Black Country, New Road — For the first time

Parafraseando “Sunglasses”, For the first time é o pináculo absoluto da engenharia (musical) britânica e o melhor debut do país em anos

Victor Silveira
You! Me! Dancing!
3 min readFeb 18, 2021

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For the first time

Black Country, New Road

Ouça: “Athens, France”, “Opus”, “Sunglasses”
Nota: 10
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Em entrevista no início de 2020, Isaac Wood, vocalista da banda britânica de post punk Black Country, New Road, disse que o objetivo do grupo era conseguir ser o quão grande uma banda do tipo deles pudesse ser. Ou talvez, ser o próximo Arcade Fire. Se você analisa a estética da banda, seus membros e os instrumentos que cada um toca e começa a criar na sua cabeça uma possível sonoridade para o Black Country, New Road a partir disso, provavelmente esse álbum vai te pegar completamente desprevenido.

Já ouviu falar de klezmer, por exemplo? É um gênero musical tradicionalmente judaico, composto por instrumentos como violinos, clarinetes e percussão. É dançante, e tem um certo teor de gêneros musicais do oriente médio. A primeira faixa de For the first time é, digamos, um “klezmer rock” bizarro e extremamente encantador, pela forma como cada instrumento entra, dando o teor do que é a proposta do Black Country, New Road, em uma construção minuciosa de tensão que se utiliza perfeitamente de todos os membros da banda, sempre trazendo um elemento surpresa, como o solo de sax no final da faixa em questão.

Isso na primeira música, que não tem nem vocal ainda, e os vocais aqui são um caso a parte. As letras são verborragias perturbadas que, na voz de Isaac, soam como se ele estivesse no pico de uma crise de ansiedade, com desabafos desesperados sobre a vida contemporânea de um jovem de classe média, e referências anacrônicas que vão desde Ariana Grande até os parceiros de cena da banda, Black Midi. Há quem chame de “acquired taste” ou dê qualquer outra desculpa pra dizer que é um estilo vocal muito peculiar, mas ele só adiciona mais paranoia e inquietude ao caldeirão de “improbabilidades” que a banda consegue tornar real a cada ataque surpresa que o álbum dá.

É, por exemplo, a virada no meio de “Sunglasses”, o belo outro de “Athens, France”, ou os riffs a lá Tool de “Opus”, que tornam For the first time tão fascinante e irresistível. Todos esses momentos são inesperados, e parecem perfeitamente construídos pra que todos os sete integrantes da banda sejam uma parte essencial da sonoridade, da mensagem que o grupo quer passar. O sax e a bateria puxam algumas canções pros caminhos imprevisíveis do free jazz, enquanto o violino e o teclado ditam todos os momentos mais bonitos e tensos do álbum.

Procurando um motivo pra não dar 10 pra esse álbum, encontrei pessoas reclamando que a banda é muito pedante, que possui influências muito óbvias de Slint e King Crimson nas guitarras e estruturas das canções, ou só que é tudo muito desajustado, piegas e é feito por “filhinhos de papai”. Todos esses elementos citados só adicionam mais personalidade e carisma ao grupo, e nenhum deles me convenceu a mudar de ideia.

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Victor Silveira
You! Me! Dancing!

and then nothing turned itself inside out // jornalismo (uff) // colaborador no you! me! dancing! desde 2018