Masc está há mais de 10 meses sem exposições por falta de reparos

Zero
ZeroUFSC
Published in
6 min readNov 3, 2023

Após fechamento prematuro da exposição “Arquivos Implacáveis”, obras de reparo do telhado do Centro Integrado de Cultura ainda não tem data para iniciar

Por Larissa Santos (larysantosflsc@gmail.com) & Roberto Roberto Amazonas (amazonasroberto204@gmail.com)

Dez meses depois de ser fechado após a chuva atingir o telhado e danificar obras da exposição “Arquivos Implacáveis” do Instituto Meyer Filho, o Museu de Arte Santa Catarina (Masc) segue sem receber exposições, pois as obras no telhado estão sem data para começar. Por conta do ocorrido, a exposição, que estava prevista para terminar em janeiro de 2023, teve que ser encerrada em 20 de dezembro de 2022 — quando ocorreram agravamentos das infiltrações de água. Nessa ocasião, obras que ocupavam uma parede inteira tiveram que ser retiradas às pressas. É o que nos conta Sandra Meyer, diretora do Instituto Meyer Filho, “tivemos uma reunião com toda a equipe do Masc e eles disseram que não poderiam garantir a segurança e a conservação das obras”, relembra. Segundo a diretora, ela própria teve que tomar as medidas cabíveis para não prejudicar as obras.

Sandra define o ocorrido como uma “tragédia anunciada”. Um mês antes do fechamento oficial da exposição, foi enviado para a Direção do Museu um ofício de alerta, pois foram detectadas goteiras e infiltrações, já no período de montagem, entre os dias 22 e 27 de setembro, especialmente na sala de vídeo e na área da claraboia. “A gente sabia que isso ia acontecer. Há 10 ou 15 anos que [o espaço] tem problemas com goteiras”.

Além disso, relembra que a infiltração começou com água escorrendo da parte superior da parede e em todas as chuvas era preciso trocar as obras de sala. “Ficamos três meses lidando com isso, fizemos o relatório e depois enviamos para a Direção. Na época, o presidente disse que estava providenciando, mas as medidas que tomaram não foram suficientes. Na primeira chuva forte, tudo aconteceu”, conta Sandra.

A Fundação de Cultura Catarinense (FCC), responsável pela administração do espaço, ainda em 2022, afirmou em nota que a licitação para reparos na estrutura do teto estava em fase final sob responsabilidade da Secretaria de Estado e Infraestrutura. Em 2023, a afirmação segue a mesma. A administradora e diretora de Arte e Cultura da FCC, Liliane Betina Alves, reitera que as manutenções do museu aconteceram de forma paliativa, por uma empresa terceirizada. “A gente não tem profissionais para realizar a reforma. Como o prédio foi inaugurado faz muitos anos, alguns materiais já venceram o prazo, tem coisas para trocar e coisas para consertar”.

A professora e cantora Bárbara Biscaro, de 39 anos, acredita que “várias mudanças estruturais não foram sanadas. Eles só fazem uma grande maquiagem no espaço, ou seja, estão ‘dançando’ nos problemas”. Ela se apresentava no museu na época da exposição “Arquivos Implacáveis”. Apesar de não ter sua performance prejudicada pelas chuvas, a cantora concorda com Sandra que o problema não é atual.

Em contraponto aos relatos e experiências vivenciadas pelas artistas, a atual diretora do museu afirma que o ocorrido foi um caso isolado. “Se vocês forem ver as paredes do Masc não tem infiltração, não tem buraco, não tem nada, elas estão bem bonitinhas.” Entretanto, algumas paredes da porta do Museu e no corredor do Centro Integrado de Cultura estão danificadas e com infiltrações.

Manutenção: Mesmo com as reparos periódicos, o Museu ainda tem resquícios da infiltração causada pelas chuvas (Foto: Larissa Santos)
Infiltrações: Em um dos corredores principais do térreo do CIC é possível ver buracos de goteiras no teto (Foto: Larissa Santos)

Com a licitação em andamento, a previsão é que a obra dure seis meses, a partir de seu início, e que todos os problemas estruturais na calha do museu sejam sanados e volte a funcionar. O valor da obra, segundo Liliane, está entre R$ 800 mil e R$ 1 milhão.

Além dos artistas, os principais prejudicados pelo fechamento são os visitantes. O jornalista, Marciano Diogo, de 33 anos, é visitante assíduo do espaço e relata indignado que mesmo antes do ocorrido, a situação já estava dessa forma. “Já era possível ver mofo e pequenas infiltrações na estrutura. Pela própria forma da arquitetura creio que é um espaço úmido, o que requer maior atenção dos responsáveis.”

