As fardas clamam: Vote 15!
O sucesso do decreto que determina intervenção federal no Rio passa pelas instituições – e quem é Braga Netto?
A trilha que inicia-se no Forte do Leme leva a vistas do Rio de Janeiro por outro ângulo. No caminho, os saguis espevitados ouriçam a mata atlântica que emoldura o pavimento de pedra. Entre as árvores, durante o caminho, o oceano ostenta beleza azul, causando um belo susto aos turistas vislumbrados e queimados pelo sol, com suas gigantes máquinas de fotografia.
Numa curva qualquer, vê-se, descendo vagarosa a trilha, uma Veraneio velha. Cabeludo, assusto. Aperto a mão de Ariane e, com os olhos atentos e sobrancelhas duvidosas, passo pelo carro que leva dois fardados. Mais à frente, um menino – deve ter minha idade ou pouco menos – faz cara de oficial da rainha da Inglaterra. Ele está um pouco mais à vontade, mas, imóvel, com as pernas arriadas, equilibra-se nos coturnos com o quepe de lado. “Boa tarde”, digo. Um aceno com a cabeça me cumprimenta.
O presidente Michel Temer baixou um decreto, na manhã desta sexta-feira, determinando que o estado do Rio de Janeiro está sob “intervenção federal”. O general Walter Sousa Braga Netto será o responsável pela atuação de todas as polícias e forças de segurança fluminense.
A grave crise que permeia o falido Rio tem culpado: o estado. Os militares ensinaram a bandidagem a politizar-se e estruturar-se como instituições inteligentes de guerra quando engaiolaram sob o mesmo teto batedores de carteira, sujeitos de navalha e militantes comunistas. É dar exército a quem precisa e conhecimento a quem almeja – o caso de Rodrigo Lemgruber, criador do Comando Vermelho, é o melhor exemplo do erro dos milicos.
Desde então, passando por um ineficiente Brizola e chegando a Luiz Fernando Pezão, o Rio foi cavando o próprio buraco. A estrutura corrupta que concreta as ligações entre as câmaras municipal e estadual e o Palácio do Governo foram expostas pelas operações como a Lava Jato. Mas o buraco é mais embaixo.
As relações entre estado e criminalidade – vista ela chinelos ou gravatas – arraigou-se nas entranhas fluminenses. Não se compra um barraco sem beijar a mão do “governante” do morro; não se fazia uma ponte sem colaborar com o acervo de museu da casa de Mangaratiba – comemorando, sempre, em Paris, com guardanapos de preferência.
A patacoada de Temer tem dois efeitos: aumentar a insegurança quanto à própria ingerência incapaz da União e dos governantes fluminenses sobre o próprio Rio e dar coro a uivos de sujeitos saudosos da japona. É um populismo barato sem efeitos práticos.
O ano nos trará eleições majoritárias. Estão todos preocupados em mostrar serviço.
Ostentando poder sobre todas as fardas azuis-e-brancas, Braga Netto só fará, de fato, algo pelo Rio se carcomer estas instituições por dentro. Demitir os dez-estrelas que tungam dinheiro oriundo do tráfico de armas do governo; os cabos e delegados que têm seu ganha pão com a cocaína do morro – isso se conseguir passar por cima dos engravatados das casas legislativas que também pagam as contas com dinheiro do crime.
O general, cuja idoneidade não se comprovou – e, nestes tempos estranhos, o “inocente até que se prove o contrário” não vale mais; o sujeito tem de comprovar-se íntegro – não terá plenos poderes. Se tem moral e não está emaranhado entre as entranhas corruptas do poder, enfrentará resistência entre os pares que comandam o campo de guerra.
O Rio sangra, os poderes chocam-se – mas a Previdência não pode esperar.
Estranho
Não gosto da palavra “metástase”, usada por Temer, para referir-se à situação da criminalidade. O país inteiro precisará dos militares? Já vimos isto…
Estranho II
“Muita mídia”, comentou Braga Netto sobre a situação atual do Rio, fazendo sinal negativo com a mão para os jornalistas. A culpa é nossa? Já vimos isso…
Previdência
As reformas constitucionais, na teoria, estão suspensas pela intervenção no estado. Como aponta o editorial do Estadão, o decreto é a prerrogativa perfeita para, se o governo não tiver votos suficientes para aprovar a reforma da previdência, colocar nas costas da intervenção, desistir da votação e sair incólume à própria fraqueza.