Matt Berninger — Serpentine Prison

O encontro necessário de Matt Berninger com a sua própria paz

Quel Batista
You! Me! Dancing!
3 min readOct 26, 2020

--

Serpentine Prison

Matt Berninger

Lançamento: 16/Out/2020
Ouça: “Silver Springs”, “Loved So Little” e “Collar Of Your Shirt”
Nota: 8.5
Stream

Quando se trata de falar sobre relações amorosas e inadequação social, Matt Berninger nunca se dá por satisfeito, vide TODA discografia do The National. Serpentine Prison não é uma exceção. Se há algo que podemos notar com segurança neste disco, é uma serenidade incomum aos discos da banda, mas que Matt parece ter se permitido explorar em seu trabalho solo. Há bem menos explosões instrumentais, pontes e crescendos. No lugar, a voz de Matt ganha nuances singelas, reconfortantes.

Nas composições, é uma característica de Berninger beber de muitas referências, que vão de personagens históricos a títulos de livros que ele mesmo nunca leu, como já revelou em algumas entrevistas. Essa característica não está ausente no seu lançamento solo. A faixa “One More Second”, por exemplo, escrita em conjunto com Matt Sheehy (EL VY, Lost Lander) pretende ser uma resposta à canção “I Will Always Love You” de Dolly Parthon e que ganhou o mundo na voz de Withney Houston. É mesmo um romântico inveterado.

It’s only god or the devil when you’re in it
And I’m always getting caught in the middle
It’s so hard to be loved so little

Outra característica do processo criativo de Matt Berninger que também está presente aqui é a criação de diálogos entre os eu líricos presentes nas músicas. Sejam pessoas diferentes, seja um diálogo com a voz na sua própria cabeça. Um prato cheio pra quem gosta de fazer análise do discurso e que deixa tudo em aberto para que o ouvinte faça sua interpretação da forma que melhor se identifique.

I do not want to believe it
It’s better off that I don’t know
I’m so afraid your love is leaving me
Never tells me where it goes

A serenidade mencionada no início do texto, também se deve às escolhas melódicas para esse disco. Nada pretensiosos, os arranjos que compõe Serpentine Prison são, na maioria das vezes, delicados, calmos, sem qualquer pirotecnia e assinados por gente de alto calibre como Harrison Whitford, Hayden Desser, Matt Sheehy, Michael Brewer, Sean O’Brien, Ben Lanz, Andrew Bird e tantos outros. Vale aqui a menção honrosa à explêndida Gail Ann Dorsey, já velha conhecida dos fãs de The National, que assina os backing vocals de algumas canções e brilha suavemente na faixa Silver Springs.

Serpetine Prison é um presente de Matt para seu pai, mas é também um presente para si mesmo. Se na ideia inicial Matt Berninger planejava fazer uma série de covers de Stardust, de Willie Nelson, neste caso, a emenda saiu muito melhor que o soneto. O disco se tornou uma ode à Stardust, sendo produzido por Booker T. Jones, mesmo produtor responsável pelo disco de Willie Nelson.

Em tempos tão caóticos, Serpetine Prison é um abraço quente. E graças a sua intenção inicial, qualquer familiaridade com a country music não é mera coincidência. De certa forma, se torna evidente que Matt Berninger ainda não esgotou suas formas de nos emocionar profundamente, pois, apesar de utilizar fórmulas em muito semelhantes às suas composições no The National, o resultado é deliciosamente diferente.

--

--

Quel Batista
You! Me! Dancing!

Escritora, produtora cultural, publicitária e podcaster.