OS 30 MELHORES ÁLBUNS DE HEAVY METAL DE 2017 — VIL METAL

Igor Natusch
VIL METAL
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25 min readJan 3, 2018

Aqui estamos, então. Não deixa de ser uma grande coisa, chegarmos todos e todas ao final de um ano como esse, não é? Foi um ano estranho, esse 2017. Mas, se na maioria dos aspectos teremos poucos motivos para sentir saudade do ano que passou, quem gosta de Heavy Metal, sinceramente, não tem muito do que reclamar. Foi um ano com muita, muita coisa boa sendo lançada nos mais diferentes subgêneros metálicos — talvez sem muitos álbuns imediatamente memoráveis, daqueles que viram unanimidade em questão de poucos dias, mas generoso em trabalhos recompensadores, daqueles que a gente se sente feliz de ter descoberto e que só fazem crescer a cada audição.

Nunca foi tão difícil fechar uma lista de melhores do ano por aqui. Não por ausência de candidatos, ao contrário: o difícil era ir tirando nomes da lista na medida em que eu lembrava / ouvia outros ainda melhores ou, pelo menos, de maior impacto para mim. Ampliei a lista para os 30 melhores (em anos anteriores, eram 25), deixei uma pseudo-lista de menções honrosas no final, mas ainda não me sinto plenamente satisfeito. Se, em anos anteriores, os cinco ou seis melhores eram relativamente fáceis de delimitar, esse ano foi uma dificuldade — não duvido, sei lá, que no final do ano que vem eu ache que o 14º colocado era na verdade superior a vários (ou todos) os discos que ficaram à frente dele nessa lista.

Agora, algumas obviedades. Trata-se de uma lista subjetiva, feita exclusivamente a partir do que eu, Igor Natusch, ouvi no ano que passou — e eu sou um ser humano tão falível quanto todos os outros, ou seja, não escutei todos os discos que saíram no ano, posso ter feito avaliações das quais me arrependerei mais adiante e certamente não tenho nenhuma pretensão de esgotar o tema. Também não ouvi lançamentos de todos os subgêneros de forma igualitária, o que se deve à mais pura questão de gosto pessoal e pode levar a distorções.

Por outro lado, alguns discos excelentes, mas que considerei meio borderline demais, acabaram ficando de fora. É o caso, por exemplo, de “Hiss Spun”, da talentosíssima Chelsea Wolfe, e o ótimo “Wick”, do Royal Thunder — dois álbuns muito, muito legais (sério, deem uma chance a ambos), mas que fogem de tal forma de cânones fundamentais do estilo que dá para discutir (e bastante) se são mesmo Heavy Metal, no fim das contas. Optei este ano, de forma totalmente intuitiva, por deixar esse tipo de trabalho de fora, privilegiando apenas CDs que são inequivocamente metálicos — algo diferente do que fiz em edições anteriores, quando alguns álbuns quase-não-metal ficaram inclusive entre os líderes da lista.

Do mesmo modo, sigo dando preferência a álbuns de gente nova e/ou que trazem novidades ao Heavy Metal — por mais que, sei la, o Accept ou o Deep Purple tenham gravado discos legais em 2017, não dá para dizer que esses caras estão revolucionando ou ditando as regras para o cenário metálico da atualidade. Competência é algo maravilhoso, mas queremos medir acima de tipo impacto e renovação por aqui, e por isso discos como “The Rise of Chaos” e “Infinite”, mesmo bastante bons, ficam de fora.

Enfim. Esses são os discos que eu mais curti dentre os que saíram em 2017 e eu consegui escutar adequadamente. Acho que isso nos basta, não é? Será um prazer ler/ouvir as considerações de vocês, sejam elas de concordância ou no sentido de frisar alguma banda que eu, eventualmente, possa ter esquecido.

Certo, então? Lá vai:

OS 30 MELHORES ÁLBUNS DE 2017 (em ordem crescente)

30) DESOLATION ANGELS — King (Indep.)

O saudosismo em torno da NWOBHM tem trazido muitas bandas do passado de volta à ativa. Algumas (ou várias) se resumem a tocar velhas canções em festivais, outras gravam álbuns e EPs cujo apelo não irá além dos entusiastas do metal oitentista britânico. E algumas, como o Desolation Angels aqui, conseguem ir além e produzir músicas atemporais, que não fazem feio no cenário atual. “King” é o primeiro álbum propriamente dito da banda em mais de 30 anos, e traz um metal tradicionalíssimo, elegante, com um toque maligno à moda antiga que dá um charme todo especial às composições. Em tempos onde a complexidade virou quase uma exigência, o som direto e sem frescuras do Desolation Angels é uma ducha do mais puro metal, daquelas de lavar a alma de quem traz os anos 1980 na memória e/ou no coração.

