Product Manager do Airbnb wannabe.
A desculpa que eu precisava para opinar em um dos meus produtos do coração.
Quem nunca teve milhões de ideias de melhorias e novas features para seu produto digital preferido? Sim, para nós que não precisamos administrar recursos (financeiros e de equipe), priorizar várias dessas melhorias e novas features, programar, desenhar, combinar os interesses de todos stakeholders envolvidos ou ter qualquer responsabilidade com alinhamento à visão do produto, é fácil!
"O mapa deveria mostra as opções que eu já visualizei." "Por que as atividades ficam tão lá para baixo?" "Por que o ícone dos contatos é um balão de conversa e não uma pessoinha?" "Queria poder mesclar dois tipos de atividades em uma só."
Eis que surge o dia em que eu não apenas precisei ter ideias inovadoras para melhorar o produto alheio (oba!), como também precisei esboçar o planejamento e execução delas (justo, né?).
Em junho de 2017, tive o prazer de fazer o curso completo de Product Management da General Assembly em São Francisco (mais textos sobre ele por aqui em breve). Seguindo o ditado "I do and I understand", todas as lições do curso são acompanhadas de tarefas que, juntas, vão levando à composição do projeto final: a "construção" de um novo produto ou uma nova feature de um produto já existente.
Como eu não ia perder a oportunidade de aproveitar todas as ideias que potencialmente estariam no backlog caso eu fosse do time de produto do Airbnb, optei pela segunda opção — criar uma nova feature para o produto deles.
Divido com vocês, a seguir, o projeto desenvolvido por mim em 6 dias, paralelamente a aulas 9–5. Intenso!
A feature Social Recommendation para o Airbnb.
Comecei apresentando a persona, construída por meio da combinação dos perfis de diversas pessoas identificadas como o público da feature e, posteriormente, entrevistadas em profundidade.
Nossa persona tem ao redor dos 50 anos, trabalha bastante e gosta de viajar sempre que pode, além de investir em experiências autênticas. Gosta de conhecer as novidades que surgem na cidade (novos bares e restaurantes). Quando viaja, sempre fica em hotéis e nunca usou o Airbnb. Normalmente prefere fazer as coisas "da forma antiga" do que arriscar com novas soluções que estão na moda. Ao aprender novas tecnologias (apps e redes sociais), prefere que alguém que já sabe usar ajude e explique o funcionamento das coisas.
Ao idealizar esse projeto, eu acreditava que o problema a ser resolvido com a feature era:
Fazer o Airbnb crescer junto ao público de viajantes mais tradicionais (que nunca haviam usado o serviço) através do aumento de sua confiança, pois os mesmos são resistentes à ideia de mudar de hotéis para Airbnb.
Porque os mesmos tinham medo de que o lugar não existiria, que o host seria um maluco que apareceria no meio da noite, que iam sumir com o dinheiro dela, etc.
Mas então aconteceu algo muito interessante, principalmente por ser algo recorrente na vida dos gerentes de produto. Eu conversei com "a" persona e descobri que eu estava errada. Esse público, na verdade, não estava resistente, mas sim bastante inclinado a testar o Airbnb pela primeira vez.
Ele só precisava de um empurrãozinho final que o fizesse mudar o hábito tão estabelecido de reservar um hotel.
No fim, o problema continuava sendo fazer o Airbnb crescer junto ao público de viajantes mais tradicionais (que nunca haviam usado o serviço) através do aumento de sua confiança, mas não porque eles tinham medo ou dúvidas sobre a idoneidade da empresa.
O problema central era dar aquela motivação e confiança final que a persona precisava para mudar seu antigo hábito.
E o fator chave que eu identifiquei para que o problema tenha sido o segundo, e não o primeiro, é a família e os amigos dessa persona.
Ela já passou da fase de ter medo do produto. Isso porque muita gente ao redor dela usa e adora. Nunca tiveram problemas. E ela ouve esses comentários o tempo todo.
Com esse aprendizado, a minha ideia inicial de feature mudou.
Inicialmente, quando eu achava que a persona não estava inclinada a usar o Airbnb por temer o funcionamento do serviço, a hipótese era:
Possibilitar que os potenciais novos usuários (hóspedes) do Airbnb vejam fotos dos locais tiradas por outros hóspedes (como eles) aumentará a sua confiança e, consequentemente, o número de novos usuários.
Dessa forma, se a persona estivesse insegura quanto à existência do local ou sobre se ele seria assim como mostrado nas fotos do site, ela se sentiria mais segura. Não seriam apenas fotos tiradas pelas partes interessadas em alugar o local, mas por pessoas reais, como ela.
