Eve Owen — Don’t Let The Ink Dry

Um álbum para ouvir de olhos fechados

Quel Batista
You! Me! Dancing!
3 min readJun 18, 2020

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Don’t Let The Ink Dry

Eve Owen

Lançamento: 08/Mai/2020
Ouça: “Mother”, “For Redemption” e “I Used To Dream In Color”
Nota: 8.5
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Talvez você já tenha ouvido, mas não associado a voz ao nome Eve Owen. Entretanto, a cantora já deu o ar da graça nas turnês e no último disco do The National, I Am Easy To Find. Na faixa “Where Is Her Head”, Eve empresta uma interpretação delicada em uma das melhores colaborações do álbum.

Don’t Let The Ink Dry, primeiro disco da cantora inglesa Eve Owen, pode ser considerado um álbum para ouvir de olhos fechados, ou melhor, uma aventura lírica que merece, além de ser ouvida, ser lida com atenção. A faixa de abertura “Tudor” nos leva a caminhar por uma floresta sonora ilustrada, principalmente, pelos tambores da bateria que marcam o ritmo ritualístico emaranhado nos vocais, que oscilam entre doces agudos e um grave aveludado.

Ao prosseguir com a audição pelas faixas seguintes, é inevitável perceber que Owen utiliza a voz como o principal instrumento do disco. Abusa do delay, o que ajuda a preencher todos os espaços, tornando a experiência sonora completamente imersiva. A bateria eletrônica, pads e synths podem ser percebidos em vários momentos do disco, que experimenta bastante.

É em “Mother” que o álbum ganha uma energia potente e crescente. E tal energia não se restringe aos arranjos crescentes de guitarra, mas também à letra, que soa como um apelo de quem se vê, pela primeira vez, encarando as dificuldades da vida adulta, andando em seus próprios sapatos. Ao mesmo tempo em que é sobre ter com quem contar.

‘O mother, you never said it would be this bad

Heartache takes me in its wings tonight’

A essa altura, vale destacar a produção de Aaaron Dessner, guitarrista do The National e um grande produtor em quem vale a pena ficar de olho, para além de seu trabalho com a banda. O disco conta também com outros nomes importantes como o pianista Thomas Bartlet (St. Vincent; Father John Misty) e Rob Moose, responsável pelos arranjos de cordas do Bon Iver desde 2011.

De volta à Eve, o disco permanece consistente. Enquanto algumas faixas nos arremessam em um turbilhão de emoções profundas e íntimas, outras nos dão o respiro entre um soluço e outro (risos), como é o caso de “So Still For You”. Há ainda aquelas que nos energizam a querer viver tudo de novo: cometer os mesmos erros e colocar a culpa nas circunstâncias.

Em alguns momentos, este trabalho se permite correr mais livremente. Sem dúvida, “Blue Moon” é a mais espontânea das faixas até aqui, quase um improviso. É nessa faixa que Eve abraça a guitarra e seu lado elétrico pela primeira vez, diga-se de passagem, uma estreia que faz lembrar Cat Power em alguns momentos.

Ouvir Don’t Let The Ink Dry é como ouvir de olhos fechados o próprio diário ou uma aventura épica de como é crescer, amar e desamar. Sua percepção desse disco certamente pode variar de acordo com o seu nível de identificação, pois ele é, antes de mais nada, um disco sobre emoções derramadas e, nesse ponto, há sempre quem prefira contê-las. Felizmente, Eve decidiu compartilhar essas emoções conosco.

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Quel Batista
You! Me! Dancing!

Escritora, produtora cultural, publicitária e podcaster.