O ano que mal começou — e promete ficar

Me prometem revoluções e guerras, ânimos acalorados na política brasileira e mentiras que calcarão o cenário que se apresenta como verdade absoluta

Viés
Viés
3 min readJan 19, 2018

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Equilíbrio, guerra e paz. De acordo com a numerologia, o número oito está atrelado à construção de períodos que fazem a mediação de conflitos que contemporizam as sociedades marcadas por suas insígnias velhas, com tentativas de cura pela ululante mesmice trajada em vestes novas. Grafado na pele de adolescentes revoltosos com os pais, o desenho banalizado que representa a infinitude ganha resignificações e a própria inexistência de começo e fim ─ ou a própria imagem do ciclismo do tempo.

Entre as quebras, vimos Pelé, Garrincha e Zagalo elevarem o futebol mundial aos olhos suecos e do mundo. O choro do menino negro, de 17 anos em 1958, contemporizando com o país que crescia econômica e industrialmente. Dez anos depois, como grafou o jornalista Zuenir Ventura, vivemos o ano que não terminou. Entre as ratificações do militarismo burro e raivoso, o Ato Institucional Número 5 foi instituído no Brasil. A Avenida Infante Dom Henrique ebulia. Protestando contra a alta dos preços do Restaurante Calabouço ─ construído pela União Nacional dos Estudantes como um refeitório de estudantes por baixos preços ─, os universitários e secundaristas foram recebidos pela tropa de Costa e Silva, levando à morte do secundarista Edson Luís.

Enquanto isso, John F. Kennedy tinha os miolos expostos à frente do Hotel Ambassador; a Rua Maria Antônia se tornava palco de guerra entre o CCC mackenzista e a UNE da filosofia da FFLCH; em Praga, as ruas incendiavam em busca da liberdade política durante a primavera tcheca. É verdade, Zuenir: 50 anos depois, 1968 ainda não acabou.

Entro em 2018 exaurido por um ano no qual tive que permanecer atento. Atento às mesmas verdades virulentas e vilipendiosas que prometiam exaltar as mesmas burrices de 50 anos atrás. Me prometem revoluções e guerras, ânimos acalorados na política brasileira e mentiras que calcarão o cenário que se apresenta como verdade absoluta.

Enquanto Donald Trump e Kim Jong-un discutem quem tem o botão maior, o mundo entrincheira-se no medo que assola os peitos desde que as discussões sobre a serenidade mundana passavam pelas mãos de soviéticos e ianques com poder de destruição massiva. Passando pelos iranianos, muçulmanos e chineses, os medos e botões da Casa Branca mantêm-se intactos e prometem elucidar a lucidez do topetudo americano ─ a do norte-coreano é indubitavelmente inexistente. A Europa inflama entre ataques terroristas e a ascensão de líderes proveitosos do medo para introduzir ao cenário político extremismos arcaicos e ratificações burras de supremacia e antiglobalismo, de egoísmos e preceitos subumanos.

Na América Latina, vemos a ditadura venezuelana enrijecer-se e enraizar-se como verdade absoluta, contemporizando com o crescimento de vertentes ideológicas ─ tão perigosas quanto o bolivarianismo ─ no cenário político atual.

No Brasil, realidade próxima à nossa, o que demanda mais cuidado e criticismo para fugir das polarizações que ganham força e destoam do centralismo necessário para construirmos uma sociedade democrática, plural e que compreenda todos os matizes de pensamento para o progresso, o debate político ─ e, por que não?, social ─ centram-se em Lula e Bolsonaro ─ mesmo que o último ano de governo de Michel Temer não deva ser tópico afastado da conjuntura para o ano.

Feliz 2018, o ano que não terminará em 31 de dezembro.

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