29) BURNING SHADOWS — Truth in Legend (Indep.)

Essa banda dos EUA dedica-se a construir sua carreira de forma independente, e já está no sétimo lançamento entre álbuns completos e EPs. Não se trata, é certo, do som mais original já feito na face da Terra: Heavy / Power Metal com pegada épica, vocais dramáticos e recheado de letras heroicas com um fundo histórico. O lance, aqui, está na competência instrumental e na capacidade de composição — e não resta dúvida que o Burning Shadows deu um passo gigante com “Truth in Legend”. Músicas como “Sworn to Victory” e “Day of Darkness” não reinventam a roda, mas são tão bem esculpidas que grudam na cabeça por dias depois da audição. Esse CD é do tipo que se ouve de punho erguido, cantando os refrões mesmo sem saber as letras direito — entre fãs da vertente mais épica do Power Metal, tem tudo para ganhar espaço de honra na estante.

28) CAVALERA CONSPIRACY — Psychosis (Napalm)

Fazia tempo que eu não ouvia um CD brasileiro de Metal que merecesse espaço em uma lista de melhores do ano — as guerreiras da Nervosa, para mim, foram as que chegaram mais perto, mas enfim. Não deixa de ser justo que, depois de anos de muita competência, mas pouca coisa realmente acima da média (desculpem, nada pessoal MESMO), sejam os velhos irmãos Cavalera a acabar com o jejum. “Psychosis” é o melhor disco gravado por Max e Igor em muito, muito tempo — se bobear é a melhor coisa que ambos fazem desde “Roots”, o que é bastante coisa, pode acreditar. O Groove Metal usual surge aqui em meio a generosas doses de Thrash, Death e de todos os tipos de som extremo — e o resultado é uma pedrada daquelas. A parte declamada no final é forçada para caramba, mas “Psychosis” é um baita disco, podem acreditar.

27) SORCERER — The Crowning of the Fire King (Metal Blade)

Esses suecos foram uma lenda do submundo Doom Metal por décadas, tendo gravado apenas duas demos na virada dos anos 1990 antes de seus músicos se espalharem por projetos como Tiamat e Ebony Tears. Em 2010, a banda inesperadamente voltou à ativa, e “The Crowning of the Fire King” é o segundo CD desde esse retorno. Para quem curte a estética épica desenvolvida por lendas como Solitude Aeturnus e Candlemass, esse material é de encher o coração de sombria satisfação. Músicas urdidas sem pressa, movidas a riffs colossais e com um grande desempenho vocal de Anders Engberg é o que o Sorcerer tem a oferecer — e se o CD anterior, “In the Shadow of the Inverted Cross”, já era ótimo, esse novo é ainda melhor. Perde (pouquíssimos) pontos em originalidade, mas a qualidade é fora do comum. Discaço.

26) REPLACIRE — Do Not Deviate (Season of Mist)

Das várias qualidades que fazem do Replacire uma novidade muito bem-vinda no Death Metal, talvez a mais importante seja a capacidade de inserir movimento em suas músicas. Não é à toa que muitos destacam o elemento quase progressivo das composições: de fato, as músicas de “Do Not Deviate” são cinemáticas ao extremo, em mais de um sentido, quase como breves operetas de puro Death. E nada disso prejudica o efeito imediato que se espera de um grupo extremo, ao contrário: o Replacire é agressivo, intimidador até em vários momentos, e suas músicas convidam ao headbanging quase tanto quanto à audição cuidadosa de seus desdobramentos. A fórmula ainda tem potencial para evoluir, é verdade, mas isso é positivo, já que nos garante que o Replacire ainda dará muito o que falar. Fique atento a eles desde já.

25) TRIVIUM — The Sin and the Sentence (Roadrunner)

Desde o álbum anterior, “Silence in the Snow”, o som do Trivium vem buscando uma aproximação com elementos mais Heavy / Power, levando o Metalcore típico da banda para outras dimensões. Muita gente nunca dará chance à banda, mas fato é que “The Sin and the Sentence” é um disco de alta qualidade, triunfando onde os anteriores pisavam sem segurança, e figura fácil entre os melhores do grupo. Músicas como “The Revanchist”, “The Heart from Your Pain” e a faixa-título entrariam em qualquer lista hipotética de melhores músicas do ano, e o balanço entre vocais limpos e os gritos e urros típicos do Metalcore funciona muito bem quase todo o tempo. Não é de hoje que o Trivium merece muito mais atenção do que costuma ter, e o novo CD é excelente pedida para quem não se prende a rótulos na hora de decidir o que ouvir. Excelente.

