Os Melhores de 2021 — Editor (André)

Os melhores álbuns lançados nesse ano de 2021 segundo nosso editor André Salles

André Salles
You! Me! Dancing!
9 min readDec 20, 2021

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10 Dry Cleaning — New Long Leg

De vez em quando aparece uma banda dentro da esfera do indie rock que realmente traz uma perspectiva única e algo não ainda feito antes. Esse é Dry Cleaning e seu maravilhoso primeiro álbum New Long Leg. O quarteto inglês faz um post-punk fortemente inspirado por nomes como Joy Division e Wire mas de uma forma absolutamente atual e inédita. Sobre linhas de baixo pesadas e riffs de guitarras, os vocais falados e monótonos de Florence Shaw se mostram o maior trunfo da banda. Letras quase dadaístas em forma de fluxo de consciência, instrumentais extremamente complicados e complexos mas que ao mesmo tempo são grudentos e acessíveis. A banda vem da mesma cena post-punk britânica que já nos mostrou nomes como IDLES e Fontaines D.C., mas nenhum foi tão interessante e original quanto o que o Dry Cleaning apresentou aqui.

OUÇA: “Scratchcard Lanyard”, “Unsmart Lady”, “New Long Leg” e “Her Hippo”

09 Japanese Breakfast — Jubilee

Após dois ótimos álbuns que traziam um indie pop experimental único, Michelle Zauner apostou em algo mais convencional em Jubilee e acertou em cheio. Com toda a certeza o seu disco mais coerente e coeso do começo ao fim, Jubilee mostra uma Michelle mais acessível mas que ainda traz elementos do experimentalismo pelo qual ela era conhecida. Em uma mudança consciente e pensada de rumo e direção, Michelle afirmou que estava cansada de fazer músicas tristes e iria dessa vez escrever um álbum sobre Alegria. Mas trata-se às vezes de uma abordagem meio bizarra de ‘alegria’, fazendo músicas leves e dançantes mas com letras que nem sempre contam a mesma história — no melhor estilo Tegan and Sara em If It Was You. Lar do que é possivelmente a Melhor Música do Ano, “Be Sweet”, Jubilee revelou ao mundo uma nova faceta de Michelle Zauner: um pouco mais positiva, mas ainda cautelosa sobre se entregar completamente.

Ouça: “Be Sweet”, “In Hell”, “Paprika”, “Savage Good Boy” e “Slide Tackle”

08 Snail Mail — Valentine

Em Valentine, seu tão aguardado segundo disco, Lindsey Jordan se mostra ainda mais madura e competente do que em Lush em 2018. Aqui ela expande seu som, trazendo baladas, sintetizadores e violões, resultando em um trabalho bastante versátil, e por vezes desconexo, mas que ainda mantém a essência já apresentada e explorada pela jovem musicista no passado. Com letras que falam principalmente sobre amores acabados ou não correspondidos, a vulnerabilidade exibida em Valentine é única. Citando até mesmo seu breve momento em uma clínica de reabilitação, Lindsey Jordan não tem medo de se expor — ou tem, mas o faz assim mesmo. Trata-se, exatamente por conta disso, de um álbum muito verdadeiro em que até os leves tropeços soam belos. Valentine é uma evolução do seu som e uma prova de que seu trabalho feito no passado não foi sorte e que a moça está cada vez melhor.

Ouça: “Valentine”, “Glory”, “Headlock”, “Madonna” e “Light Blue”

07 Desperate Journalist — Maximum Sorrow!

Em seu quarto álbum completo, Maximum Sorrow!, a banda inglesa Desperate Journalist fez seu mais maduro e brilhante trabalho até o momento. A banda, que já tinha uma reputação consolidada com os álbuns Grow Up e In Search Of The Miraculous, entregou um trabalho impecável aqui. Com influências que vão desde U2 no começo da carreira até o post-punk feito por Siouxsie and the Banshees e The Glove, os detalhes da produção de Maximum Sorrow! trazem uma originalidade invejável. Os vocais de Jo Bevan nunca soaram tão limpos e claros, indo dos vibrattos aos gritos e sussurros de uma maneira extremamente coesa. A percussão propulsiva parece impulsionar as músicas para frente enquanto as guitarras e linhas de baixo se complementam e levam as composições a novos níveis. Maximum Sorrow! aglutinou tudo o que o Desperate Journalist sempre fez de melhor em um álbum absolutamente memorável.

