a viralização de um conteúdo na Internet, senão trabalho de comunicação?

Essas mudanças profundas e sistemáticas mudaram também o mercado de trabalho. Novas profissões se criaram e estão sendo testadas em empresas de todos os tipos. Marcas produzem seu próprio conteúdo e estão percebendo que somente anunciar produtos na TV não é suficiente para consolidar-se no mercado. A demanda por conteúdo de qualidade e engajador é cada dia maior e é aí que entra um importante ator no jogo: o comunicador.

Seja o jornalista, o publicitário, o radialista, o mercadológico ou o relações públicas: o comunicador é oprofissional criativo do qual o mercado precisa para criar conteúdo de qualidade e direcionado ao público certo para engajar marcas e consumidores. O comunicador é a peça-chave da engrenagem desse mercado que cria uma nova empresa por dia e se expande com cada vez mais novas profissões.

Mas fica uma pergunta: porque ainda não estamos em peso nesse novo mercado? Será que ainda estamos na faculdade (ou saindo dela) pensando tradicionalmente em agências de publicidade, emissoras de tv e redações jornalísticas como as únicas saídas para ter um emprego sustentável? Será que é por isso que constantemente nos pegamos achando que nossas profissões são as piores do mundo, porque pagam pouco, têm poucas vagas e ninguém respeita?

Pois bem, a verdade é que o jogo virou. Enquanto a economia industrial entrou em ponto de estagnação e hoje vive uma crise mundial (que está, atualmente, afetando diretamente o Brasil), a economia criativa vem observando um boom que não se imaginava. Se hoje falta emprego para engenheiros e mão de obra técnica na indústria metalúrgica, sobra para criadores, distribuidores, divulgadores e reverberadores de conteúdo, os que vem sendo chamados pelo mercado de “Makers”. Ignore o curso o qual você se formou e pense no que você faz. Você cria peças publicitárias, você atende agências, você faz vídeos para o YouTube, você escreve textos para um blog, você desenvolve toda uma campanha, você cria um plano de comunicação. Você faz acontecer. Você é um maker. E você é o dono desse novo mercado em crise. As empresas, mesmo que ainda não saibam, precisam de você, nesse mundo em que marcas são mais importantes que produtos.

Conclusão: você não é um vagabundo. Você é a peça fundamental desse mercado em crise. Você é necessário! Por isso, comemore. E se possível, com uma cerveja na mão, jogando videogame, acessando o celular quando bem entender e talvez até trabalhando de casa. Seu mundo profissional, além de muito mais legal, não está em crise.

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Ricardo Cestari Junior
VETOR cultura digital

Especialista em Marketing Digital. Louco por histórias. Fascinado por um bom conteúdo. Eterno aspirante a Escritor e Músico. Apaixonado. — @rcestari_jr