Lars Von Trier — Ondas do Destino (O otimismo escondido de Von Trier)

Marco Aurélio Corrêa
Viagem Ao Fim Da Noite
2 min readAug 18, 2018

Esse é o primeiro filme do Von Trier depois do sucesso de Europa, aqui ele começa a trabalhar em vários elementos que iriam resultar no Dogma 95 (basicamente várias instruções para um cinema minimalista). Apesar de não seguir muitos dos preceitos que ele só colocaria em prática n’Os Idiotas, Ondas do Destino ainda é incomum. É quase inteiramente filmado com câmeras portáteis e tudo parece que usou rolos de filme usados, o que por fim causa uma impressão realista. Porém, isso é um tanto irrelevante, Von Trier é um homem de idéias e elas brilham no roteiro, então vamos à história. Numa comunidade rural extremamente religiosa na Escócia, Bess (que como dizem no filme “não é muito certa da cabeça”) decide se casar com o estrangeiro (dinamarquês? Sueco?) Jan que trabalha numa plataforma de petróleo. A ideia não é muito bem recebida por ninguém, porém Bess não se importa, Jan apresenta a ela o que ela mais queria na vida (que a religiosidade não pode dar): o sexo. Infelizmente Jan é atingido por um cano tentando salvar um amigo no trabalho e fica tetraplégico. Isso abre um buraco na vida de Bess que a joga num estado quase psicótico, então Jan propõe que ela faça sexo com outros homens e que lhe conte essas experiências (por que? Talvez para resolver o estado mental de Bess, talvez para se livrar dela, mas não sabemos). Desse ponto em diante o filme é uma mistura de espiral descendente com ascese através da crueldade do mundo. Crueldade essa que age sobre a personagem mais incapaz de conceber até a existência do mal (até um momento final de puro masoquismo). O poder do amor e a arbitrariedade da graça são constantes durante o filme e como é comum nos filmes do Von Trier, as ideias cristãs são completamente divorciadas do mínimo de felicidade. O Deus que Bess conversa (e ela tem completa razão que se comunica) só ela entende, sua comunidade religiosa parece conversar com outra entidade com o mesmo nome, porém este conflito comunicativo terá um desfecho brilhante. Von Trier diz que os filmes devem ser como pedras no sapato e de fato o Ondas do Destino deixa uma questão incomoda: podemos conquistar a miséria do mundo? No único filme do Von Trier que é quase otimista, a resposta é que talvez sim.

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