Revelar fotos voltou ao cotidiano de muitos jovens em Fortaleza (FOTO: Raniel Lima)

MERCADO VINTAGE

O revival das analógicas

Em tempos de Instagram, jovens se rendem à fotografia em filme

William Barros
William Barros
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6 min readFeb 11, 2020

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Reportagem produzida para a editoria “Diversão”, do portal Tribuna do Ceará, em 2020.

Filme de 36 poses, bobina, laboratório de revelação e negativo. Esses termos parecem fora de uso, mas estão cada vez mais presentes no cotidiano dos millenials — nascidos entre o fim do século 20 e início do século 21. Seja por nostalgia, curiosidade ou apelo à estética retrô, muitos desses jovens têm se dedicado ao resgate da fotografia analógica.

Os registros feitos por essa geração não se restringem aos álbuns de família e porta-retratos. Fotos registradas em filme fotográfico também estão tomando conta das redes sociais. Prova disso é a #35mm, que reúne mais de 23 milhões de imagens deste tipo no Instagram. Entre as publicações, há diversos trabalhos feitos por jovens de Fortaleza, cidade onde resistem fotógrafos e reveladores, profissionais e amadores.

Kayan, Gabriel e Andressa (da esquerda para a direita) publicam seus registros em perfis no Instagram (FOTOS: Arquivos pessoais dos entrevistados)

Andressa Gonçalves, de 22 anos, cresceu vendo os pais registrarem os momentos em família. A estudante de jornalismo decidiu adotar esse hobby há seis anos. Para ela, o revival analógico está atrelado à memória afetiva. “Acho que a minha geração especialmente se atraiu mais fácil por isso, porque fez parte da nossa infância. A gente viveu essa transição do filme para o digital”, argumenta a universitária.

Gabriel Marques, também de 22 anos, viveu uma experiência parecida com a de Andressa. Fotógrafo de moda, o jovem levou a fotografia analógica para seus trabalhos. Na visão dele, esse resgate está relacionado à magia do registro. “É outra textura, outra mágica. A luz que vem do ambiente bate no objeto, passa pela lente e sensibiliza o filme. Um pedaço da luz que tocou a pessoa fez a foto existir”, enxerga o fotógrafo.

Kayan Rodrigues, de 24 anos, cresceu ouvindo relatos sobre “perrengues” enfrentados ao lidar com filmes fotográficos. Além de fotografar, o produtor audiovisual começou a revelar recentemente. Ele acredita que esse resgate tem relação com a curiosidade. “Tem a ansiedade para saber se o filme não queimou. Coisas que o digital não oferece e que podem encantar muita gente. Passa uma sensação de ligação maior com as fotos”, explica.

Um encontro de gerações

As paisagens de Fortaleza estão entre os registros mais comuns entre os que fotografam em filme (FOTO: Raniel Lima)

Muito antes desses três jovens nascerem, Maria Luíza já trabalhava no ramo da fotografia. Há 31 anos, ela é proprietária da Superfilm, uma empresa localizada no Centro e que presta serviços fotográficos. Ela cobra R$ 12 e R$ 13 pela revelação e digitalização de filmes, respectivamente.

A empresária estima fazer de 20 a 50 revelações por mês. Segundo ela, a entrega do material pode demorar um pouco. “Como não tem muita revelação e o consumo de energia do equipamento é alto, se você traz só um filme, R$12 não pagam nem o consumo de energia. A gente dá um prazo de três dias”, explica.

Maria Luiza confirma que a maior parte de seus clientes são jovens universitários. Segundo ela, o contato com esse público tem permitido uma troca de aprendizados. “Eles já me disseram que eu estava falando errado, porque vêm com a ideia de quem está na faculdade. Acho interessante, porque a gente tem essa conversa com o jovem”, revela ela, que está no ramo há 40 anos e aprendeu tudo na prática.

