A canoa é assim

…pelo menos para mim

Sim, hoje também é sobre canoas. Não vou descrever as cores, nem dizer-vos que a partilhámos com porcos, galinhas e cabras. Sim, deste lado consigo ouvir o vosso suspiro “oh não! Canoas outra vez!”. Mas da Ilha de Bubaque para Bissau é o que temos. Bem, há lanchas. Ah, e helicópteros. E, para as irmãs, que querem sempre o melhor para nós, essas eram possibilidades. Para nós não.

Foram quatro horas parcialmente deitadas sobre tábuas de madeira, outras vezes sentadas com os pés pendentes, dobra perna, estica perna… enfim, deixámos só o pino por fazer para uma próxima vez. Mas na canoa é assim. Na canoa partilhamos bolachas com duas pessoas, que as dividem para darem para outras tantas. Na canoa uma adolescente chora compulsivamente e estendemos-lhe um lenço de papel e um carinho. Não falamos crioulo, mas conseguimos perceber que vai buscar o pai, que morreu ontem, a Bissau. Porque na canoa é assim. E um senhor tenta explicar as duas tonalidades do mar, a de Bissau e de Bubaque, que nunca se misturam. Um computador faz as delícias de mais do que as mãos conseguem contar e, mesmo sem pipocas, monta-se uma sala de cinema. E de repente alguém pergunta “são portuguesas? Ah, conheço Portugal, aliás vivi na Reboleira”. Na canoa é assim.

Hoje estou moída, as costas queixam-se e reclamam descanso. Mas tinha de deixar os dedos caminharem sobre as teclas, até porque o caminho foi traçado na viagem.

A Eunice é quase sempre a inspiração dos textos do blog. Nunca são sobre ela, é certo, mas quase sempre partem de algo que ela disse, fez ou decidiu não fazer, de um gesto ou de um olhar. Hoje não é excepção. No meio da canoa, rodeadas de pessoas, de calor e de animais, ela lia. Ela era parte do quadro. Parecia voltar a casa ao fim de um dia de trabalho, uma banalidade, a rotina que já não maça. Se é para eles, é para nós. A canoa é assim.

Amanhã partimos para Empada. E terminam as canoas… como meio de transporte! Cheios de força para esta viagem?

Boa noite a todos!