Com a nova descoberta, essa feature não resolveria problema algum.
No entanto, foquei no ponto chave que desbancou minha teoria inicial. Se as pessoas que nunca usaram o Airbnb estão abertas a testarem essa opção em função de boas experiências das pessoas que conhecem, por que não organizar essa "conversa" dentro da própria plataforma?
Foi aí que nasceu a ideia da Social Recommendation. Sua hipótese é:
Mostrar para as pessoas dentro da plataforma do Airbnb seus amigos do Facebook que já utilizaram o serviço — e facilitar o contato com eles para perguntar como foi a experiência — aumentará a sua confiança e, consequentemente, o número de novos usuários.
Sim, eu achava que a primeira ideia de solução era ótima, e foi um pouco difícil de aceitar que era preciso deixá-la de lado e mudar. Mas foi também muito motivador "construir" algo que fosse verdadeiramente útil para o usuário, e não algo que eu particularmente achava muito legal e adoraria ter no produto.
Bom, e como a Social Recommendation funcionaria? Rascunhei alguns caminhos para o usuário interagir com a feature na plataforma.
O primeiro deles é quando o usuário já está logado no site, e está usando a busca por locais. Ao preencher a cidade (São Francisco, por exemplo) e as datas, ele passa para a página de resultados. Nela, junto aos locais disponíveis, ele vê seus amigos do Facebook que já visitaram São Francisco. Ao clicar no amigo escolhido, ele visualiza uma janela de chat, envia a mensagem ao amigo — checando como foi sua experiência com o Airbnb — , e essa mensagem aparece em seu Facebook como uma mensagem normal da plataforma.
Para ver melhor como isso se pareceria na página de resultados da busca:
Mas, obviamente, um usuário que nunca reservou pelo Airbnb possivelmente não tem uma conta ainda. Isso nos leva à segunda forma de interagir com a feature.
Na página inicial de quem está deslogado foi planejado um botão que convida o usuário a criar uma conta já avisando sobre a possibilidade de ver seus amigos do Facebook por lá. Esse botão leva ao mesmo caminho do Sign Up/Log In.
Seria mais ou menos assim:
Por fim, planejei uma terceira forma de navegar pela feature, uma seção no site dedicada apenas a isso. Denominei de "friends session".
Nela, o usuário encontraria um mapa do mundo com todos os seus amigos que já utilizaram o Airbnb e onde. Com um zoom no mapa, ele poderia escolher o amigo a ser consultado, e daí o processo seria mais ou menos o mesmo indicado na opção 1.
Obs: por questões de privacidade, já estava planejado que todo usuário poderia desabilitar essa função se desejasse, para que não fosse possível que seus amigos visualizassem que ele utilizou o Airbnb e onde.
O roadmap simplificado da feature seria esse:
Além dos três desdobramentos apresentados, também planejei aproveitar a integração das duas plataformas (Airbnb e Facebook) para possibilitar que as pessoas fizessem recomendações ativas no Facebook de lugares que ficaram e, possivelmente, recebessem algum benefício caso algum amigo seu reservasse no site através dessa recomendação.
Mas como saber se a feature iria mesmo aumentar o faturamento da empresa através da conversão de novos usuários, conforme planejado lá na frente?
Por meio de um teste A/B, mostrando as novas funcionalidades para metade dos usuários do site, seria possível visualizar os efeitos da implementação.
Os principais KPIs a serem monitorados para assegurar o sucesso da feature seriam: o número de novos usuários (hóspedes), o tempo para fazer a reserva e a taxa de conversão (quantos visitantes do site de fato efetuavam a reserva).
Em uma comparação do Airbnb com seus principais concorrentes (hotéis e pousadas), a Social Recommendation ganha destaque no quesito avaliações de usuários por possibilitar o fator social. Dificilmente os tradicionais hotéis conseguiriam integrar as avaliações com a rede de amigos de seus usuários, algo de extremo valor para o cliente. Afinal, fica muito mais fácil confiar na opinião de um rosto conhecido.
Assim, depois de muito trabalho e diversão, a maior lição que ficou desse projeto é que mais importante que vir com soluções é saber identificar o problema certo. Algo bem conhecido na teoria do mundo de produto, mas frequentemente negligenciado na prática.
Não existe saber sobre o produto sem saber sobre as pessoas que vão usar. É preciso falar com elas. Mais precisamente, é preciso ouvi-las.