Ouça: “Personality Girlfriend”, “Fault”, “Fine In The Family” e “Everything You Wanted”

06 Marina Sena — De Primeira

Com uma carreira que já quase completa dez anos entre bandas como Rosa Neon e A Outra Banda da Lua, Marina Sena se lança como artista solo com De Primeira. O título de seu primeiro álbum solo é engraçado, irônico talvez. O sucesso atingido pela mineira não é nada inesperado ou algo que aconteceu por sorte em sua primeira vez. Marina já era um nome consolidado que estava só esperando o momento certo pra que isso tudo aqui acontecesse. Depois do sucesso de Rosa Neon, finalmente tinha chegado o momento da moça brilhar em sua carreira solo e aqui ela faz exatamente isso. Marina Sena brilha com sua luz própria, sabendo utilizar das referências e influências mais diversas e trazendo isso tudo para seu próprio universo. De Primeira se mostra um mais-do-que-excelente primeiro álbum solo, vindo de alguém que já trabalhou e muito com outros projetos até chegar aqui. Músicas como “Amiúde” e “Por Supuesto” não são sorte de principiante, e Marina Sena é tudo menos uma novata ingênua aqui. Fala lá pra ela que ela tá sabendo muito bem o que está fazendo e que De Primeira, mesmo já sendo tecnicamente um ‘meio’, é uma fenomenal reintrodução de Marina Sena à cena musical brasileira.

Ouça: “Por Supuesto”, “Amiúde”, “Tamborim”, “Me Toca” e “Voltei Pra Mim”

05 Tagore — Maya

Maya, terceiro álbum do pernambucano Tagore, me pegou como um soco no estômago. Produzido por Pupillo, membro da Nação Zumbi e que já produziu discos como Amigo Do Tempo (Mombojó) e Tropix (Céu), Maya mostra Tagore atingindo seu momento mais alto da carreira até agora. Com uma mistura deliciosa de sons nordestinos, MPB, psicodelia e indie rock, o moço nos presenteia com dez músicas sem nenhum defeito. Em suas letras, o poeta traz principalmente temas sobre relacionamentos — em sua maioria acabados, falhos ou defeituosos. Como alguém que passou por momentos não-ideais em minha vida pessoal esse ano, as canções “Maya” e “Samba Coração” e seus versos como ‘Bobeira é tentar não cantar que te amo, bobeira é tentar não pensar de você’ e ‘Dá um trabalho danado fingir que eu não me importo, fingir que eu não sou louco por você’ trazem uma certa catarse que me foi essencial. Essa colaboração entre Tagore e Pupillo se mostrou ser bastante frutífera e promissora, elevando o som já feito por Tagore antes a novas alturas. Tagore em Maya se solidifica como um dos principais nomes da música nordestina (e brasileira como um todo), e esbanja uma facilidade com as palavras que é invejável — como visto em “Tatu”. Maya foi e ainda é um álbum extremamente pessoal para mim, e não tinha como não estar nessa lista.

Ouça: “Maya”, “Samba Coração”, “Areias De Jeri”, “Molenguita”, “Capricorniana” e “Olho Dela”

04 MAN ON MAN — MAN ON MAN

Meu casal. MAN ON MAN foi talvez o álbum mais surpreendente desse ano para mim. A dupla formada pelo casal Roddy Bottum (Faith No More, Imperial Teen) e Joey Holman começou a compor e gravar juntos durante o pior da quarentena, em seu próprio estúdio caseiro. “Daddy”, seu primeiro single, trazia uma produção quase stoner rock e referências sexuais bastante explícitas em sua letra — tema recorrente no restante do disco. Mas o álbum completo se mostra muito mais do que isso, MAN ON MAN é um trabalho belíssimo sobre a intimidade de um casal que se ama e se respeita em todos os seus aspectos. A delicada balada “Baby, You’re My Everything” se destaca como talvez a melhor e mais sincera declaração de amor dos últimos anos; temos momentos divertidos como “It’s So Fun (To Be Gay)” e a Stephen Merritt-iana “Two At A Time”. As influências sonoras apresentadas aqui são as mais diversas, indo das guitarras pesadas aos pianos leves em questão de segundos. Roddy e Joey dividem tudo aqui, desde os instrumentos até os vocais e suas vozes se complementam de uma forma maravilhosa. Mesmo que os dois não façam mais nada como MOM, esse álbum tão bruto e delicado ao mesmo tempo já valeu a jornada.