Serviço alternativo

Além de fotografar em filme, o analista de sistemas Raniel Lima revela imagens em preto e branco na sua própria casa. Por R$ 15, ele oferece serviço de digitalização de negativos já revelados. Raniel também comercializa filmes fotográficos, com preços que podem variar de R$ 20 a R$ 50.

Para ele, as fábricas de filmes já se deram conta do revival da fotografia analógica e estão investindo nisso. “Filmes que tinham sido descontinuados voltaram a ser fabricados, como o Kodak Ektachrome e o Fuji Across 100. A Kodak e a Fuji ainda são as grandes marcas que continuam no analógico. Já as máquinas, elas são mecânicas e podem durar uma vida”, analisa.

Os serviços de Raniel podem ser contratados em seu perfil no Instagram. É lá onde ele também compartilha suas produções enquanto fotógrafo, com registros de momentos pessoais e da vida urbana.

Gabriel e a câmera de Bruna Marquezine

Fotografando em filme desde 2014, Gabriel Marques publica suas produções no Instagram @antropofagia e no site de mesmo nome.

“Além das fotos que faço de registro pessoal, a maior parte do meu trabalho profissional é feito em analógico. Eu sou fotógrafo de moda e me converti totalmente do digital para o analógico. Não uso tanto para cliente, uso mais no meu trabalho autoral”, descreve.

Para ele, o que se mostrava como um hobby de nicho está retomando sua popularidade. “Sinto que tem crescido desde que comecei. Caiu no mainstreaming. Até a (atriz) Bruna Marquezine usa a mesma câmera analógica que eu uso, por exemplo. A tendência é que isso venha a crescer mais”, avalia o fotógrafo de moda.

Veja galeria com algumas das fotografias de Gabriel Marques:

Kayan e a câmera falsa

Foi com uma câmera falsificada e emprestada por um amigo que Kayan Rodrigues ingressou na fotografia analógica. Hoje, com uma câmera verdadeira, ele compartilha seus registros no Instagram @kayanrdg. Recentemente, Kayan lançou uma zine com algumas de suas fotografias.

“Adoro fotografar paisagens, situações e pessoas, principalmente familiares e amigos. Gosto da experimentação que a película pode proporcionar, como dupla exposição”, exemplifica o produtor audiovisual freelancer.

Kayan é um dos participantes do grupo “Queimando o Filme”, onde interessados em fotografia analógica trocam ideias a respeito do assunto. Para ele, o grupo no Facebook, com mais de 16 mil membros, é sinal de que “a comunidade de pessoas que usam filme está muito ativa”.

Veja galeria com algumas das fotografias de Kayan Rodrigues:

Andressa e a velha câmera dos pais

Dona de duas câmeras, uma Sprocket Rocket e uma Olympus Trip 35, Andressa Gonçalves compartilha seus registros no Instagram @andrssgnclvs. Por lá, o conteúdo pode ser variado.

“Gosto muito de fotografar meus amigos. Também fotografo muito minhas saídas com minha namorada. Dentro de casa, eu gosto de fotografar minhas gatas. Elas são as melhores modelos”, explica.

Para ela, não é preciso ser profissional para fotografar em filme. “Se você pegar uma câmera e fotografar aquilo que você gosta, já é importante. Pega a câmera velha dos seus pais e vai se divertir”, intima a nostálgica estudante de jornalismo.

Veja galeria com algumas das fotografias de Andressa Gonçalves:

Serviço

Revelação e venda de filmes fotográficos em Fortaleza

Superfilm

Onde: Rua da Assunção, 67 — Centro, Fortaleza — CE

Serviços e preços: Venda, revelação (R$ 12) e digitalização (R$ 13)

Mais informações: (85) 3252–4862 / Instagram @susperfilmdigital

Raniel Lima

Serviços e preços: Venda (preço variável) e digitalização (R$ 15)

Mais informações: Instagram @raniellima

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William Barros
William Barros

Cearense, repórter na Folha de S.Paulo. Criativo, curioso e interessado em contar boas histórias.