24) PAIN OF SALVATION — In the Passing Light of Day (InsideOut Music)

Que o grupo liderado pelo sueco Daniel Gildenlöw é um dos principais nomes do prog metal há pelo menos 20 anos, todo mundo sabe. Que eles não precisam provar mais nada para ninguém, idem. Ainda assim, um álbum como “In the Passing Light of Day” fica a quilômetros da acomodação e consegue sinceramente surpreender, o que é algo admirável por si só. Inspirado por uma enfermidade que o debilitou seriamente e teria até causado uma experiência de quase-morte, Gildenlöw criou uma obra ao mesmo tempo meditativa e enérgica, sombria e cheia de pontos de luz. Por vezes épico e bombástico, em outras acessível e quase eufórico, o Pain of Salvation definitivamente achou um novo fôlego em “In the Passing Light of Day”, o mais emocionalmente intenso álbum da banda em um bom tempo.

23) LUNAR SHADOW — Far from Light (Cruz del Sur)

Muita gente têm explorado as trilhas primordiais do Heavy Metal tradicional, buscando a ponte entre as glórias musicais do passado e a necessidade dos headbangers do presente. E olha, pouca gente chega perto do nível que os alemães atingiram em seu excelente debut. Bandas do espectro mais etéreo e obscuro da NWOBHM, como Angel Witch e Cloven Hoof, são influências óbvias, mas o Lunar Shadow puxa muitos elementos do Power Metal europeu do começo dos anos 1980, acrescenta discretos toques folk e amarra tudo isso com um excelente trabalho de guitarras, em algumas das mais aventureiras composições do estilo em muito tempo. Há alguns excessos aqui e ali, e a voz de Alex Vornam ainda precisa amadurecer, mas “Far from Light” é empolgante e cria enormes expectativas pelo que está por vir. Que venha logo!

22) PAGAN ALTAR — The Room of Shadows (Temple of Mystery Records)

Durante décadas, o legado deixado por Terry Jones (V) e seu filho Alan (G) pairou no imaginário metálico como uma espécie de elo perdido, a ponte entre a NWOBHM e o Doom Metal que ninguém sabia direito como traçar. Afinal, eles gravaram muitas demos, mas nunca lançaram um álbum próprio até que as velhas fitas fossem exumadas em uma série de lançamentos recentes. Infelizmente, Terry faleceu em 2015, então dá para imaginar a emoção que envolve “The Room of Shadows”, concluído por Alan a partir de linhas vocais que o pai deixou antes de morrer. O resultado é magnífico: etéreo, obscuro, com um toque para lá de malévolo e uma aura underground arrebatadora. Bela despedida para um dos músicos mais criativos do metal inglês, e uma relíquia imperdível para qualquer fã de metal sombrio.

21) BATHSHEBA — Servus (Svart Records)

A cantora austríaca Michelle Nocon fez parte de um projeto que marcou o underground Doom europeu: o Serpentcult, que lançou o magnífico “Weight of Light” em 2008. Desde então, porém, ela vinha afastada da cena — e esse “Servus” marca a volta definitiva de uma das vozes de maior potencial dentro do Metal sombrio mundial. Acreditem, não poderia ter sido um retorno melhor. A atmosfera criada pelo Bathsheba é angustiante, quase como se as músicas viessem de um passado perdido onde o mundo era hostil ao ser humano, e o instrumental básico tem grande peso nisso, pois não dá margem a distrações. A voz de Michelle surge por vezes límpida, em outras ríspida, em certos momentos quase ritualística. “Servus” é um álbum que vai assombrá-lo muitas vezes, e ainda assim você vai querer voltar a ele, de novo e de novo.

20) KRALLICE — Go Be Forgotten (Gilead Media)

Confesso que não ouvi muito Black Metal ultimamente, e boa parte do que escutei não foi exatamente empolgante (Ghost Bath, estou falando com você). Do que chegou até mim, eu diria que o Krallice fez (e de longe) os dois melhores trabalhos do ano no subgênero — sim, eles lançaram dois CDs completos em 2017, ambos muito bons. “Loüm”, o primeiro, conta com a aparição de Dave Edwardson, do Neurosis, e é uma maravilha — mas “Go Be Forgotten” é ainda melhor. Temos aqui algo diferente do que eles vinham desenvolvendo: a frieza técnica quase impenetrável segue lá, mas é um álbum muito mais ríspido e direto, diferente da pegada quase mecânica de (ótimos) CDs anteriores. Isso dá nuances de cinza ao som do Krallice, criando uma experiência sonora que perturba e fascina na mesma intensidade. Os blackmetallers não podem perder esse aqui.

