A postura dos Racionais, do tom autoritário ao coletivo
Nos primeiros trabalhos, em Holocausto Urbano, pode-se dizer que o grupo ainda não tinha encontrado a linguagem mais adequada à sua proposta.
Denúncia e crítica social já eram o foco, mas nessas canções iniciais Brown assume uma postura autoritária, acusando a periferia de ser alienada, como em “Beco sem saída”: “Ficam inertes, não se movem, não se mexem/ Sabe por que se sujeitaram a essa situação?/ Não pergunte pra mim, tive você a conclusão”
O tom acaba causando distanciamento e reproduzindo, sem querer, uma violência que criticavam. O próprio Brown anos mais tarde afirma que não canta mais essas músicas por conta da atitude arrogante e distanciada.
Aí vem ‘Sobrevivendo no Inferno’ e tudo muda. O ponto de vista particular (de senhor da verdade) deixa de ser o foco principal, dando lugar à uma mistura de vozes e olhares contraditórios entre si.
Em ‘Capítulo 4, Versículo 3’, dá pra ver com clareza a mudança. Aparece um personagem viciado na música, e toda vez que Blue o recrimina, surge a voz de Brown como um contraponto:
“Ei, Brown, sai fora, nem vai, nem cola
Não vale a pena dar ideia nesses tipo aí
Veja bem, ninguém é mais que ninguém
Veja bem, veja bem, e eles são nossos irmãos também
Mas de cocaína é crack, uísque e conhaque
Os mano morre rapidinho sem lugar de destaque
Mas quem sou eu pra falar de quem cheira ou quem fuma?
Nem dá, nunca te dei porr* nenhuma”
O tom agora é outro, daquele que quer, em conjunto, ‘conseguir a paz de forma violenta’, pregando a palavra da coletividade.
Viva ‘Sobrevivendo no Inferno’, uma das grandes obras da nossa música popular!