Os Melhores de 2020 — Editor (André)

os melhores discos lançados em 2020 na opinião do editor André Salles

André Salles
You! Me! Dancing!
9 min readDec 24, 2020

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10 Dua Lipa — Future Nostalgia

You want a timeless song, I want to change the game’ — é assim que Future Nostalgia, segundo álbum da britânica Dua Lipa se inicia. E poucos primeiros-versos foram tão proféticos e certeiros esse ano quanto esse. Após um debut bastante morno (até com singles chatinhos e irritantes), Dua Lipa se reinventa emulando o melhor da música pop e indo de Madonna a Robyn sem nunca perder seu próprio recém-descoberto estilo. Um álbum pop extremamente bem feito, bem produzido e com ótimas composições e letras. Um álbum tão bem feito que é quase difícil de acreditar que se trata da mesma Dua Lipa de seu debut. Aqui ela encontrou de vez sua voz em músicas dançantes e com gigantesco apelo radiofônico, mas que não seriam nada se não houvesse um conteúdo por trás. E são exatamente o conteúdo e produção que o sustentam e o tornam realmente timeless. Um excelente recomeço.

OUÇA: “Future Nostalgia”, “Physical”, “Break My Heart”, “Cool” e “Don’t Start Now”

09 beabadoobee — Fake It Flowers

Ouvir Fake It Flowers, primeiro álbum da cantora Beatrice “beabadoobee” Laus é se transportar no tempo. A produção do disco te leva direto para o meio do anos 90 — não interessa muito se você ainda era criança ou nem tinha nascido nessa época. Desde seu primeiro single “Care”, bea já dava indícios de que seu álbum valeria a espera, e Fake It Flowers é um debut extremamente poderoso em sua simplicidade. Não existem grandes experimentações ou ambições aqui, apenas a de fazer música boa e agradável aos ouvidos; e nisso beabadoobee excede as expectativas. Cada música é seu próprio pequeno universo, como uma compilação de curtas metragens ligados apenas por um tema. beabadoobee, com seu primeiro disco completo após uma série de EPs excelentes, prova que ainda tem muito pra mostrar e, felizmente, isso aqui é só o começo.

OUÇA: “Care”, “Dye It Red”, “Worth It”, “Further Away” e “How Was Your Day?”

08 Letrux — Letrux Aos Prantos

Letícia Novaes tinha uma missão complicadíssima, que era a de seguir o monumental Em Noite De Climão de 2017. E ela conseguiu fazer isso indo em uma direção quase contrária à de seu debut. Enquanto Climão era vermelho-fogo-explosivo, Aos Prantos aposta na água, correntezas e cachoeiras. Ainda mantendo a mesma emoção tragicômica pela qual é conhecida, Letícia em seu segundo álbum como Letrux traz referências e influências das mais diversas — Letrux Aos Prantos apresenta uma gama muito maior de elementos, nuances e texturas. Algumas faixas têm tantas coisas acontecendo ao mesmo tempo que o ouvinte até fica atordoado. E com toda a certeza essa é a intenção de Letícia. Aos Prantos serve pra mostrar toda a versatilidade de Letícia, em um álbum que quase supera seu anterior — sempre com muita dança, deboche e tristeza genuína. Se alguém tivesse me dito em Março, antes da pandemia e desse disco sair, que Letrux seria a artista responsável pela música mais avassaladora do ano, eu não acreditaria. Mas aqui temos “Cuidado, Paixão”, e as coisas nunca mais foram as mesmas. Não dei conta, vou chorar.

OUÇA: “Cuidado, Paixão”, “Contanto Até Que”, “Vai Brotar”, “Abalos Sísmicos” e “Dorme Com Essa”

07 Haru Nemuri — Lovetheism

A japonesa Haru Nemuri segue apostando em sua mistura única de noise com j-pop e rap em seu mini-álbum Lovetheism. Aqui, a moça adiciona ainda mais elementos e mais texturas resultando em um trabalho absurdamente elétrico e dinâmico. Lovetheism é tão original em sua forma de existir que é impossível não ouví-lo diversas vezes. Nemuri soube seguir seu debut Haru To Shura de forma espetacular e deixou seus ouvintes boquiabertos. O que mais impressiona nesse álbum é a sua capacidade de se transformar o tempo todo, sem nunca soar pretensioso. Lovetheism é bastante ambicioso, mas cumpre cada uma de suas próprias propostas. Seu segundo mini-álbum/EP serve pra mostrar que Haru Nemuri não veio pra brincadeira e, principalmente, que a moça consegue adaptar seu som e transformá-lo no que quiser. Não dá pra saber qual rumo Nemuri seguirá em seus lançamentos futuros, e isso é extremamente excitante.

