Manutenção de Temer é o cenário mais provável.

A tal da crise, e as previsões que com ela surgem

Por que a situação é a pior possível mas mesmo assim a saída mais provável é o status quo.

Gabriel Azevedo de Sousa
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7 min readMay 25, 2017

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O Brasil vive um momento singular. A mídia aparece quase como um quarto-poder, com uma constante tentativa de interferir no funcionamento do Executivo, Legislativo e Judiciário, e não suficiente, os próprios membros de tais poderes estão exercendo com mais frequência suas funções atípicas do que típicas.

Matéria veiculada no Blog do Noblat (O Globo), escrita pelo Deputado Carlos Zaratini.

E qual a saída para isso tudo? Estaria a mídia certa? O melhor para o país é a Renúncia de Temer? E quem seria o melhor presidenciável em questão? (ou seria a saída uma nova constituinte, como defende o senador Renan Calheiros?

Ao que parece, esta mesma mídia já tratou de (tentar) responder estas questões. Para eles, Henrique Meirelles (Ministro da Fazenda) é um potencial presidenciável, assim como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e o ex-ministro Nelson Jobim.

A matéria pode ser acessada aqui.

Também se difunde pelos veículos de imprensa as formas de saída de Temer, entre elas a cassação pelo TSE, a responsabilização por crime comum em julgamento via STF, o impeachment e a renúncia. Certo. Mas e quais as chances de estes eventos ocorrerem? Para mim, as probabilidades de ocorrência de tais eventos é baixíssima, para não dizer nula. Explico:

1. Renúncia de Temer

O presidente da República foi mais do que claro no posicionamento adotado há exatos 7 dias, “Não renunciarei”. E é perfeitamente compreensível o posicionamento do presidente. Não precisa ir longe na história do Brasil para ver que em todos os casos de corrupção, fossem eles posteriormente comprovados ou não, os envolvidos simplesmente não admitem a corrupção e isso é algo não só natural como estabelecido como princípio legal. É entendimento que o direito de não produzir provas contra si mesmo (ou ainda, de permanecer em silêncio) não se restringe ao preso, e pode ser exercido por qualquer um, posto que já estabelece o Pacto de San José da Costa Rica:

Artigo 8. Garantias judiciais

(…)

2. Toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência enquanto não se comprove legalmente sua culpa. Durante o processo, toda pessoa tem direito, em plena igualdade, às seguintes garantias mínimas:

(…)

g. direito de não ser obrigado a depor contra si mesma, nem a declarar-se culpada;
(…)

Não é, portanto, nenhum absurdo achar que Temer não renunciará, como frisou no último dia 18. Ou absurdo ver Lula da Silva não admitir crimes, ou qualquer um dos demais acusados. Assim, considerando que renunciar é admitir a culpa, é natural supor que Michel Temer não renunciará.

2. Temer é julgado

São dois cenários que levam o presidente da República a julgamento: nas infrações penais comuns, pelo Supremo Tribunal Federal, e nos crimes de responsabilidade, pelo Senado Federal. Em ambos os casos, após admitida a acusação pela Câmara dos Deputados, por 2/3 de seus membros. (CF, art. 86. caput) a saber:

CF/Art. 86. Admitida a acusação contra o Presidente da República, por dois terços da Câmara dos Deputados, será ele submetido a julgamento perante o Supremo Tribunal Federal, nas infrações penais comuns, ou perante o Senado Federal, nos crimes de responsabilidade.

a. infrações penais comuns — STF:

Se tratando de justiça, não há como prever a atuação do STF no caso, o resultado de um possível julgamento pela suprema corte é uma incógnita atualmente.

b. crimes de responsabilidade — Senado Federal:

Já foram apresentados mais de 10 pedidos de impeachment contra Temer (o número é irrelevante, se pensar que Fernando Henrique Cardoso foi alvo de de 23 pedidos de afastamento, Lula da Silva de 39 e Dilma Rousseff de 36) mas esquecem os que defendem a certeza de uma saída por impeachment que o julgamento é político, subjetivo, e que para tal não só os dois terços da Câmara dos Deputados deveriam estar contrários ao presidente da República (ou seja, 342 deputados) como também 2/3 dos senadores (ou seja,54 senadores) e ainda, que a admissão está sujeita ao crivo do presidente da Câmara (Rodrigo Maia) de pautar ou não tais pedidos.

E como está a situação do presidente da República:

A matéria pode ser acessada no sítio da Folha de São Paulo, clicando aqui

E a matéria continua:

Em resposta a manobra da base aliada de barrar os debates na CCJ, a oposição passou a recolher na tarde desta terça-feira (23) assinaturas para a instalação na Câmara de uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) para apurar suspeitas de crimes cometidos pelo presidente Michel Temer.

Segundo o deputado Alessandro Molon (Rede-RJ) a instalação da CPI seria uma forma também de retaliar o fato de o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) se negar a analisar os nove pedidos de impeachment de Temer protocolados desde a semana passada.