19) SEPTICFLESH — Codex Omega (Prosthetic Records)

Se tem uma coisa que a carreira do Septicflesh nos ensina, é que a excelência é uma questão não apenas de inspiração, mas de insistência. Há tempos esses heróis do metal grego vêm refinando a proposta de unir Death Metal com orquestrações, e “Titan” (2014) já tinha sido um grande sucesso nesse sentido. “Codex Omega”, o décimo CD da banda, mantém o mesmo nível, grandioso e brutal na mesma proporção — e ainda assim soa como algo renovado, talvez ainda mais afiado em alguns sentidos, trabalho de uma banda que se repete não para agradar fãs, mas para chegar cada vez mais perto da perfeição. Algumas composições não encaixam 100%, e “Codex Omega” pode cansar se ouvido em uma só sentada, mas o Septicflesh está muito à frente da concorrência, e lançou mais um álbum matador. Que venham muitos outros.

18) HELLRIPPER — Coagulating Darkness (Barbarian Wrath)

A ilustração da capa, exibida aí ao lado, não deixa dúvidas de que o Hellripper não é muito chegado a sutilezas. Essa one-man-band conduzida pelo escocês James McBain mescla Black e Speed Metal de forma absolutamente crua e brutal, com velocidade inclemente e alguns dos riffs mais alucinantes que se pode ouvir por aí. Sério, as palhetadas do cara em sons como “From Hell” e “Bastard of Hades” são tão rápidas que até parecem saídas daquele velho aparelho de K7 que rodava as fitas um pouco mais rápido que o normal. Imagine o Metallica do “Kill ’em All” obcecado pelo satanismo ingênuo da primeira metade dos anos 1980 e tocando como se quisesse bater recordes de velocidade e você terá uma ideia do que o Hellripper fez em seu debut, um dos mais ríspidos e divertidos CDs do ano.

17) ORDEN OGAN — Gunmen (AFM)

Quem acompanha mais de perto a cena do Power Metal Melódico sabe que o Orden Ogan é, há tempos, uma das bandas mais bem quistas dentro do cenário. Porém, esses alemães nunca tinham conseguido superar o status de eternas promessas, aquele tipo de banda que faz tudo certo, mas para a qual ainda falta um ‘algo mais’ indefinível que a coloque de fato entre os grandalhões do estilo. Eu diria que agora não falta mais, pois “Gunmen” é um CD excelente. Um álbum semi-conceitual em torno do imaginário do Velho Oeste, esse álbum tem músicas repletas de grandiosidade e melodia, sem perder o punch que se espera de um bom Power Metal. Que os detratores desistam das comparações com Blind Guardian antigo, pois o Orden Ogan finalmente virou realidade. Nada que reinvente a roda, mas olha, que disco bem bom.

16) CALIGULA’S HORSE — In Contact (InsideOut Music)

Esses australianos são uma das coisas mais bacanas surgidas no cenário Prog na última década, e a evolução de sua música é bem clara a cada lançamento. “In Contact” é, sem dúvida, o ponto alto da carreira dos caras, e traz um som que evoca sentimentos de contemplação e poesia. Talvez não seja um adjetivo comum para descrever uma banda de som pesado, mas o fato é que “In Contact” é um álbum, acima de tudo, bonito: muita melodia, contrastes bem costurados, excelentes diálogos entre voz e guitarras. Há vários momentos de peso e rispidez, mas mesmo eles servem a um propósito não de choque ou intimidação, mas de encantamento. Em um ano generoso para o Prog, o Caligula’s Horse gravou um CD memorável, que oscila entre o rock (menos) e o metal (mais) com total desenvoltura. Do lado de cá, a gente agradece.

15) ANCIENT ASCENDANT — Raise the Torch (Candlelight)

Chega a ser revoltante o pouco caso com que esses ingleses são tratados pela maior parte da crítica especializada. O CD anterior, “Echoes and Cinder”, já foi fácil uma das coisas mais legais lançadas em 2014, e esse “Raise the Torch” é outro que desfila triunfante diante da maioria da concorrência. O elemento central é Death Metal, mas o Ancient Ascendant soma muitos outros elementos ao caldeirão, em especial Black Metal (Bathory, em especial) e Power Metal oitentista. Em vários momentos, é como se uma banda Death surgisse no auge criativo da NWOBHM, uma combinação muito mais coesa e empolgante do que talvez possa parecer. Não é à toa que ninguém menos que Dan Swanö dá suporte e faz questão de produzir os caras: o Ancient Ascendant é uma das coisas mais únicas — e ainda assim inequivocamente metálicas — que se pode ouvir por aí. Pare tudo e vá atrás.

