Eraudina, aos 59 anos, descobriu a felicidade e o McDonald’s

Victória Silva
vicctoriasilva
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3 min readJul 19, 2019

Eraudina tem olhos verdes e profundos. Mas, não é fácil conseguir admira-los.

Ela não olha nos olhos.

Sempre senta na diagonal e tem o olhar direcionado para os pés. Verinha, como é mais conhecida, parece estar constantemente em busca de algo que está além do que os olhos podem ver.

Uma vida em busca da felicidade

Após anos de busca, a mãe de três filhos descobriu a felicidade. Antes disso, porém, percorreu um trajeto de poucos sorrisos.

Primeiro, ainda na juventude, precisou parar de estudar. Na zona rural de Paripiranga, Bahia, as escolas eram improvisadas em casas perdidas em meio as plantações de milho, feijão e mandioca. Os professores eram jovens que tinham um pouco mais de conhecimento, por isso, ensinavam até a quarta série. Quem queria seguir com os estudos precisava ir até a cidade.

“Eram muitos, muitos, muitos quilômetros para ir andando. Não sei dizer quantos, mas era muito longe. A gente media em léguas na época”.

Foto de Eraudina olhando para a câmera com semblante feliz
Imagem: Diego Barbosa

A caminhada foi impedida por sua mãe, que precisava de ajuda. Ainda não era moça quando começou a trabalhar na roça. Após o casamento, o trabalho continuou fazendo parte de sua rotina. Mas a felicidade não veio. Teve três filhos e, com eles nos braços, passou noites em branco e dias de terror. As histórias que foram escritas pelo efeito do álcool consumido em exagero pelo marido são lembradas em silêncio.

Os olhos se distanciam ainda mais com as memórias. Ela respira fundo e, pela primeira vez, sorri.

Foi minha primeira vez

Ela ficou viúva após 33 anos de casamento. Antes disso, mudou-se para Lagarto com os três filhos. Encontrou uma das irmãs e a mãe na cidade, onde buscava tratamento médico e, principalmente, paz. Foram duas cirurgias do coração em um intervalo de dez anos. O marido foi a encontrar no novo endereço e largou a casa na roça, mas não o vício.

“Sofri muito, mas não digo que foi uma vida horrível. Nunca passei fome, tem muita gente por ai que vive em situações piores”.

Eraudina conta sua história de gorro na cabeça e vestida em dois casacos. É a primeira vez que saiu do nordeste e os 15ºC que fazem no litoral de São Paulo fazem os queixos tremerem de frio. Essa foi a primeira vez que ela viajou de avião, mas ainda seria a primeira se fosse de ônibus. Descobriu que ama viajar e que os lanches do McDonald’s, que ela só conhecia pela televisão, são muito gostosos. Eles têm o sabor da liberdade.

“Eu quero viajar mais. Quero ir na casa do meu irmão, em Piracicaba. Quero ir em Guarujá. Na Aparecida do Norte e ir no McDonald’s. Falaram que é igual em todos, né? Sempre que eu viajar vou querer ver se é mesmo”.

Eraudina descobriu que a vida é boa. Agora ela só quer viver com saúde e paz.

Obrigada por ler até o final :)

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Victória Silva
vicctoriasilva

Conto histórias na internet e falo sobre as coisas mais legais que acontecem em Santos (SP).