O racismo recreativo no futebol gaúcho

O estado é um dos que tem mais casos, em especial, no futebol.

Francine de Oliveira
Vidas negras no RS
4 min readJul 17, 2020

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Por Jônata Machado

No Rio Grande do Sul, a prática do racismo recreativo é muito comum, principalmente na área do esporte. Infelizmente, ver torcedores gaúchos chamando jogadores negros de outros times de “macaco” e derivados é algo recorrente, ainda mais no interior do estado. E os números comprovam isso: dos 50 casos de racismo no futebol brasileiro, 16 aconteceram no estado, levantamento trazido pelo Observatório da Discriminação Racial no Futebol. Muitos desses casos são lamentavelmente tratados como parte da rivalidade presente no futebol, o que tira o real peso e significado das ofensas

Nos estádios, entre as torcidas organizadas, perduram, até os dias de hoje, os cânticos racistas no futebol gaúcho, assim como situações que para alguns torcedores é considerado “aceitável”. Dentre os casos mais emblemáticos, pode-se citar o caso do goleiro Aranha, ocorrido em agosto de 2014, ganhando repercussão internacional, quando uma torcedora do Grêmio foi flagrada, junto à torcida, com gritos de “macaco” e que acarretou na eliminação do tricolor gaúcho da Copa do Brasil daquele ano. A medida foi aplaudida pelo presidente da FIFA, Giani Infantino.

Mas não é somente com os jogadores que esse tipo de prática ocorre. O ex-árbitro e hoje comentarista da RBS TV, Márcio Chagas da Silva, também foi alvo de injúria racial em pelo menos 2 circunstâncias: a primeira foi na partida entre Esportivo x Veranópolis em Bento Gonçalves, onde foi xingado por vários torcedores antes, durante e após a partida e teve seu carro com portas amassadas e duas bananas colocadas no escapamento do veículo; e a segunda foi durante a final do campeonato municipal de Ajuricaba em dezembro de 2019, onde foi ofendido de “negro safado”, sendo a oitava ocorrência a ser denunciada por ele às autoridades.

Ex-árbitro e comentarista de arbitragem Márcio Chagas da Silva. (Fonte: Reprodução/Site Folha de São Paulo).

Em 2019, o tricolor gaúcho criou a mobilização para barrar o termo macaco dos cânticos da torcida depois que jogadores foram ofendidos em partida do Campeonato Brasileiro, tomando como atitude a identificação do torcedor e a campanha junto ao Observatório da Discriminação Racial no Futebol em seus jogos, em destaque os grenais 421 e 422 no mesmo ano.

Em março de 2020, antes do Campeonato Gaúcho ser paralisado em virtude da pandemia do novo Coronavírus, houve mais um caso de racismo nos campos gaúchos. Foi na partida entre São Luiz e Caxias realizada no estádio 19 de Outubro em Ijuí. Na ocasião, o jogador Tilica do Caxias, ao ser substituído em campo, foi tirar satisfações com os torcedores do São Luiz alegando ter sido chamado de “macaco” por eles e recebeu cusparadas dos mesmos. Após o jogo, seu colega de time, o centroavante João Paulo, fez uma declaração indignada a Rádio Caxias:

“Pelo fato de ser companheiro de clube dele, e também negro, revolta bastante. Você viu na hora, o quarto árbitro estava do lado, você também, eu gritei avisando, ofenderam o Tilica chamando o cara de negro — disse o jogador, referindo-se a um repórter que havia testemunhado a agressão. Isso é futebol, mas faltar com o respeito em um trabalho, porque isso é um trabalho, minha família depende disso, em um local onde envolve famílias, indiretamente, eu acho que é muito feio, é revoltante, não só para quem estava ali e não agiu corretamente, o corretamente seria identificar esse senhor que tomou essa atitude errada. Infelizmente o mundo está cheio dessas pessoas bossais, e que tem falta de inteligência”.

O S.E.R. Caxias manifestou-se em redes sociais em apoio ao jogador alvo das injúrias raciais. No Twitter, o clube fez diversas postagens sobre o assunto, reforçando o repúdio a agressão sofrida por Tilica.

O Observatório da Discriminação Racial no Futebol também se manifestou em seu perfil do Twitter sobre o ocorrido, exaltando a declaração feita pelo jogador João Paulo em defesa de seu companheiro agredido na ocasião.

Nesse ano, a Federação Gaúcha de Futebol se reuniu com a Polícia Civil, a Ordem dos Advogados do Brasil e o Ministério Público para colocar em ação o movimento Juntos Contra a Violência e o Preconceito que abrange tanto o cenário do racismo quanto os demais casos. O objetivo é reforçar e denunciar todos os tipos de agressão física, verbal ou moral contra as minorias.

Logo da campanha Juntos contra a violência e o preconceito. (Fonte: Reprodução/Federação Gaúcha de Futebol).

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