Beirut — Hadsel

Canções de ninar para embalar gente grande

Larissa Mendes
You! Me! Dancing!
3 min readNov 29, 2023

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Hadsel

Beirut

Ouça: “So Many Plans”, “The Tern”, “Stokmarknes” e “Hadsel”
Nota: 7.0
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Enquanto o americano Zach Condon — multi-instrumentista e idealizador da banda de um homem só Beirut — excursionava pelo mundo com a turnê do álbum Gallipoli (2019), ele foi refreado por dois problemas igualmente preocupantes: primeiro, o desgaste vocal que o obrigou a fazer uma cirurgia na garganta. Segundo, um velho conhecido nosso chamado pandemia de Covid-19.

A pausa duplamente obrigatória o fez refugiar-se numa cabana na longínqua Noruega, mais especificamente numa cidadezinha de pouco mais de 8 mil habitantes, formada por 4 ilhas e chamada Hadsel. Ilhado (literalmente) por meses e munido de instrumentos, como violões, trombones e sintetizadores, Zach materializou suas angústias em um punhado de composições que resultam nas 12 faixas que formam Hadsel (2023).

A sonoridade da obra se assemelha levemente a do álbum No No No (2015) e é embasada numa certa aspiração por “paz em meio ao caos”. Talvez seja também um dos melhores trabalhos da discografia do Beirut desde a explosão da faixa “Elephant Gun”, que integrou a trilha sonora da minissérie Capitu (2008), de Luiz Fernando Carvalho, exibida pela Rede Globo.

Hadsel é simplesmente um caderninho que acalenta o coração. A faixa-título abre o álbum já convidando o ouvinte a embarcar no itinerário proposto. Os sintetizadores até lembram o clima étnico do início da carreira do Beirut, lá em meados de 2006, mas logo o caminho muda de rota e aponta outras perspectivas. A frustração com a mudança de planos desencadeia a bela e melancólica (e minha favorita!) “So Many Plans”, single lançado em agosto, que aborda aquelas ideias que parecem nunca conseguirem sair do papel, sabe? Pois é.

Mas nem só de melancolia e introspecção vive o Beirut. “January 18th”, por exemplo, tem a bateria marcante como a jornada de um campeão, assim como a doce “Stokmarknes” — onde os versos de Zach Condon soam como névoa em meio as montanhas norueguesas. Destaque ainda para canções como “The Tern” (single lançado em outubro, que nasce de uma base eletrônica e cresce gradativamente), “Baion” (uma adorável “música de elevador”) e “Island Life”, uma viagem ao seu refúgio.

Apesar das variações sonoras — e graças a todo o talento de Zach — , o sexto álbum de estúdio da banda em momento algum perde sua coesão. Lançado em novembro pelo próprio selo do artista (Pompeii Records), o disco sucede a coletânea Artifacts (2022), que faz um resgate de preciosidades do repertório do Beirut. Definitivamente, Hadsel sintetiza as dores e incertezas vivenciadas pelo músico — e em algum momento por todos nós, não? — mas também aborda a coragem e resiliência de um artista especialista em fazer canções de ninar para embalar gente grande.

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