OUÇA: “Fanfare”, 「愛よりたしかなものなんてない」, “Riot” e “Lovetheism”

06 Phoebe Bridgers — Punisher

Phoebe Bridgers foi a incontestável estrela de 2020. Uma das poucas coisas boas que vieram desse ano foi que as pessoas começaram a apreciar essa mulher. A talentosíssima cantora lançou seu segundo álbum solo, Punisher, e ele mostra uma evolução tão absurda em relação ao seu primeiro material que é de tirar o fôlego. A moça, que também fez parte do icônico EP boygenius ao lado de Lucy Dacus e Julien Baker em 2018, retorna ao seu trabalho solo com uma força invejável. ‘No, I’m not afraid of hard work’, ela canta na belíssima “Garden Song” — primeiro single do disco. E desde então Phoebe conquistou o mundo. ‘I get everything I want’, ela continua. Punisher explora o indie e indie folk de uma forma mais livre do que ela havia feito em Stranger In The Alps, com letras maduras, melodias grudentas até mesmo em seus momentos mais calmos e arranjos complexos — “I Know The End” vai crescendo aos poucos e culmina em um dos melhores momentos musicais do ano. Bridgers também tem um clipe dirigido por ninguém menos do que Phoebe Waller-Bridge —a Fleabag. Essa mulher está com tudo, e que venha ainda mais em 2021!

OUÇA: “I Know The End”, “Kyoto”, “Garden Song” e “Savior Complex”

05 Rina Sawayama — SAWAYAMA

SAWAYAMA é um álbum que eu ainda estou tentando entender até agora. O primeiro trabalho completo da nippo-britânica Rina Sawayama, seguindo o excelente EP Rina, chega com tons e referências quase inesperadas. A moça que tinha ótimos singles pop como “Cherry” e “Flicker” em seu currículo, de repente aparece com uma música de metal. E como lead single de seu primeiro álbum completo! A partir daí, Rina decola. Entre letras sobre racismo, machismo, LGBTfobia, privilégio masculino e até críticas ao capitalismo, SAWAYAMA mistura (e leva muito a sério) desde o nu-metal do Evanescence e Korn até o pop de Britney Spears e Christina Aguilera, muitas vezes na mesma faixa. O momento em que chega o último refrão de “Paradisin’” no qual temos a bateria eletrônica se misturando com as guitarras distorcidas, Rina cantando sobre farra adolescente e aí começa um solo de saxofone — é a mais absoluta e pura definição de ‘perfeição’.

OUÇA: “STFU!”, “Paradisin’”, “XS”, “Bad Friend” e “Who’s Gonna Save You Now?”

04 Fiona Apple — Fetch The Bolt Cutters

Um álbum novo da Fiona Apple é um fenômeno, algo que acontece basicamente uma vez por década; seu anterior era de 2012. Ao longo de sua carreira Apple construiu seu nome e reputação de tal forma que é impossível não esperar algo grandioso dela, e com Fetch The Bolt Cutters não foi diferente. Gravado entre os anos de 2015 e 2020, Bolt Cutters mostra uma Fiona Apple como nunca antes a ouvimos: levemente otimista. As letras empoderam e reforçam a ideia de que qualquer pessoa pode sair de qualquer situação desconfortável na qual se encontre, basta você mesmo escolher se libertar. Suas composições estão cada vez mais únicas e originais, e aqui ela faz uso inclusive de sua própria casa como instrumento de percussão — de batidas nas paredes e chão até talheres e latidos de sua cachorra. Fetch The Bolt Cutters é um álbum extremamente único em seu próprio caos, algo que não poderia ter vindo de nenhum outro ser do universo. Fetch The Bolt Cutters vem pra elevar ainda mais a carreira de Apple e tornar os anos de espera até um material novo um pouco mais toleráveis.

