O homem
Por Marina Barrios
O homem levanta cedo, despertado pelos barulhos do seu lugar de descanso, a rua. Não tem um lugar fixo, cada vez pernoita em um endereço diferente. Não sabe que horas são e nem em que dia do mês está, mas sabe que é dia de semana pois percebe que a movimentação da cidade aumenta conforme anda pelo centro.
O homem acompanha o iniciar do dia de cada um que passa por ele. Criança indo para a escola, homem de gravata indo trabalhar, banco abrindo, fila de lotérica se formando e ele permanece ali, sentado. Como platéia. Porém segue pelas quadras do centro, para servir de expectador a outros cotidianos.
O homem não tem caminho certo, vai por onde mais se simpatiza, à espera de algo que lhe tire da monotonia por um momento. Um bom dia do comerciante ou uma gentileza de quem passa ali na calçada são fatos corriqueiros mas que fazem com que o dia do homem seja totalmente novo. Ele foi visto. Ele foi notado.
O homem não tem horário de almoço ou de janta, às vezes passa batido por essa parte do dia. Em sua vida, coisas comuns assim são relativas. Ele também não tem compromissos ou obrigações a cumprir. A tarefa destinada ao homem é o de seguir com os olhos o dia e a noite acontecendo na rua, na calçada, embaixo de um toldo de loja, no ponto de ônibus, no estacionamento do mercado ou em qualquer outro espaço que possa ocupar, sem a necessidade de apego ou pagamento pelo pedaço de concreto.
O homem vê, todas as manhãs ao ser acordado pelo barulho da rua, a rotina tomar forma, desenvoltura e vê também o seu desfecho, junto aos seus personagens principais. Que papel ele representa? O de platéia. O de expectador. O de observador, mas não narrador pois não leva as histórias vistas por ele adiante. O homem desempenha bem a sua função, não interfere nem acrescenta no andamento da peça rotineira, só deixa com que ela flua até que chegue ao fim de mais um ato.
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