14) APOCALYPSE ORCHESTRA — The End is Nigh (Despotz Records)

O uso de elementos folk é um dos recursos mais comuns entre bandas pesadas, especialmente quando se trata de Power ou, alternativamente, de Black Metal. Entre conjuntos Doom, porém, o negócio é bem menos usual — e o Apocalypse Orchestra não apenas é uma das primeiras bandas a buscar essa ponte, como parece ter dominado bem rapidinho a fórmula. Em “The End is Nigh”, os arranjos folclóricos não surgem para suavizar a desgraceira, ao contrário: é quase como se ajudassem a desenhar o cenário, como se estivéssemos andando entre as ruas imundas de uma cidade fustigada pela peste negra. Me parece óbvio que alguma major logo vai assinar com esses suecos, pois o potencial é enorme. Enquanto isso, respire fundo e mergulhe nos contos soturnos que o Apocalypse Orchestra preparou para nos assombrar, pois vale a pena.

13) POWER TRIP — Nightmare Logic (Southern Lord Recordings)

Para muita gente, o Power Trip é uma das mais importantes novidades no Thrash Metal em mais de uma década — e ouvindo “Nightmare Logic”, segundo CD completo dos norte-americanos, fica fácil entender de onde vem essa opinião. O som clássico da Bay Area é uma influência óbvia, mas há generosas doses de hardcore e uma capacidade admirável de contrabalancear a velocidade com partes mais cadenciadas, ora pendendo de leve para o Groove Metal, ora remetendo à fórmula consagrada dos primórdios do Death Metal. Como se vê, há bastante coisa acontecendo criativamente no som do Power Trip, mas nada tema: tudo soa muito coeso e, acima de tudo, direto ao ponto, cada novo riff um novo convite ao headbanging mais desenfreado. Esses caras têm algo legal em mãos: ouça, divirta-se e mantenha essa banda firme no radar.

12) CLOVEN HOOF — Who Mourns for the Morning Star (High Roller)

O que você me diria se eu afirmasse que uma banda legendária da NWOBHM está lançando o melhor álbum de sua carreira agora, em pleno 2017? Bem, você estaria desculpado se achasse que sou maluco ou uma pessoa sem critério, mas estou muito perto de dizer que foi exatamente o que aconteceu com o Cloven Hoof no incrível “Who Mourns for the Morning Star”. Está tudo lá: vocais marcantes (a cargo do ótimo norte-americano George Call),trabalho matador de guitarras, produção poderosa (que quase sempre faltou à banda, aliás), trabalho gráfico belíssimo e, acima de tudo, composições sensacionais. Sempre achei “A Sultan’s Ransom” (1989) o auge musical de Lee Payne e cia., mas esse novo CD está no mínimo no mesmo nível, e é fácil um dos melhores gravados por filhotes da NWOBHM nessa década. Não cometa o erro de deixar passar.

11) MOONSPELL — 1755 (Napalm)

É comum ouvir/ler críticos reclamando que bandas consagradas acabam resumindo sua atuação a uma repetição de fórmulas com o passar do tempo. Aí, quando veteranos como o Moonspell gravam álbuns de pura ousadia como esse “1755”, são recebidos pelos mesmos críticos com quase total indiferença. Vai entender. Seja como for, os portugueses seguem a trilha aberta com o ótimo “Extinct” e assumem novos riscos, apostando em um CD conceitual sobre um terremoto que atingiu Lisboa e com todas as letras em português, pela primeira vez em sua carreira. Há muitos elementos sinfônicos (a abertura com “Em Nome do Medo”, por ex, é toda conduzida por corais e orquestrações) e até uma versão de “Lanterna dos Afogados” (sim, aquela) — e acredite, ficou sensacional. Gothic Metal audacioso, poderoso e emocionante, provando que Fernando Ribeiro e cia. seguem à frente na multidão.