OUÇA: “Cosmonauts”, “I Want You To Love Me”, “Shameika” e “For Her”

03 Deftones — Ohms

Ohms é o nono álbum de estúdio dos veteranos do Deftones, lançado no ano em que sua primeira obra prima White Pony completa 20 anos. E Ohms já pode ser considerado também uma obra prima. Seu trabalho mais interessante e pesado em quase uma década, Ohms traz um Deftones revigorado fazendo o que sabe fazer de melhor. Aqui, sua própria carreira parece ser a maior inspiração — a banda abusa de referências que já permearam seu passado mas não eram usadas dessa forma em anos. O resultado é um disco que evoca tanto novidade quanto nostalgia, com algumas de suas melhores composições até hoje. O Deftones continua mestre em saber misturar riffs e guitarras pesadas vindas do metal com vocais e atmosferas de shoegaze como nenhuma outra banda. Esse é o maior trunfo de Ohms, e algo que não era feito nessa intensidade desde o próprio White Pony. Deftones começou a década de 2020 com um excelente trabalho, que superou todas e quaisquer expectativas — incluindo as que seu próprio nome carrega há mais de 20 anos.

OUÇA: “Ceremony”, “Error”, “Ohms”, “The Spell Of Mathematics” e “Pompeji”

02 Taylor Swift – folklore/evermore

Menos de um ano após a moça lançar Lover, Taylor Swift aparece com não apenas um, mas dois álbuns novos completos de surpresa nesse ano. E os dois mostram uma Swift nunca antes vista, com uma produção indie vinda de Aaron Dessner (The National) e focando nas canções-narrativa que sempre foram o seu forte. folklore e evermore, álbuns-irmãs como a moça tem dito, apresentam o pico criativo da cantora. Ninguém nunca esperou ouvir Taylor Swift dessa maneira, e é exatamente por isso que ela parece tão livre e confiante aqui. Nessa dupla folklore/evermore estão algumas de suas melhores composições da carreira, e esse estilo indie folk mais intimista e delicado funcionou tão bem do começo ao fim que eu espero que seja mais explorado por ela no futuro. A delicadeza existente nos dois álbuns, a forma como Swift mescla músicas confissionais com histórias inventadas, os instrumentais orgânicos… Tudo funciona nesses álbuns, até mesmo as suas falhas servem para mostrar uma Taylor Swift vulnerável como nunca antes. É cedo pra dizer se folklore e evermore foram uma reinvenção ou apenas uma sessão de gravações bastante interessante para a cantora, mas o fato é que Swift segue excedendo expecativas no que quer que resolva fazer; seja no pop ou fora dele.

OUÇA: “mirrorball”, “the last great american dynasty”, “happiness”, “betty”, “marjorie”, “evermore”, “the 1” e “no body, no crime”

01 Soccer Mommy – color theory

Nenhum outro álbum esse ano foi tão humano, visceral e sincero quanto color theory, segundo lançamento da Sophia Allison como Soccer Mommy. O disco segue seu já excelente debut Clean de 2018 e serve pra fazer de Allison um dos nomes mais complexos e interessantes a surgirem no mundo da música em muitos anos. A transparência com a qual a moça canta aqui sobre dificuldades e transtornos mentais é quase difícil de ouvir, e ela faz isso de forma absurdamente delicada e cuidadosa. Sobre instrumentais simples mas bem trabalhados, Allison faz sua voz sobrevoar as guitarras como quem observa uma paisagem de cima, ao mesmo tempo com interesse e medo de descer. A monotonia nos vocais de “circle the drain”, a melhor e mais sincera música sobre como é viver com depressão e talvez a melhor composição lançada esse ano por qualquer pessoa, é de quebrar o coração do ouvinte. Especialmente em um ano no qual uma pandemia mundial abalou os planos e vidas de todas as pessoas e deixou milhares de mortos, quando Allison canta ‘Things feel that low sometimes, even when everything is fine’ é impossível não sentir exatamente o que ela está dizendo. Soccer Mommy fez um disco real e imperfeito, sincero e essencial como uma sessão de terapia.

OUÇA: “circle the drain”, “yellow is the color of her eyes”, “crawling in my skin”, “lucy” e “royal screw up”

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