minha primeira leitura sobre ser professora

Nayara Peneda Tozei
virei professora… e agora?
4 min readFeb 19, 2014
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Sempre temo quando se promovem cursos de atualização de professores e chegamos ao inevitável ponto do professor como jardineiro de almas. De todas as metáforas da minha profissão, essa é a que reúne dois defeitos graves: é cafona e esconde a dura realidade do cotidiano da sala de aula. (Leandro Karnal)

Nos tempos de vestibular e de Orkut, costumava acompanhar discussões em uma comunidade de História. Esperava ler alguma discussão que me ajudaria no vestibular. Ingenuidade ou não, gostava das falas de alguns membros, pela história ou pelo humor. Um deles era o Leandro Karnal, professor na Unicamp. Depois de seu orkuticídio e do próprio fim da era Orkut, fiquei procurando textos dele, não textos acadêmicos, mas algo que tivesse a liberdade de humor de uma rede social.

Descobri uma participação dele no Café Filosófico. E depois vieram outras, sempre espetaculares, claras e com um humor muito agradável! Se eu gostava do estilo dele na História, passei a gostar ainda mais no Café Filosófico, em que os temas eram mais gerais e eu conseguia acompanhar melhor. Li a sinopse de alguns de seus livros e o momento me levou a comprar “Conversas com um Jovem Professor” quando fui aprovada em um concurso para dar aula em 2012.

A leitura veio a calhar. Seria a primeira vez lecionando como professora e não mais como aluna em monitoria ou substituindo algum professor. As dúvidas que iam surgindo eram as mais diversas, das sérias às banais: desde organizar o conteúdo da disciplina à roupa que eu deveria usar. Passava por como lidar com indisciplina (não sou de gritar, falo baixo e tenho cara de aluna) e com o feedback negativo dos estudantes. Queria saber como preparar a aula dentro do tempo certo e de modo que os alunos aprendessem alguma coisa, como elaborar uma boa prova e como lidar com reprovação e colas. Qual estratégia usar, powerpoint ou quadro, reprovar por falta ou não, dar mais exercícios e passar horas corrigindo ou focar em provas…

O livro tem um tom mais leve, com conselhos práticos para quem está começando. E o professor com quase 30 anos de magistério alerta desde o início que “nada no planeta pode substituir a experiência de enfrentar uma turma pela primeira vez”. Com eu isso eu meio que me sentia autorizada a ficar ansiosa.

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É ruim sentir-se um obstáculo à felicidade daquelas pessoas que prefeririam estar fazendo qualquer coisa, menos estar ali. (Leandro Karnal)

As dicas que li foram muitas. Tentava lembrar enquanto trabalhava, mas as informações foram além do que minha rotina conseguiu incorporar. Infelizmente, para mim e para os alunos. Como era professora temporária, meu contrato durou pouco: apenas dois semestres. Depois, tive uma experiência em uma empresa e parei porque gostei mais de dar aulas. Surgiu outro concurso e passei. Enquanto fico na longa espera da convocação (será que a greve vai aumentar minha espera?), resolvi reler o livro e me preparar para a próxima fase como professora. E dessa vez eu grifei, que é pra retomar de quando em quando, pelo menos onde ficou amarelinho. Pra diminuir os riscos de esquecer algum conselho importante.

Leandro Karnal fala sobre o cotidiano de um professor, o que inclui, é claro, um bocado de coisas. Especialmente interessante para quem está começando, pois o cotidiano ainda não virou rotina, muito menos banalidade, e ainda há bastante tempo para corrigir qualquer problema. A leitura é fácil, bem humorada e traz algumas reflexões sobre o modo de agir que se deseja ter.

O algo a mais do livro é que ele também fala dos próprios erros e das muitas coisas ruins de ser professor. Ele trata o professor como uma pessoa que tem seus altos e baixos, seus momentos de ira e desilusão, suas dúvidas e cansaços. O professor médio dificilmente será aquele herói do cinema que salva todos os alunos de uma escola precária de suas vidas miseráveis. Aliás, outro ponto bacana do livro é finalizar cada capítulo com uma dica de filme. São filmes contando a história de algum professor.

A leitura quase me fez desistir de criar este blog. No começo, Karnal conta que achou que aquele era um bom momento para escrever as conversas. Porque ele não tinha mais o entusiasmo excessivo de quem está começando, mas também não tinha chegado à melancolia semiamarga da experiência. Eu estou começando. Mas antes que o cansaço estrutural chegue, espero aproveitar bem meu entusiasmo de jovem professora.

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