10) ARCHSPIRE — Relentless Mutation (Season of Mist)

O CD anterior dos canadenses, “The Lucid Collective” (2014), trazia um Technical Death Metal técnico até demais, pesando a mão na quebradeira de tal forma que as composições acabavam soando frias demais. Fui ouvir o novo “Relentless Mutation” sem expectativas e, rapaz… Não apenas é muito melhor, como é talvez o melhor CD de Death ultra-técnico que escuto em vários anos. Não só a precisão é absurda (em especial do baterista Spencer Prewett, um monstro), mas agora essa técnica toda está a serviço de músicas muito melhores, cheias de ganchos e brutais até dizer chega. Eu consigo lembrar vários momentos de “Relentless Mutation” semanas após ouvi-lo, e isso faz toda a diferença em um subgênero onde tudo é técnico e inclemente, mas quase nada fica na memória depois da audição. O Archspire sai da zona cinza do Death Metal e, com esse CD, assume de vez a linha de frente da podreira.

09) NE OBLIVISCARIS — Urn (Season of Mist)

Não existe banda mais extrema no metal progressivo que o Ne Obliviscaris — ou será que não existe no metal extremo banda mais progressiva que o Ne Obliviscaris? Qualquer que seja a resposta, esses australianos mereciam muito mais cartaz do que recebem de fato — e “Urn”, o terceiro álbum completo de uma discografia até aqui impecável, é mais do que suficiente para demonstrar. Em comparação com o anterior (e muito bom) “Citadel” (2014), esse novo CD é mais sombrio e profundo, usando dissonâncias e melodias soturnas sem constrangimento — e é também mais coeso, com um impacto mais imediato que faltava em alguns momentos mais dispersos do CD anterior. Ríspido à beira do Black/Death Metal, o Ne Obliviscaris também conjura imagens sonoras de pura beleza enquanto aposta na mais pura quebradeira musical — tudo dentro da mesma faixa. Requer tempo, mas é altamente recompensador.

08) ENSLAVED — E (Nuclear Blast)

Para quem tem acompanhado a carreira desses heróis do som extremo norueguês, a sonoridade desenvolvida em “E” não trará grandes choques, embora certamente vá trazer momentos de pura estupefação. A mescla do Black/Viking Metal que os consagrou com elementos progressivo / psicodélicos, sonoridades épicas e muito experimentalismo vem sendo aperfeiçoada a cada CD, e o impressionante aqui é que os caras ainda encontrem terreno para surpreender e inovar depois de mais de 25 anos de carreira. “Storm Son” é uma das músicas mais incríveis de 2017, e tudo que vem depois está quase no mesmo nível — ou seja, prepare-se para cerca de 60mins do mais puro conhecimento de causa em metal avantgarde. Repito o que disse sobre “In Times” (2015): enquanto os mais jovens aprendem, o Enslaved segue no trono, mostrando a cada novo lançamento quem é que manda no pedaço.

07) SPIRIT ADRIFT — Curse of Conception (20 Buck Spin)

É muito estimulante ver bandas recentes, que ainda estão desenvolvendo os limites de sua visão musical, servindo de influência para outras ainda mais novas — e em poucos subgêneros isso é mais perceptível do que no Doom Metal, responsável por várias das melhores novidades na história recente do som pesado. O Spirit Adrift traz esse cenário de forma brilhante em “Curse of Conception”: a rifferama do Khemmis, a fluência emocional do Pallbearer, momentos quase psicodélicos à Yob… Tudo aparece nesse CD, somado a um vigor que remete a Candlemass e várias (mesmo) referências ao Heavy/Power britânico à Satan e Iron Maiden. Com todas essas influências mescladas à perfeição, o Spirit Adrift gravou um discaço, e logo vai ser ele a influenciar milhares de novatos por aí, pois o talento aqui demonstrado é fora de série.

06) TAU CROSS — Pillar of Fire (Relapse)

Esse projeto unindo Rob “The Baron” Miller (ex-Amebix) e Michael “Away” Langevin (Voivod) já parecia, desde o início, uma boa ideia. Unir uma lenda do crust com um dos mentores do Technical Thrash Metal tinha tudo para dar certo — e esse “Pillar of Fire”, segundo fruto dessa colaboração, prova a eficiência da iniciativa de forma espetacular. Desta vez, a banda somou à proposta Motörhead-tentando-ser-brutal-e-épico-ao-mesmo-tempo uma série de elementos acústicos, bem como uma influência crescente de metal mais tradicional — e o resultado é um disco que ainda traz elementos da rispidez punk, mas que soa muito mais maduro, reflexivo e confiante do que no (já muito bom) CD anterior (“Tau Cross”, 2015). Além de mais tipicamente Heavy Metal, o que nos interessa muito por motivos óbvios. The Baron já deixou claro que vem mais Tau Cross por aí — e nós, do lado de cá, mal podemos esperar.

05) LÖR — In Forgotten Sleep (Indep.)

