¡Adelante!

Depois de Barcelona, a Espanha seguirá em frente e mais unida do que nunca

Candido Bugarin
Vinte&Um
4 min readAug 22, 2017

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Sergio Perez/Reuters

Se torna, para a grande maioria dos brasileiros, difícil entender exatamente o terror. Tal qual para os estrangeiros se torna difícil compreender a violência no Rio de Janeiro, que é completamente diferente do terrorismo. O terror deixa marcas profundas, cria medo irrestrito na população. O medo com o terror é disseminado por todas as áreas da cidade. Com o terror, você não sente medo de sair na rua somente a noite. Você sente medo durante o dia todo.

Em 11 de Março de 2004 eu tive a primeira experiência com o terror. Não era comigo, mas era com o meu país. Eu não estava lá, havia sido ferido ou atingido, mas percebi algo naquele lugar que eu sempre considerei como paraíso. Eu pude sentir o que representa para a população o terrorismo. Não era possível saber quem estava naqueles trens em Madrid. Primos, tios, parentes distantes, qualquer um poderia estar lá.

O medo naquela manhã era de que o ETA (Euskadi Ta Askatasuna, em basco), o Pátria Basca e Liberdade, estivesse voltando com mais força, mesmo que tendências se mostrassem contrárias a isso. Durante toda sua história, 58,62% das vítimas do ETA eram militares ou policiais. Desde o fim do governo franquista, em 1978, o ETA começa a preferir pessoas públicas. A estratégia do ETA não era matar deliberadamente cidadãos, mas sim se mostrar como um alternativa ao sistema em vigor, como grande parte dos grupos armados de esquerda, assim como o Grupo Baader-Meinhof. Mas não era o ETA. Era o terror islâmico, algo inédito na Espanha. 191 mortos e mais de 2.000 feridos com uma eleição a ser realizada em 3 dias. Anos depois, Barcelona está no mapa do terror.

Os terroristas, desta vez, não eram refugiados. Moram na Espanha legalmente e eram oriundos do Marrocos, território que durante muitos anos foi de posse da Espanha, que ainda mantém em seu território dois enclaves: Ceuta e Melilla. Em Ceuta ainda existe um muro que literalmente separa Marrocos da “Europa”. A escolha dos terroristas, ao atacar a antiga metrópole, parece bem sentimentalista. Um dos terroristas franceses, dos atentados de 2015, também tinha descendência argelina, ou seja, mais uma conexão entre Colônia — Metrópole. Falham as agências de inteligência que não conseguem se infiltrar nestes grupos. É possível começar a identificar que são raros os casos onde refugiados, no sentido mais completo da palavra, estejam intimamente ligados a ataques.

Porém, o principal reflexo do atentado não será na segurança, ou talvez, nem na vida do povo de Barcelona. Diferente de Guernica, Barcelona é uma cidade viva, pulsante, que em breve terá como lembrança remota os dias de horror que viveu. A maior contribuição que os terroristas deram foi a unidade nacional espanhola. Agora, a Catalunha se vê como parte de uma Espanha, por menor e mais estranho que esse sentimento seja. Em outubro, o desejo de independência da Catalunha vai às urnas mais uma vez, porém, nesta eleição, ainda estarão acesos os sentimentos de solidariedade e compaixão de toda a Espanha não catalã e até mesmo um sentimento europeu, status que a Catalunha deixará de possuir caso vote por sua independência.

Erram os terroristas quando, ao invés de atacar Madrid, Toledo ou até mesmo Sevilha e Malága, com o seu passado islâmico, atacaram Barcelona. Caso a Espanha tivesse que se preocupar com sua estrutura interna, com uma ruptura por parte da Catalunha, ficariam mais distantes seus objetivos na coalizão que combate o Estado Islâmico.

A Espanha vai prosseguir, mostrando que é uma nação que consegue abrigar em mesquitas templos católicos, como faz magistralmente em Sevilha. O ataque mostra que a palavra de Alá não é fundamental para os fundamentalistas. Em um dos vídeos, é possível ver uma mulher correndo de burca em fuga de La Rambla.

Quando pisei em Madrid pela primeira vez, em 2007, na estação Atocha, onde os terroristas de março de 2004 detonaram suas bombas, pude ver uma cidade cosmopolita que se recuperou e continuou. E o melhor caminho é com a liberdade. É continuar mesclando culturas, costumes, tradições, integrando sociedades. É avançando como o Ciudadanos (que já tratamos aqui) vem fazendo e tornando a vida dos cidadãos espanhóis mais justa e melhor.

Fiquei triste por Madrid em 2004, fiquei triste por Barcelona. Entretanto, é bom saber que tudo irá caminhar e que amanhã a minha terra, o lugar onde um dia irei repousar, para sempre continuará sendo um maravilhoso exemplo de como Islâmicos, Judeus, Católicos, Hindus e qualquer outra religião podem conviver em paz.

Candido Bugarin é cidadão espanhol.

Revisado por Bruno De Blasi

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