Universalidade ou Universalização dos Direitos Humanos

Camila Kellen
Youth for Human Rights Brasil
4 min readMay 21, 2019

Como já sabemos, a Declaração dos Direitos Humanos autoproclama-se universal. Isso fica evidente não apenas no título, mas também nos próprios artigos que propõem um ar generalizante. A partir disso, podemos levantar uma discussão acerca do verdadeiro significado dessa palavra. Afinal, ela transmite uma ideia de universalidade ou de universalização? Será que se tratam da mesma coisa?

O melhor jeito de introduzir essa reflexão é esclarecendo conceitos. A palavra “universalidade” implica qualidade. Ao usá-la, pretende-se atribuir aos direitos humanos a característica atemporal de amplitude subjetiva. Em outras palavras, todo homem é sujeito de direitos independentemente de variações (raça, cor, gênero, etc.). O termo “universalização”, por outro lado, denota movimento, o processo de tornar universal. Isso significa expandir os Direitos Humanos para todos os países sem considerar as diferenças culturais.

Qual seria, portanto, o mais adequado? O primeiro conceito é falível, vez que as garantias da DUDH (ainda) não atingem a todos. Já o segundo é problemático, pois busca a homogeneização de valores culturalmente diferentes — e, em muitos casos, opostos. Nesse último aspecto, muitos teóricos defendem que algumas comunidades adotam perspectiva diversa dos Direitos Humanos porque não atingiram o desenvolvimento necessário para aceitar a “verdade”. E é justamente nesse ponto que reside o cerne do problema que iremos tratar.

Disponível em: http://www.vermelho.org.br/noticia/317434-1

Não é novidade que alguns países adotam práticas que destoam dos valores perseguidos pela Declaração. Por essa razão, alguns teóricos consideram como se de “bons selvagens” se tratassem. Já os demais países são ditos cultos, civilizados. Esse posicionamento radical vê a universalização como a possibilidade de um estágio evolutivo no qual todas as nações reconheceriam os mesmos direitos. No entanto, tal concepção fere o conceito de relativismo cultural, segundo o qual, não se deve julgar uma cultura tomando outra como parâmetro.

Obviamente, aceitar a mutilação genital, o casamento arranjado, a escravidão doméstica e tantas outras atitudes é impossível. A provocação incitada por muitos críticos é se pensamos assim porque de fato o é ou porque nascemos e nos criamos na civilização ocidental. Nesse sentido, pergunto-lhes: Como falar de direitos absolutos e universais se existe tanta diferença entre costumes? Afinal, é incontestável que compreender uma cultura sob o prisma de outra é uma tarefa árdua.

Disponível em: https://insensato.pt/a-mutilacao-genital-feminina-95524?thread=938532

O filósofo Habermas ressalta que é imprescindível ao Ocidente superar sua consciência imperialista de que nada pode aprender com as outras culturas. Assim, a partir do momento que abrir mão das vestes de “guardião da verdade”, será possível propor uma composição de valores através do diálogo. Por outro lado, sabemos que compreender valores diametralmente opostos a DUDH seria eximir-se da responsabilidade de proteger os direitos mais fundamentais à vida humana.

Do outro lado da discussão, situam-se os teóricos a favor da dita universalização. Autores como Luño argumentam que a proteção de tais direitos não pode se limitar a soberania interna dos Estados. Em verdade, somente a partir do momento em que abrange todas as pessoas, pode-se falar em “Direitos Humanos”. Assim sendo, a concepção universalista enfatiza a necessidade de um ethos universal para impedir que os indivíduos estejam vulneráveis a práticas culturais.

Certamente, ainda há muito a ser discutido sobre o assunto no cenário internacional. O choque cultural divide os internacionalistas entre i) defender as identidades culturais locais e ii) garantir os direitos humanos a todo custo. Essa polêmica precisa culminar em benefícios para a humanidade de forma que a imposição de uma cultura sob outra não seja um fator para o extermínio de certas sociedades. Ao mesmo tempo, não se pode deixar de resguardar um mínimo de proteção a vidas ameaçadas ao redor do mundo:

Palavras-chave: Direitos Humanos, Universalidade, Universalização, Multiculturalismo.

REFERÊNCIAS:

FIORI, Larissa Cristina; Peixoto, Lívia Rossi. A universalização dos direitos humanos em face do multiculturalismo. Disponível em: https://larifiori.jusbrasil.com.br/artigos/246179480/a-universalizacao-dos-direitos-humanos-em-face-do-multiculturalismo. Acesso em: 13 de abril de 2019

TAVARES, André Ramos. Evolução e teoria geral dos Direitos Humanos. In: ______. Curso de Direito Constitucional. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

MARTINS, Urá Lobato. Direitos humanos: universalismo versus relativismo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518–4862, Teresina, ano 16, n. 2862, 3 maio 2011. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/19027>. Acesso em: 27 abr. 2019.

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