Violências, machismo e afins. Nós homens precisamos falar sobre isso.

João Henrique Moldenhauer
Viaje com o Joao
Published in
6 min readAug 8, 2018
Fonte: Google

Como já é sabido infelizmente vivemos em um país que ostenta alguns índices com que devemos baixar a cabeça e nos envergonhar. Segundo o Atlas da violência desse ano temos 30x mais mortes que toda a Europa. Os números da violência ultrapassam os de países em guerra. Para entender a situação sugiro que assistem esse vídeo.

Hoje estou aqui para falar de uma parcela específica dessa violência. A violências contra a mulher. Essa semana juntamente com os 12 anos da aprovação da Lei Maria da Penha acompanhamos nos noticiários 5 casos de feminicídio. Todos eles cometidos pelos parceiros das vítimas. Um tipo de violência que não é novidade num país de cultura machista e que é perigoso justamente por ser silencioso e silenciado, principalmente por nós homens.

Desde crianças somos criados a sermos fortes. Temos que esconder nossas emoções, expressar nada mais que comportamentos competitivos e agressivos. Temos que ser provedores e predadores sexuais. Temos que ostentar e manter nossas conquistas (inclusive as mulheres.)

E ao mesmo tempo ainda temos um certo “código de ética” em não expor as fraquezas dos amigos. Porque sabemos como a masculinidade “é frágil” e o tirar sarro pode rasgá-la a ponto da sua auto estima ir lá embaixo.

Viver nessa bolha privilegiada é fácil. Virar os olhos para problemas que não acontecem conosco também. Achar que “é exagero” e não escutar, não ler, e ficar quieto…aí que mora o perigo.

Você é capaz de citar somente 1 amigo homem para o qual se sente a vontade de abrir seus problemas?

É difícil né? Quando conseguimos chegar ao nível de ter uma válvula de escape e se abrir para alguém nosso porto seguro sempre acaba sendo uma mulher. Mais um problema de nossa criação. Onde aprendemos que temos um limite de distanciamento “saudável” entre os homens para que, de novo, nossa “masculinidade” não seja questionada.

E porque fiz essa introdução para falar de feminicídios?

Porque do mesmo jeito que não nos abrimos para nossos amigos não expomos nossa opinião na mesa do bar. Ouvimos todos os dias comentários machistas, colegas tratando mulheres como se fosse um pedaço de carne. Relatos de posse, tentativa de controle e qualquer coisa tóxica chamada de “amor”, “zelo” e “carinho”. E geralmente ouvimos tudo isso com um sorriso amarelo no rosto.

Estamos em um momento sem precedentes na história. Onde as mulheres estão mais do que nunca brigando por equidade. Não ficam mais quietas pelos abusos que sofreram ou que podem sofrer. E a nós somente cabe ouvir, sair da nossa bolha e refletir se o “ser homem” que nos ensinaram é realmente um “ser homem”.

Refletir sobre todos os pequenos e grandes atos desrespeitosos, abusivos e/ou agressivos que fizemos ou fazemos rotineiramente. E assim começarmos a identificar esses comportamentos nos outros. Chamar a atenção, conversar sobre, ser o “amigo chato”. Mas não o amigo chato que tenta opinar sobre com as amigas, essas já sabem bem o que acontece com elas.

Mas com nossos amigos.

Daí você devem pensar: “ahhhh! Mas que diferença vai fazer. A mulherada já está falando bastante sobre.”. Vai fazer muita diferença, sabe por que?

Porque existe algo muito forte e que tráz grandes resultados em marketing e comunicação: se chama “identificação”. É muito mais fácil você absorver algo de alguém que compartilha os mesmos aspectos da vida que você. Que tem as mesmas fraquezas. Os mesmos perrengues. É muito mais forte e tem mais resultado um homem ouvir de outro homem de que ele está errado do que de uma mulher, pelo menos no aspecto de abordagem sexual.

Se abra, ouça as mulheres sobre o que elas vivem e converse com os homens sobre comportamentos tóxicos e sexismo.

