BLIND GUARDIAN — Beyond the Red Mirror (Nuclear Blast, 2015)

Igor Natusch
VIL METAL
Published in
4 min readFeb 10, 2015

NOTA: 7

Eu já fui um fã ardoroso de Blind Guardian. Geralmente, evoca-se um argumento desses no começo de uma resenha como uma justificativa para a crítica pesada que está por vir — algo do tipo “eu posso falar, conheci esses caras quando ainda eram bons” etc. No caso, porém, o próprio Blind Guardian pede essa introdução, já que o novo CD “Beyond the Red Mirror” vende a si mesmo como uma continuação de “Imaginations from the Other Side”, o já clássico álbum de 1995 que marcou a consagração internacional do conjunto alemão. Ou seja, a necessidade de olhar para trás para analisar o presente está posta desde o primeiro instante, o que coloca velhos fãs (como eu) em uma ligeira posição de vantagem — ao mesmo tempo, é claro, que cria expectativas potencialmente impossíveis de atender.

O retorno ao passado, aliás, é algo que o Blind Guardian ensaia há algum tempo. Desde a resposta morna recebida por “A Night at the Opera” (2002) — um álbum onde, sendo bem sincero, a obsessão orquestral da banda foi longe demais — os bardos tentam reencontrar a trilha perdida, cada novo CD procurando ser um sucessor adequado a “Nightfall in Middle-Earth” (1998). Em tal cenário, a ideia de retomar a história de algumas músicas de “Imaginations from the Other Side” é oportuna: agora, o mundo de nossas fantasias coletivas está em ameaça, e alcançar o Espelho Vermelho (o ‘red mirror’ do título) é a única chance de salvação. Um álbum conceitual, unindo diretamente o Blind Guardian de 2015 ao ponto máximo de sua trajetória — convenhamos que alguma forma de retomada, mais do que esperada, torna-se quase impositiva nesse panorama.

A abertura com “The Ninth Wave” reveza surpresas e áreas de conforto. A introdução quase monástica, movida a cantos gregorianos, está longe de ser comum ao Blind Guardian; os elementos quase industriais que aparecem aqui e ali também causam alguma estranheza. Mas as camadas de voz estão tão presentes quanto sempre, o refrão é a explosão emotiva que sempre se espera da banda e o cuidado na construção da música evidencia o perfeccionismo de um dos gigantes do power metal mundial. “The Ninth Wave”, no entanto, não é um resumo perfeito para o que se ouve no restante do CD: a partir da música seguinte (“Twilight of the Gods”) o Blind Guardian mostra-se mais previsível e joga quase sempre na bola de segurança — se é que é possível falar nesses termos de uma banda tão marcante e grandiloquente.

A produção do CD tem tantas camadas — especialmente para acomodar as orquestrações e as incontáveis vozes sobrepostas — que se torna tecnicamente impossível alcançar um som tão pesado quanto nos tempos de “Somewhere Far Beyond” (1992): simplesmente não existem canais suficientes em uma mesa de som. Além disso, a ênfase nas melodias vocais deixa pouco espaços para os riffs: André Olbrich e Marcus Siepen acabam meio que confinados à execução de duetos e melodias, basicamente acompanhando o andar da carruagem na maior parte do tempo. Não por acaso, os momentos onde a dupla consegue respirar um pouco mais acabam sendo os mais memoráveis do CD, como em “The Holy Grail” e “The Throne” — duas músicas que, também de forma pouco surpreendente, remetem mais diretamente à sonoridade que o Blind Guardian tinha na segunda metade dos anos 90.

A atmosfera sombria de “Beyond the Red Mirror” também não é algo novo para a banda, de forma que mesmo sons especialmente escuros como “Sacred Mind” não ficam deslocados dentro do CD. Talvez a faixa que mais destoa do conjunto da obra seja, surpreendentemente, a balada “Miracle Machine”: apesar de curta e bela, ela carece de intensidade e causa uma interrupção quase desagradável no fluxo da coisa toda. Fora isso, temos um álbum que navega por águas pouco turbulentas, indo de uma ponta a outra de sua jornada sem sofrer grandes sobressaltos. A ideia era retomar de onde “Nightfall in Middle Earth” parou? Pode-se dizer então que a missão teve sucesso parcial: o que temos não é bem uma continuidade, mas um retorno seguro ao ponto de partida. Uma trilha reencontrada, mas não devidamente atravessada, talvez possamos dizer.

“Beyond the Red Mirror” é um trabalho inegavelmente competente, marcante até em alguns momentos, mas longe de trazer algo novo ou inesperado ao cenário metálico atual. Mesmo porque, como dito no começo, nunca foi bem essa a proposta do Blind Guardian para esse CD. Se isso é mais que suficiente para deixar fãs felizes (e quem poderá culpá-los?), por outro lado não abre espaço para resenhas especialmente entusiasmadas. O que, convenhamos, faz pouca diferença: o Blind Guardian já é eterno no heavy metal pelos próprios méritos, que outros grupos se preocupem em inovar daqui para frente. Meu ardor de velho fã não retorna, mas posso dizer que estou satisfeito com o que ouvi.

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Igor Natusch
VIL METAL

Jornalista. Ser humano. Testemunha ocular do fim do mundo.