Em ofício enviado para o presidente do Masc à época, Edson Lemos, constam cobranças nomeadas como urgentes pelo Instituto Meyer Filho para a manutenção e a conservação correta das obras. Entre elas, a medida da direção do Museu de desligar os aparelhos de ar-condicionado durante a noite — algo que influencia diretamente na conservação das obras. Em especial, as que são feitas sobre papel, como uma das que foi danificada.

Estrago: Obra da exposição Arquivos Implacáveis do Instituto Meyer Filho que danificada por uma infiltração na parede (Arquivo/Instituto Meyer Filho)

Outro ponto solicitado pelo Instituto foi um mapeamento das zonas que pudessem oferecer riscos para as obras. Segundo Sandra, essa exigência não foi atendida pelo museu. Nesse sentido, Liliane afirma não haver a possibilidade de realizar o procedimento, pois “o problema é nas calhas, a gente não tem como saber [para] onde a água [vai fluir]. Por isso, optamos por fechar para exposições. Não podemos fazer um reparo aqui e ali, precisa mexer em tudo”.

Outros aparelhos culturais

O descaso no cenário da gestão cultural em Santa Catarina vai além das paredes do Masc — que fica dentro do Centro Integrado de Cultura (CIC). Sandra Meyer e Bárbara, acrescentam outros dilemas. Relatam a deterioração no Museu da Imagem do Som, também no CIC, onde baldes são necessários para conter as goteiras nos corredores e no Teatro Álvaro de Carvalho (TAC) que, segundo elas, passa por “intermináveis reformas”. Para a professora, isso se dá porque “a cultura é vista como um acessório, algo não essencial, o que é refletido pela falta de investimento em locais importantes para a expressão artística”.

Além de estrutura física, Bárbara aponta que existe um problema de orçamento “praticamente inexistente” para a cultura há anos. E revela a falta de uma Secretaria de Cultura funcional em Santa Catarina. Para ela, os espaços culturais enfrentam uma precariedade tanto na equipe quanto na gestão. “O foco parece ser apenas manter as portas abertas, sem um real entendimento do propósito cultural desses locais.”

Além disso, Sandra Meyer ressalta a carência de investimentos no Masc, que necessita de um curador que possa trazer uma abordagem conceitual à instituição. Ela também indica que o atual quadro, composto por apenas um administrador e uma equipe pequena, não é suficiente para atender às demandas e à importância do status de Museu de Arte Santa Catarina. Bárbara concorda e afirma que “é necessário um corpo de servidores da área da cultura por meio de concursos públicos, para ter estabilidade e um plano de carreira para os funcionários, algo fundamental para a gestão eficaz desses espaços”.

Atualmente, segundo informações da assessoria do Masc, a equipe é composta por oito servidores efetivos, três funcionários terceirizados e há duas vagas de estágio em período de contratação. Não há servidores comissionados puros, ou seja, sem vínculo efetivo com a FCC, atuando junto ao Museu no momento.

Conservação das obras

Além do pouco caso com a infraestrutura física e a necessidade de processos para cargos efetivos de cultura, outro desafio enfrentado pelos espaços em Santa Catarina, estende-se à conservação das obras de arte. Sandra menciona que na reserva técnica, espaço destinado para o armazenamento das obras quando estão fora de exposição, também sofria com as goteiras. “Além das goteiras dentro do Masc, esse outro espaço tinha esse problema. Mais uma noite ali e o dano das peças poderiam ser ainda maiores.”

Destaca a utilização de desumidificadores na reserva técnica do Museu, essenciais para manter a integridade dos materiais das obras. No entanto, a diretora aponta um ponto alarmante: “enquanto há todo um cuidado no transporte e montagem das obras, o museu não oferece um ambiente seguro para conservá-las adequadamente”.

Em contraponto, a comunicação do Museu afirma que as obras são armazenadas de forma segura na reserva técnica e as condições especiais de climatização e segurança para preservação das obras são eficazes.

Barbara enfatiza que o Masc não é apenas um local de exposições, pois é o ponto de contato essencial entre os artistas e o público, uma conexão que se desfaz quando esses espaços estão precarizados, sem condições de uso adequadas e desprovidos de um plano sólido de futuro.

*Desde a visita da equipe do Zero ao Centro Integrado de Cultura (CIC), em setembro, as obras seguem em fase de estudos.

--

--

Zero
ZeroUFSC

Jornal-laboratório do curso de Jornalismo da UFSC