The Monochrome Set — Allhallowtide

Um dos tesouros escondidos mais preciosos da era do post-punk continua fazendo música inteligente para quem não se encaixa

Emannuel K.
You! Me! Dancing!
3 min readJun 16, 2022

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Allhallowtide

The Monochrome Set

Ouça: “Hello, Save Me”, “Really In The Wrong Town” e “Resplandent In Darkness”
Nota: 9.5
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O post-punk gerou muitas sonoridades diferentes ao longo dos anos 80. Desde o lado pop do The Cure até a tristeza inerente ao The Smiths. De modo geral, essa sonoridade estava sempre na vertente do gótico mais raiz de bandas como Bauhaus e Sisters of Mercy. A lista de grandes nomes que se destacaram dentro desse contexto é enorme. Alguns se tornando parte da cultura pop mais mainstream, como as citas acima, outras permanecendo mais como influências; basta ver como Fire Engines, Joseph K e Orange Juice já apresentavam muitos dos elementos que só ganhariam mais holofotes no revival que o post-punk teve na primeira década desse século.

The Monochrome Set, no entanto, não figura em nenhuma dessas duas listas. Dentro daquele contexto a banda já era muito peculiar, e esse aspecto só foi reforçado com os lançamentos após a sua ressureição nos últimos anos. Ao menos em parte essa exclusão se deve ao excesso de intelectualismo nas letras da banda. Sim, é verdade que The Cure fazia referências a Albert Camus e que a literatura do século XIX fosse um dos temas mais recorrentes no post-punk como um todo. Mas The Monochome Set levava esse viés ao extremo, com um senso de humor demasiadamente cerebral, canções batizadas em homenagem a filmes do expressionismo alemão, referencias a Dante e um cosmopolitismo (ao menos em parte motivada pelo fato de o líder do grupo, Bid, ser indiano em um movimento majoritariamente britânico) que estava a frente de seu tempo.

Nos discos que a banda lançou desde seu retorno em 2010, o espírito continua o mesmo. E, no cenário musical de hoje, se torna ainda mais único. Se o antecessor de Allhallowtide era dedicado a uma falsa fábula medieval, o novo disco do grupo vai por um caminho mais pop, com letras poderosas, que são fáceis de cantar junto, mas também que tem um significado poético profundo. São quase contos sobre a sensação de estar fora de lugar no tempo e no espaço. Os jovens desajustados dos anos 80 nem sempre se tornam cidadão exemplares e reconhecidos, afinal.

Como todos os trabalhos de The Monochrome Set, Allhallowtide é para quem passa mais tempo dentro da própria cabeça, seja nos livros ou na imaginação, e que sempre precisa de uma pequena válvula que lhe dê aquela sensação de libertação que só a música consegue dar. Depois de tantas décadas, não faz sentido esperar que a popularidade da banda cresça. Pelo contrário. Certas coisas são mais preciosas por serem raras e obscuras.

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Emannuel K.
You! Me! Dancing!

Escrevo ficção e adoro falar sobre arte, filosofia, vinho, história, cinema e, especialmente, literatura e música. Pseudo-intelectual, arrogante e metafórico.