Segundo Molon, em 15 minutos, ao menos 20 parlamentares já assinaram o requerimento. São necessários, contudo, 171 assinaturas favoráveis ao requerimento para a CPI ser instalada.

Atualmente, o cálculo que se faz é que a oposição teria cerca de 100 membros na Câmara. O número pode variar até 125, quando considerados partidos que estão divididos, como o caso do PSB. Embora tenha anunciado o desembarque do governo, o PSB tem um ministro, Fernando Filho (Minas e Energia) no governo, além de alguns deputados que ainda votam com a base de Temer

Ou seja, a situação não é de um governo fraco. É de um governo que encontra um número de até 125 deputados contrários, mas que possui ainda força para manter-se no poder.

3. TSE cassa Chapa Dilma-Temer

Cenário também bastante apontado pelas mídias, a cassação da chapa está em análise pelo Tribunal desde o ingresso do PSDB com a ação, em 2014. A matéria, que era relatada pela Ministra Maria Thereza de Assis Moura (STJ) foi distribuída, com sua saída da corte, ao ministro Antonio Herman de Vasconcelos e Benjamin, que já manifestou voto favorável à cassação e indica manter Dilma Rousseff e Michel Temer inelegíveis. Certo. Mas e os outros? o que ocorre é que o presidente da corte é ninguém menos do que o ministro Gilmar Mendes, que é amigo pessoal de Temer, cuja incumbência é presidir a sessão que venha a julgar a cassação da chapa e também dar voto de minerva em caso de empate.

O Ministro Gilmar Mendes é amigo pessoal de Michel Temer

Esquecem-se contudo, dos dispositivos regimentais aqueles que defendem a cassação, exponho:

Regimento Interno do Tribunal Superior Eleitoral:

Art. 18. Os processos serão vistos pelo relator, sem revisão, podendo qualquer dos juízes, na sessão do julgamento, pedir vista dos autos.

Isto é, o voto de Benjamin ser pela cassação não implica em ocorrer a cassação, já que qualquer ministro pode pedir vista dos autos, vista esta que não dispõe de prazo para devolução do processo. Portanto, mais um cenário que, para mim, não se verifica possível (a cassação), haja vista os dispositivos obstrutivos regimentais.

4. Convocação de eleições

A CF é clara quanto a anualidade ou anterioridade da lei que altera processo eleitoral e que quando se diz lei no artigo se refere a qualquer norma (incluídas emendas constitucionais). Assim, alterações só gerariam efeitos práticos em 1 ano. I.e.: na vacância do cargo, eleições indiretas. Para as quais o atual governo possui maioria. O que entendo como: o candidato eleito em uma eleição indireta manteria a mesma pauta atual.

Art. 16. A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 4, de 1993)

E a PEC de Miro?

Ainda que o art. seja claro em estabelecer se tratar de “a lei que alterar” e a Constituição Federal ser uma Constituição, não uma lei ordinária, o entendimento do Supremo Tribunal Federal é de que mesmo Emendas Constitucionais também se submetem ao disposto no art. 16 (ADI 4307 é um exemplo).

5. A Saída, portanto

O cenário econômico atual é de melhora, lenta, porém de melhora, como demonstram as expectativas de mercado. Fatos como os da última semana, com a delação de Joesley afetaram o mercado, que voltou a operar normalmente nesta semana, e vem lentamente recuperando as perdas que ocorreram entre a quinta e sexta-feira. Ainda levará tempo, mas a forma como o mercado vem operando demonstra que a crise política ainda que afete quando notícias surpreendentes aparecem é pouco afetado pela crise “constante”, como pode ser observado pelo valor do índice Bovespa:

Queda entre 17 e 18 com a divulgação da delação de Joesley Batista da JBS)

Assim, o cenário mais provável é, para o bem ou para o mal, o cenário também menos falado pelo “quarto poder”. Isto é, a manutenção de Temer, pois: em uma já improvável eleição indireta, quem substituí-lo-ia seria alguém indicado pelos defensores deste governo, e esta possibilidade em nada alteraria a atual situação (ou seja: aqueles que assumiriam manteriam a pauta atual).

Contudo, ainda que o governo tenha uma base parlamentar superior a 1/3 (isto é, são menos de 2/3 os deputados e 2/3 os senadores favoráveis à saída do presidente por renúncia ou por julgamento) sua força pode estar comprometida no que tange a aprovação de matérias mais polêmicas, como a reforma trabalhista e a reforma previdenciária.

Em minha opinião podemos esperar um Brasil apático e sem mudanças na chefia do executivo até o fim de 2018.

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Gabriel Azevedo de Sousa
Vinte&Um

Cientista político (UnB), Tomador de Mate e Pernambucano praticante, é torcedor do Náutico e do Boca.