Ouça: “Baby, You’re My Everything”, “Stohner”, “1983”, “Beach House”, “It Floated” e “Daddy”

03 Torres — Thirstier

Com uma carreira já firmada e quatro álbuns nas costas, Mackenzie Scott como Torres lançou em 2021 o ponto mais alto de sua discografia. Thirstier é um álbum que eu definitivamente não estava esperando; após o lindo e introspectivo Silver Tongue no ano passado, Thirstier mostra uma Torres explosiva como nunca antes. Seguindo os melhores passos trilhados por PJ Harvey nos anos 90, Mackenzie se solidifica como um dos melhores nomes do rock alternativo de sua geração. A produção mais acessível e quase pop-punk de Thirstier trouxe uma nova vida às suas composições, até os momentos mais calmos como “Thirstier” e “Drive Me” pulsam como fogo em seu quinto trabalho. A produção do álbum, co-assinada pelo lendário Rob Ellis, mostra Mackenzie explorando texturas e sons e navegando essa recém-descoberta acessibilidade de uma forma magnífica. Com letras que falam sobre seu relacionamento sério e maduro com a artista Jenna Gribbon e todas as inseguranças que ainda existem, Thirstier é um passo absolutamente certeiro para Mackenzie.

Ouça: “Don’t Go Puttin Wishes In My Head”, “Are You Sleepwalking?”, “Hug From A Dinosaur”, “Kiss The Corners” e “Keep The Devil Out”

02Jadsa — Olho De Vidro

A baiana Jadsa lançou, finalmente, seu primeiro trabalho completo e ele é o tipo de álbum que causa um impacto em quem quer que seja que esteja o escutando. Misturando influências do blues, rock, r&b e MPB de uma forma absolutamente única, Olho De Vidro por pouquíssimo não encabeça essa lista. Com colaborações com Luiza Lian, Ana Frango Elétrico, Kiko Dinucci e Josyara, Jadsa chegou chegando e dividindo conosco sua visão singular de o que é fazer Música. Em Olho De Vidro temos canções extremamente memoráveis, cheias de nuances e mudanças de direção repentinas, samples, interpolações e referências que vão de Tulipa Ruiz e Ava Rocha até Gal Costa. Jadsa é uma Artista como poucas, tanto dentro do Brasil como de fora dele. Não sei se a influência é proposital ou algo da minha cabeça, mas algo na forma como ela arranja seus riffs de guitarra de maneira firme e certeira, sabendo usar espaços e pausas a seu favor me lembra muito o estilo de guitarra tocado por Robert Smith do The Cure. Em seu primeiro trabalho completo, Jadsa já alcança os mais altos níveis de perfeição musical. Quem tiver a oportunidade de ver essa força da natureza em forma de mulher tocando ao vivo, por favor o faça.

Ouça: “Mangostão”, “Lian”, “Olho De Vidro”, “Fora, Marte!” e “Raio De Sol”

01 Lucy Dacus — Home Video

Home Video foi o trabalho mas pessoal, visceral, bonito, caótico e absurdamente humano lançado por qualquer pessoa nesse ano de 2021. Lucy Dacus em seu terceiro álbum completo entregou algo como nenhum outro, conseguindo superar seu já excelente Historian de 2018. Um álbum que é um relato de sua vida e trajetória até aqui enquanto mulher queer, falando sobre temas que vão desde relacionamentos (com homens e mulheres), religiosidade e até desejos assassinos. Dacus se expõe de uma forma como poucos artistas se permitem ao longo de uma vida/carreira inteiras, e essa mulher de apenas 26 anos e ainda em seu terceiro álbum se mostra aqui da forma mais crua e emocional possível. Mas a beleza de Home Video vai além dos temas tratados em suas letras, trazendo uma produção impecável que complementa cada segundo do disco. São os detalhes que fazem Home Video ser o melhor álbum lançado esse ano. Do título “Home Video”, que sugere uma coletânea de filmagens caseiras feitas ao longo de anos, e chegando ao riff de guitarra extremamente pesado, distorcido e momentâneo que segue os versos ‘…but the only thing you’ve found, playing Slayer at full volume helps to drown it out’ em “VBS”. Nada, feito por nenhuma outra pessoa esse ano, chegou perto. Absolutamente genial, em todos os níveis.

Ouça: “Hot & Heavy”, “VBS”, “First Time”, “Brando”, “Thumbs” e “Going Going Gone”

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