Esse é, com folgas, o CD que mais me surpreendeu em 2017. Uma desconhecida banda de garotos da Pensilvânia (EUA) que lança, de forma 100% independente, um CD fodástico cheio de Prog / Folk / Power Metal do mais alto nível. Dizer que esses caras são audaciosos é quase um menosprezo: cada música é uma viagem em si mesma, cheia de elementos distintos que ganham coesão graças a um talento absurdo para a composição. O frescor que emana de “In Forgotten Sleep” é alentador, e vai ser difícil achar músicas mais ousadas e aventureiras que “Dusk” e “Song for the Lost”, para citar só duas. É um CD longo (quase 70mins) e a audição passa voando, sem qualquer espaço para acomodação. Para mim, é a melhor estreia de 2017, e mal posso esperar pelo que essa excelente banda nos trará a seguir. Para quem insiste na baboseira de que “é tudo igual” no metal, meu fraterno abraço.

04) PYRRHON — What Passes for Survival (Willowtrip)

Em primeiro lugar, eu amo essa capa. É brutal, incômoda e desalentadora, mas é impossível não ficar olhando longamente para ela. Há uma certa beleza na degradação que ela retrata, vamos admitir. E acredite: olhar para ela é sentir por antecipação parte do que “What Passes for Survival” vai despertar em você. É um Death Metal técnico e brutal, mas com total desprezo por virtuosismos, construções musicais lineares ou concessões de qualquer tipo. Respire fundo antes do play, porque o que vem a seguir é um dos mais demenciais assaltos musicais que você ouvirá nos últimos tempos — ou, que sabe, em toda a sua vida. Sim, esse CD está nesse nível. Quem ouve música para relaxar ou se divertir deve manter distância: o que o Pyrrhon fez foi gravar uma obra-prima de caos e extremismo musical, urdida com os fios do próprio inferno para provocar as mais perturbadoras sensações.

03) ELDER — Reflections of a Floating World (Armageddon Shop)

Quando lançou o estupendo “Lore” em 2015, o Elder saltou imediatamente para a linha de frente do Stoner/Doom em escala global. Comparado ao prodígio do som pesado que o antecedeu, “Reflections of a Floating World” é um CD menos imediato e que demanda mais tempo para funcionar a pleno — mas quando isso acontece, pode ter certeza que o efeito é dos mais duradouros. Aos poucos, o grupo vai expandindo sua paleta de sonoridades, e a entrada de um segundo guitarrista ampliou os elementos prog/psicodélicos tão importantes para a musicalidade única da banda. Ao mesmo tempo intrincado e etéreo, o som do Elder leva o ouvinte a outras dimensões, e não é preciso nenhum aditivo químico para delirar (não que eu esteja censurando o uso de substâncias do tipo, é claro). O Elder é uma das maiores bandas da atualidade, e esse CD é mais uma demonstração de genialidade pura, sem paralelos e quase sem concorrência. Essencial.

02) BELL WITCH — Mirror Reaper (Profound Lore)

Esse é um álbum monumental, em vários sentidos. Há tempos o Bell Witch está na linha de frente do Funeral Doom (o CD anterior, “Four Phantoms”, é uma omissão vergonhosa na minha lista de melhores de 2015), mas a morte de Adrian Guerra (que já era ex-baterista da banda) em 2016 foi um golpe tão duro que chegou a ser cogitado o fim das atividades. Não só seguiram em frente como gravaram “Mirror Reaper”, um reflexão poderosíssima sobre o luto e uma das maiores obras do estilo em todos os tempos, fácil. É uma única música lentíssima de mais de 80 minutos de duração (dividida em duas partes, apenas porque não caberia em um só CD), e vale citar que a banda não tem guitarras, com todos os riffs, solos e acordes feitos no baixo de Dylan Desmond. Embora a reiteração seja a grande arma musical dos caras, a capacidade do Bell Witch de encher seu som de camadas e variações é certeza de que a audição atenta trará tudo, menos monotonia. “Mirror Reaper” não é uma obra para qualquer ouvinte, por certo — mas quem se dedicar a esse disco com a mesma atenção que acompanharia um filme no cinema vai embarcar em uma jornada ousada e emocional como poucas vezes se ouviu no metal.

