BELA BADERNA

Ocupação: a tomada estratégica de um local

Escola de Ativismo
4 min readNov 1, 2016

“Usos mais comuns: Para tomar espaços públicos; para pressionar um oponente; para retomar ou ocupar uma propriedade; para defender contra o “desenvolvimento”; para reivindicar a soberania indígena.” Bela Baderna, P. 41

Uma ocupação não é uma aposta impetuosa, improvisada e impensada. Ao contrário, é uma tática que envolve planejamento, logística e um grande cálculo de tempo e timing, além da pressão política sobre o oponente. Além disso, ela levanta questões sobre comunicação, segurança, articulação de redes de apoio e visão estratégica. Veja uma lista de alguns cuidados importantes para o uso estratégico dessa tática:

ESTRATÉGIA_ Como toda tática, a ocupação não é um fim por si só. Ela deve ser um componente de uma estratégia maior para a solução de um problema político ou social. Essa estratégia precisa ter objetivos de curto, médio e longo prazo definidos e abranger outras táticas de comunicação e ação direta.

LOCAL_ O local a ser ocupado tem força simbólica, mas também traz implicações objetivas. Ocupar um hospital, por exemplo, é diferente de ocupar uma escola, pois os serviços que ele oferece estão diretamente ligados à sobrevivência humana. Outros locais podem ter impacto simbólico semelhante, mas envolver menos risco, como as secretarias de saúde. Ao escolher o espaço a ser ocupado, olhe sempre a posição que ele ocupa no sistema que gera a injustiça a ser enfrentada: pode ser o local onde as opressões ocorrem diretamente, onde as decisões são tomadas, onde as suposições e o “senso comum” se consolidam, ou onde o público consome ou interage com um produto ou serviço que deixa em sua trilha um rastro de injustiças. Mas equacione isso com sua capacidade efetiva de gerir aquele espaço quando ocupado.

LEI_ A ocupação inevitavelmente vai despertar um dilema jurídico entre a defesa da posse do Estado, de um lado, e a garantia dos direitos constitucionais de reunião e manifestação, de outro. Pense nas questões legais e esteja amparado por advogados.

MÍDIA_ A grande imprensa pode fazer uma cobertura desfavorável da ocupação e entrevistas para estes canais podem acabar se revelando emboscadas, independente do seu preparo prévio. Busque a mídia independente e lembre-se de que você mesmo pode fazer o papel da mídia com uso de vídeos, redes sociais, músicas, publicações e outras plataformas.

TEMPO_ O tempo e o timing são essenciais para o impacto da ocupação. Pense em como a ocupação começa, quanto tempo ela deve durar e como deve terminar. Articule com cuidado momentos de ofensiva e momentos de recuo.

LOGÍSTICA_ Ocupações de médio e longo prazo exigem um grande esforço logístico para garantir as necessidades básicas das pessoas que estão ocupando. Aproveite para fazer da limpeza, alimentação e comunicação interna empreendimentos coletivos que aumentam a articulação e coesão entre os ocupantes.

ATIVIDADES_ O que acontece dentro da ocupação? Um dos poderes das ocupações reside no fato de serem políticas prefigurativas, em que não há diferença entre aquilo que se busca e a forma como se busca. As atividades realizadas no espaço são, portanto, uma forma de evocar a realidade pela qual se luta.

APOIO_ Articular uma rede de solidariedade fora da ocupação é tão importante quanto o que acontece dentro dela. É isso que irá transformar a ocupação em um fato político de amplo impacto. Essa rede serve, ainda, como um apoio frente a ataques e uma fonte de ajuda para necessidades imediatas de alimentação, segurança, logística e atividades.

SEGURANÇA FÍSICA_ A segurança física e emocional das pessoas ocupantes deve ser uma prioridade. Algumas formas de ocupação, como os sit-ins, condensam um grande esforço físico, político e emocional em um curto espaço de tempo. As chances de retaliação física imediata são grandes e as pessoas participantes devem estar preparadas para isso. E, em ocupações de médio ou longo prazo, também há picos de repressão e tensionamentos constante que podem colocar as pessoas em risco e gerar desgastes em seu bem-estar.

SEGURANÇA DA INFORMAÇÃO_ Construa redes confiáveis (pessoalmente e virtualmente) para disseminação de informação. Na comunicação virtual, utilize sempre ferramentas de comunicação segura e garanta que elas sejam de uso coletivo dos ocupantes. E, mesmo assim, não comunique nada além do estritamente necessário, para evitar o vazamento de informações sensíveis: a espionagem e a infiltração são formas mais frequentes de combate a movimentos sociais do que muitas pessoas imaginam.

Artigo

Nexo Jornal: "Movimento de ocupações: em cada escola, luta, rebeldia e união"

Guias

O Mal Educado: “Como ocupar um colégio?
Rede Emancipa e Encontro de Grêmios: “Manual de mobilização estudantil e ocupação de escolas
Security-in-a-box: Guia de segurança digital para ativistas e defensores de direitos humanos

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A Escola de Ativismo tem a missão de fortalecer o ativismo no Brasil por meio de processos de aprendizagem. Site: http://ativismo.org.br