Eu já virei o “amigo chato” faz tempo. Alguns dos meus amigos gostam de conversar comigo para que possam ter alguma outra perspectiva. Outros se afastaram. Outros ficam cheios de dedos ao falar algo na mesa do bar pois podem ser questionados.

Mas não fui sempre assim. Tenho que agradecer às muitas parceiras e amigas que tive das quais tiveram paciência em me ouvir e tentar me mostrar um pouquinho de seus mundos.

Comecei a não achar “exagero” os abusos sofridos pelas mulheres quando a cerca de 6 anos abri, após ler uma notícia sobre, o mapa do projeto “Chega de fiu-fiu”.

Eu não consegui acreditar no número de “check-ins” que estava em minha frente. Sendo que nunca percebi nada ao meu redor. Na mesa de bar comecei a perguntar a amigas sobre o portal e se aquilo era real e TODAS (eu disse TODAS) me contaram histórias de algum caso de assédio que sofreram. Fiquei chocado, sai da minha bolha e da zona de conforto masculina.

Comecei a procurar mais sobre e a conversar sobre isso com mulheres próximas, identificando até muitos comportamentos que eu tinha (e que as vezes ainda tenho) e que sem perceber tóxicos e de certa forma, mesmo que sutil, tentava diminuir a força das mulheres.

Infelizmente vejo que sou uma exceção, a grande maioria não sai da bolha. Fica cego, surdo e mudo.

Em algumas rodas de amizade o machismo prevalece. A separação “homem” e “mulher” na questão sexual é abismal.

Conversas, experiências e identificação. Coisas que fazem a diferença.

Se você é homem, se acha diferente do grupo, exponha isso na sua roda de amigos. Ponha outro ponto de vista na mesa. Não tenha medo. Em um primeiro momento pode ser que alguém solte alguma piadinha, mas no fundo você vai ser respeitado.

Grande parte das vezes tenho que me expor primeiro para que a guarda dos outros baixe. Se digo que tive ou tenho um problema do qual os homens se identificam quase instantaneamente a barreira cai e começam a falar sobre seus causos também. O muro parece forte, mas na verdade ele é de vidro.

Há algumas semanas estava em um bar com dois amigos e começamos a falar sobre relacionamentos abertos. Um deles expôs o comportamento de praxe do homem padrão: É muito bom para o homem mas ele não acha que a mulher deveria aderir. Afinal o homem “tem necessidades” que a mulher não.

Comentei de uma amiga que tem uma relação aberta com o namorado e inclusive usa o Tinder para achar outros parceiros. Ela foi comparada com uma “atriz pornô” e “ninfomaníaca”.

Semanas depois ele deu um match no Tinder com uma mulher casada. Ela propôs a ele realizar uma fantasia do marido. Ele queria ver ela transando com outro homem. Depois de ficar relutante ele topou, pois achou a garota muito atraente.

Marcou de se encontrarem na casa dele. Ela chegou com o marido e o mundo dele ruiu.

Percebeu que o marido era extremamente gente-boa e tinha uma relação sólida, leve e de confiança com a mulher. Não imaginava que um homem poderia aceitar que a mulher tivesse atração sexual por alguém mais que ele. No final ele o fez. O marido assistiu. Tomaram um vinho. Fez de novo e com ele assistindo. Foram embora.

Quando ele me contou a história no final ele me falou: “Cara, essa experiência me fez enxergar tudo de outra forma. Se lembra a conversa que tivemos no bar? Agora entendo o que você disse. Mulher também pode ter suas fantasias e preferências e amar outro cara.”

Acho que sou a única pessoa para quem ele contou a experiência. Pois sabia que não ia julgá-lo. Mas sim conversar de boa e ouvir sobre suas descobertas.

Portanto homens, conversem. Se é difícil fazê-lo em mesas de bar existem grupos onde se pode começar.

Mas somente conversando entre nós iremos ajudar a vivermos em um país mais justo e equânime. Onde pessoas não sejam diferenciadas em qualquer questão, seja racial, gênero ou sexual. Mas simplesmente sejam pessoas.

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João Henrique Moldenhauer
Viaje com o Joao

Reflexões, experiências e sentimentos para uma discussão sempre construtiva.