01) PALLBEARER — Heartless (Profound Lore / Nuclear Blast)

Foi difícil decidir quem ocuparia a primeira posição em 2017 — por um bom tempo, era o Bell Witch quem levaria a honraria, por exemplo. Mas uma derradeira audição de “Heartless” (e foram muitas durante o ano, podem acreditar) dirimiu de vez as dúvidas. Em resumo, o Pallbearer conseguiu algo que parecia quase inviável: usar como base o monumental “Foundations of Burden” (2014) e gravar algo ainda melhor. O Doom Metal altamente emocional dos norte-americanos agora está um pouco mais progressivo e, ao mesmo tempo, mais dinâmico, trazendo algumas das mais belas melodias escritas nessa década. A voz do também guitarrista Brett Campbell já trazia várias promessas, mas agora explode em emoção e confiança, sendo outro destaque em um CD recheado deles. E se alguém ouvir “I Saw the End”, “Dancing in Madness” ou “A Plea for Understanding” sem comover-se um pouquinho que seja merece a Medalha Coração de Pedra, no mínimo. Se existe uma banda Doom capaz de tornar-se gigante, essa banda é o Pallbearer — e, se assim for, “Heartless” será um marco nessa trajetória triunfante, um álbum para ser lembrado durante as décadas que virão.

OUTRAS COISAS LEGAIS DE 2017

Nossa, muita coisa. Mesmo! Como estou sem tempo para escrever um textão falando de cada uma, vou apenas listar abaixo, em ordem alfabética, algumas coisas que ouvi em 2017 e achei bem massa. Pesquisem, busquem e experimentem. Tem coisa muito boa — mesmo!

  • Abhorrent Decimation — The Pardoner
  • AlNamrood — Enkar
  • Astral Doors — Black-Eyed Children
  • Ayreon — The Source
  • Cannibal Corpse — Red Before Black
  • Cloak — To Venomous Depths
  • Condor — Unstoppable Power
  • Converge — The Dusk in Us
  • Cormorant — Diaspora
  • Darkest Hour — Godless Prophets and the Migrant Flora
  • Death Rides a Horse — More God Than Man
  • Droid — Terrestrial Mutations
  • Dying Fetus — Wrong One to Fuck With
  • Dyscarnate — With All Their Might
  • Epica — The Solace System
  • Europe — Walk the Earth
  • Fen — Winter
  • Force Majeure — The Rise of Starlit Fires
  • Forsaken — Pentateuch
  • Genocídio — Under Heaven None
  • Hallatar — No Stars Upon the Bridge
  • Hooded Menace — Ossuarium Silhouettes Unhallowed
  • Incantation — Profane Nexus
  • Immolation — Atonement
  • Jackknife Seizure — Starfisher (EP)
  • Jack Starr’s Burning Starr — Stand Your Ground
  • Kreator — Gods of Violence
  • Lich King — The Omniclasm
  • Malokarpatan — Nordkarpatenland
  • Mastodon — Emperor of Sand
  • Mors Principium Est — Embers of a Dying World
  • Mythra — Still Burning
  • Obituary — Obituary
  • Ophis — The Dismal Circle
  • Overkill — The Grinding Wheel
  • Paradise Lost — Medusa
  • Persefone — Aathma
  • Portrait — Burn the World
  • Pyramaze — Contingent
  • Sikth — The Future in Whose Eyes?
  • Skyclad — Forward Into the Past
  • Spotlights — Seismic
  • Succumb — Succumb
  • The Obsessed — Sacred
  • Threshold — Legend of the Shires
  • Tytan — Justice: Served!
  • Usnea — Portals Into Futility
  • Vulture — The Guillotine
  • Wolfheart — Tyhjyys
  • Wormwood — Ghostlands: Wounds from a Bleeding Earth

NOVIDADES NO VIL METAL PARA 2018

Por fim, uns breves comentários sobre o VIL METAL, programa web-radiofônico que vai ao ar na Rádio Estação Web, nas segundas (21h30) e nas madrugadas de quarta para quinta-feira (00h). No próximo dia 09/janeiro, entra no ar um especial com parte dos melhores CDs lançados em 2017, e a ideia é seguir produzindo novas edições frequentemente a partir daí . Não sei o quanto vou conseguir manter a regularidade, mas tentarei trazer novidades o mais periodicamente possível. Prometo também voltar a abastecer o Mixcloud com edições anteriores e especiais. Mas desde já convido todos e todas a seguir a conta do VIL METAL no Instagram, onde colocarei breves resenhas de tudo (ou quase tudo) que eu ouvir de metal daqui para a frente. Será mais um exercício pessoal do que exatamente algo sério: quero mesmo tentar disciplinar um pouco esse aspecto, e qualquer banda que quiser enviar material será muito bem-vinda, mas no fim das contas o lance é para ser divertido, então vamos nos divertir!

Se você chegou até aqui, você é foda. Obrigado por me dar atenção por tanto tempo. Metal é saúde, pratique! \m/

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Igor Natusch
VIL METAL

Jornalista. Ser humano. Testemunha ocular do fim do mundo.