O artista em confinamento

O BBB e a crise do ídolo

Felipe Alves
300 Noise
5 min readFeb 2, 2021

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O reality show que saiu das cinzas para incendiar o twitter no ano passado voltou para uma edição que aposta ainda mais nas figuras públicas. São seis artistas que já fazem seus nomes há algum tempo no rap, slam, funk, sertanejo e na música ruim. Colocar artistas no BBB é uma estratégia interessante. É fácil perceber que os anônimos estão a construir sua reputação e ganhar força e atenção dos milhões de brasileiros que espiam a casa mais vigiada do Brasil, enquanto os famosos estão pulando uma fogueira, encharcados de gasolina.

Quando vemos um artista, estamos enxergando uma versão pública de um ser humano um tanto desconhecido. Só conhecemos o que nos é mostrado e, muitas vezes, lidamos com as típicas histórias que ‘fulano conheceu o tal famoso e me disse que… ’. A boataria é algo que faz com que os curiosos fiquem de olho quando este ou aquele artista resolve se arriscar no Big Brother. Uma atitude arriscada para quem tem que lidar com a sua própria imagem no seu dia a dia. Cada vez mais entramos em uma dinâmica de mercado pautada por consciência e não é de hoje que sabemos que é fácil pular fora dela em algum momento das 24 horas do seu dia.

Filho do Fábio Júnior

E na falta de consciência, popularmente conhecido como ‘errar é humano’, entramos em um furacão de confusão dentro do programa. Em uma semana de transmissão já rolaram conflitos sobre gênero, significação da maquiagem, conscientização, desconstrução e, claro, o filho do Fábio Júnior pedindo desculpas por ser um homem branco hétero cis (com essas palavras). Mas o pontapé para uma das maiores discussões já presenciadas pela casa do Boninho foi dado pelo artista, poeta e rapper Lucas Penteado. Ou melhor, pelos observadores da casa e comentaristas profissionais do programa que se encontram aos montes no Twitter. O fato é que, justamente os artistas estão em evidência neste enorme fogo cruzado. A internet, que se preocupa em apontar coerência, falta de caráter, heróis e vilões está lidando, além de tudo, com personagens que já conheciam e que estão além das letras bonitas dos rádios e posicionamentos bem assessorados nas redes sociais.

Em um programa que visa entretenimento acima de tudo, a discussão sobre o cancelamento fica em segundo plano quando seu ídolo, inspiração, ou referência desaponta as expectativas e se mostra humano. O choque entre artistas acaba se sobressaindo em uma gritante explosão de ego, onde o indivíduo e sua figura pública estão em eterno conflito. É por isso que tanto se fala sobre ‘até onde é possível sustentar o personagem?’. Nesta perda de identidade, as marcas do real surgem e podemos compreender o indivíduo de uma forma quase biográfica. Uma experiência de conhecimento através de sua própria interpretação. O julgamento das redes sociais reconhece lados, os defende e, dias depois, se arrepende da escolha.

Projac chorando

O expectador enxerga os erros de Lucas, tal como a casa, mas logo compreende que a casa reverbera seu comportamento de uma forma desproporcional. Existe um papel para reforçar o erro e ele é percebido. A internet, dentro de poucas horas, se depara com o comportamento de outra artista, Karol, que passa dos limites do aceitável em uma perseguição cruel e que levanta debates sobre saúde mental e tortura psicológica. Muitas figuras afins da cantora se surpreendem e se mostram desapontadas, mas outras reforçam que não há surpresa alguma no que estão vendo. E se não fosse Karol a ser o centro desta cruzada contra Lucas? Se colocássemos uma anônima, como Sarah, neste lugar, a repercussão seria tão intensa? Colocaria dúvidas? O ódio seria tão grande? E no outro caso: e se fosse o filho do Fábio Júnior no lugar de Lucas? A casa inteira estaria contra ele? O perdão é seletivo? No mais, um anônimo não tem tantos vínculos para ser cauteloso, mas para Karol, uma carreira que está em crise por conta de seu comportamento.

Não podemos deixar de pontuar também que quando os artistas são despidos, não sobra nenhuma fantasia ou símbolo de sua música ou de seu posicionamento de carreira. Rodolffo já começou o programa com muita antipatia por conta de relacionamentos, posicionamento político e amarras do mundo sertanejo, mas surpreende e fica mais escondido quando não está tentando gritar por uma atenção que não precisa, assim como Projota que surge no jogo como ponderado, mas acaba se contradizendo em seus próprios dizeres, fazendo um falso meio de campo que não acaba pegando tão bem quanto ele imagina. É difícil para o artista se livrar, inclusive, do próprio estigma de sua música ou de sua carreira. Os passos que o público vê, na figura pública, não correspondem aos passos pessoais, mudanças de postura, ou amadurecimento pessoal, para o bem ou para o mal.

Rodolffo e Caio = amizade eterna

Dentro dessas e outras que o artista morre em si mesmo. Deixa-se de ser figura pública ou indivíduo, mas se torna uma metamorfose problemática. Pois é, amigos, nunca é tarde para voltarmos para a eterna frase: fulano realmente se perdeu no personagem.

Estamos conhecendo os humanos por trás das figuras dos palcos de festivais em tempo real, sem esperar manchete de jornal ou livro póstumo revelando qualquer podre enterrado. O desmonte do artista é real e nos leva a quebrar o ídolo para encontrar o real. É curioso imaginar o que poderia acontecer se uma Lana Del Rey da vida estivesse no BBB para expor seu lado mais conservador ou desprovido de noção, ou se um Jim Morrison dividisse um espaço na casa com Axl Rose ou, qualquer ídolo do hard rock. Tais figuras, filme nenhum da Netflix conseguiria decodificar.

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Felipe Alves
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Este perfil é uma obra ficcional e o autor não se responsabiliza pelo conteúdo postado. Criador da @300noise escritor e coordenador de um certo prêmio de música