Falar sobre sexo: afinal, existe uma idade certa?

Larissa Bispo
Vinte&Um
Published in
4 min readMar 29, 2018

Há alguns anos, ouvi uma psicóloga infantil falar sobre o assunto e tomei uma decisão para o resto da minha vida: quando e se eu tiver filhos, eles saberão o que é sexo, eles saberão de onde vieram e entenderão que masturbação nada mais é do que descobrir o seu próprio corpo.

Mas sempre que eu falo sobre esse assunto as pessoas me olham com uma cara de choque que me faz questionar como eu farei isso. Eu não pretendo ter filhos agora, mas essa foi sempre uma questão que me incomodou, visto a falta de naturalidade que pais ao me redor lidam e lidaram com o assunto. É fato que isso ainda é um tabu não só no universo infantil, mas em diversas realidades e em diversos países. Algumas culturas orientais ainda veem o sexo como tema proibido entre as mulheres, e a própria sociedade brasileira ainda é muito dispare em relação à opinião sobre como, quando e onde pode-se falar sobre esse tema, e, principalmente, com qual idade.

E aí, pais, com qual idade?

Essa é uma pergunta pessoal, mas vamos conversar sobre isso. Eu não quero mentir para os meus filhos sobre a história de uma tal de cegonha que eles, muito provavelmente, vão fingir acreditar quando sentirem que eu estou nervosa; eu não quero quebrar o meu vínculo de confiança com eles fazendo-os acreditar que vieram de um lugar qualquer dentro de uma sacola; eu não quero que, quando perderem a virgindade, contem para pessoas que podem não saber o que fazer; eu quero saber o que fazer; eu quero que eles confiem em mim e tenham liberdade para falarem sobre isso, sobre algo que não é para ser visto de forma banal, não, não é isso, mas de uma forma um pouco mais natural.

Falo isso porque sou jovem. Falo isso porque ainda não tenho filhos. Sim, falo isso porque tenho uma visão de alguém que há não muito tempo descobriu coisas novas e soube lidar com isso, porque cresceu em um ambiente que lhe permitiu ter consciência, responsabilidade e saber que sexo é importante, sexo é fundamental, sexo envolve coisas além do que eu imaginava e deve ser levado a sério.

…E todo mundo faz.

A masturbação durante a infância é uma questão que eu quero conversar com meus filhos. Proibir uma criança de conhecer, descobrir e aprender com o seu próprio corpo não é educar. Impor limites é fazer ela entender que isso é normal, que todo mundo faz ou já fez um dia, mas discutir o que ela acha que significa e mostrar que ela não vê isso acontecer em qualquer lugar, a qualquer momento. Mas pode ser feita. A masturbação na infância não é erotizada, não é promíscua ou o início da vida sexual, é o primeiro passo do processo de autoconhecimento.

Pais, por favor, não acabem com isso. Digo isso principalmente em relação às meninas. Uma criança nasce e cresce com diversos padrões comportamentais que mal entende o que significam. As meninas têm que usar sutiã, os meninos podem ficar com o peito de fora; as meninas têm que sentar de uma determinada forma, têm que agir de determinada forma, têm que falar dessa mesma forma. Os garotos quando crescem falam sobre sexo na escola, com os amigos, com os irmãos mais velhos. E as meninas? Em um determinado momento, elas vão sentir vontade de falar sobre isso, vão descobrir que existem zonas que despertam prazer no seu próprio corpo. Mas o que fazemos com elas?

Criamos uma geração de mulheres que têm medo de serem quem são, que tomam atitudes precipitadas por curiosidade, que não são estimuladas a se conhecerem, a se descobrirem, a aceitarem quem querem ser. Criamos uma geração de adolescentes que se espelham em diversas situações porque não sabem onde se encaixar, porque o sexo surge de forma tão abrupta, tão anônima e distante que não percebem o que representa.

A conversa sobre sexualidade da maioria dos meus amigos homens se resumiu à “use camisinha”, um pacote delas dado pelos pais e um sorriso no canto do rosto. A maioria das minhas amigas mulheres nunca falaram sobre sexo com os pais. Elas não se sentem confortáveis. Os pais não se sentem confortáveis. E por quê? Por que falamos tanto sobre isso no bar, no salão de beleza, nas novelas, nos filmes e cada vez mais no livros, mas não em casa? Pais, “use camisinha” não é o suficiente; “eles são muito novos para entenderem” uma vez que já fazem, não é nada além do que mentirem para si mesmos.

As regras e limites só podem ser impostos quando os jovens entenderem o que significam, a real importância e necessidade deles, que é imensa, visto a quantidade de adolescentes que engravidam sem planejar hoje no país, a crescente hiper sexualização infantil pela mídia, a quantidade de crianças abandonadas pelos pais, sem falar no número de mulheres que perdem a vida em abortos ilegais, mas, bem, isso aí já é assunto para outro dia…

Larissa Bispo é apaixonada pelas entrelinhas da vida, pelos mistérios no óbvio e pelas complexidades que abrigam as coisas mais simples.

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