Fifa 19, Lei e liberdade

Bruno Emídio
Vitral
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5 min readFeb 13, 2020

Como a limitação nos permite uma habilitação criativa.

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Mais um dia comum, calor de verão, e dois amigos se reúnem para uma grande e épica disputa: Quem vai vencer uma partida aleatória de videogame? É, você pode se questionar: esse fato é realmente importante? Bem, você tem razão, realmente não é nada demais. Porém, uma tarefa que parece tão trivial me instigou a refletir e por em palavras coisas que considero mais elevadas: A liberdade da Lei de Divina!

Ao visitar minha cidade natal durante as férias, não é incomum que uma hora ou outra eu me encontre diante destas “disputas épicas”. Diante disso, para variar o jogo, ou apenas mais uma loucura minha, propus ao meu rival “videogamístico” que jogássemos sob uma série de normas — que se restringisse o número de clubes a serem escolhidos e a maneira como estes clubes pré-selecionados se enfrentariam num campeonato até a final — , seguindo o desenho da Champions League 2019/20 a partir das oitavas-de-final. Foi a partir dessa experiência, percebendo que certas normas e parâmetros traziam uma vivência de jogabilidade mais plena e com significado para as partes envolvidas, pude, através dos ensinamentos catequéticos¹ sobre a lei, relacionar e entender que os mandamentos e normas que nos são dados habilitam, e não aprisionam, Como normalmente se pensa.

O conceito moderno de liberdade geralmente está atrelado a uma ideia negativa, ou seja, ser livres de restrições. Se dá ênfase autonomia individual. Teríamos assim mil opções e várias formas da liberdade ser experienciada . Essa é uma definição possível, mas creio que incompleta. Não existe liberdade sem estrutura. Toda ação e escolha depende de condições mantidas por possibilidades estruturantes. Isso contrasta com este ideal moderno de que se é possível aumentar a liberdade destruindo as estruturas.

Um pássaro só consegue voar debaixo da limitação que o ar lhe impõe.

Quando alguém , por exemplo, decide apenas se envolver em relacionamentos superficiais, com o máximo de pessoas possíveis por medo de “ficarem presas”, e, consequentemente “perder” sua liberdade, no fim das contas, não teve nenhum relacionamento verdadeiro.

No sistema de consumo contemporâneo, em que há a possibilidade de adquirirmos produtos novíssimos e descartar os antigos com facilidade, o que parece estar por trás desta mentalidade é o desejo de não fazer uma escolha definitiva. Tomar decisões necessariamente implica em definir-se. Se é possível apenar ficar com algo por tempo determinado e curto, no fim da contas, não preciso fazer nenhuma escolha real, pois em breve terei posse de algo novo.

Escolhas que não nos definem não são escolhas reais.

Essa infinita procura por algo novo e mais interessante, por ter sempre milhares de possibilidades em aberto, oferece a sensação de liberdade, pois não nos “limitam”, está intimamente ligada à logica de consumo, em que tudo se torna descartável e assim, aqueles que não se comprometem com nada parecem “preservados”.

Escolhas nos dão forma, nos deixam menos líquidos, abstratos e com isso perde-se a sensação das possibilidades.A juventude, caracterizada pela indefinição, parece se esvanecer. Como aprendi em minhas aulas de existencialismo: “A angústia surge da consciência de nossa liberdade, surge da responsabilidade por nossos atos”².

A medida em que ficamos mais “concretos”, ou seja, nos definindo através das escolhas e vendo as infinitas possibilidades desaparecerem, podemos ser tomados pela sensação de envelhecimento. Com o passar do tempo nos percebemos cada vez mais finitos. E em um mundo que não crê em Deus e sua eternidade, a tentativa humana de alcançar essa infinitude é a maximação das possibilidades. Neste contexto falar em Lei realmente é muito incômodo.

Tiago, porém, traz a lei em outra perspectiva, mais completa.

Ele fala de lei da liberdade.

Falem e ajam como quem vai ser julgado pela lei da liberdade. Tiago 2:12

Alguns de nós podem ter uma visão infantil, algo que apenas aprisiona, da Lei. Observando o incrédulo e imaginado que ele, por não ter de obedecer ordenanças bíblicas, é mais livre. Você só não vai pelo mesmo caminho porque “sua religião não permite”. Assim é impossível enxergar a Lei como algo que liberta.

Os 10 mandamentos são exemplos de como só é possível libertar o homem através de uma lei superior. No Egito o povo hebreu era escravo debaixo dos falsos deuses, quando são finalmente tirados de lá eles precisam ser educados para viver a liberdade em Canaã. O decálogo foi conferido ao povo para tirar o Egito deles.

É necessário um alto grau de controle para ter liberdade em uma série de atividades. Imagine um motorista, ou um músico. Eles só podem desempenhar o máximo de sua capacidade criativa (fazer o que quiserem) a partir desta habilitação que o controle lhes oferecem.

Aquilo que aparentemente limita pássaro, é o que o habilita a voar.

Jesus parece definir a liberdade como um modo de viver no mundo.

“Se vocês permanecerem firmes na minha palavra, verdadeiramente serão meus discípulos. E conhecerão a verdade, e a verdade os libertará”. Eles lhe responderam: “Somos descendentes de Abraão e nunca fomos escravos de ninguém. Como você pode dizer que seremos livres? “ Jesus respondeu: “Digo-lhes a verdade: Todo aquele que vive pecando é escravo do pecado. O escravo não tem lugar permanente na família, mas o filho pertence a ela para sempre. Portanto, se o Filho os libertar, vocês de fato serão livres.

João 8:31–36

Ele não reduziu a liberdade daqueles judeus simplesmente ao fato de não estarem submetido a outras nações, amas apontou que “aquele que vive pecando é escravo do pecado.” Sem a palavra de Jesus, somos dominados por outras forças.

Conforme G.K Chesterton³:

É sempre simples cair; há um número infinito de ângulos para levar alguém à queda , e apenas um para mantê-lo de pé.

Deste modo, só há então, uma forma de ser livre, liberdade esta que nos habilita para a criatividade. Assim como no fifa 19 liberdade não se traduziu em estar diante de mil possibilidades, mas sim diante de limitações que nos permitiu uma vivência mais significativa e plena da realidade do jogo, permanecer em Jesus é viver a opção correta diante das infinitas possibilidades da existência.

1 — Intensivo catequético ministrado em 2016 na Igreja Esperança em Belo Horizonte por Guilherme de Carvalho. Todos os conceitos mencionados no texto em relação à liberdade foram retirados desta ministração.

2 — Sartre, J. P. O Ser e o Nada: Ensaio de ontologia fenomenológica, trad. Paulo Perdigão Petrópolis: Vozes, 2002. p. 72

3 — Chesterton, G. K., 1874–1936 Ortodoxia / Gilbert K. Chesterton ; traduzido por Almiro Pisetta. — São Paulo: Mundo Cristão, 2008, p. 168

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Bruno Emídio
Vitral
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Feito filho de Deus pela obra de Jesus, Mutuense,quase psicólogo e amante de metalcore e tatuagens.