Jean Wyllys e Eliane Brum, dois exemplares dos “urubólogos do bem”. (Fonte das imagens: Rolling Stone/Zero Hora, colagem feita pelo autor)

Os urubólogos do bem e (mais) uma derrota para os fatos: qual será a próxima “carniça”?

Minuto Produtivo
6 min readMar 29, 2015

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Na última sexta-feira, uma notícia da Isto É me chamou a atenção: um filho adotivo de um casal gay, que havia morrido após sofrer uma agressão de colegas numa escola em Ferraz de Vasconcelos, na Região Metropolitana de São Paulo, teve, como causa de sua morte, fatores naturais (o laudo apontou para um tromboembolismo pulmonar ocasionado por cardiopatia hipertrófica). Ou seja: a agressão não causou a morte do rapaz.

Tal versão desmonta totalmente a ideia lançada tão logo quando o caso foi divulgado na imprensa, no dia 5 de março. Bastou apenas dizer que o garoto morto era filho adotivo de pais homossexuais para se criar uma histeria coletiva em torno de “mais um caso de homofobia”, sendo que o deputado federal Jean Wyllys é um dos expoentes dessa prática. Como de praxe, saem diversos artigos e comentários nos meios de comunicação e redes sociais criticando a homofobia, o “fundamentalismo cristão” (de preferência comparando-o desonestamente ao homólogo islâmico, mesmo quando se enxerga uma diferença clara entre ter asco a comportamentos gays em público — por mais imbecil que seja essa prática — e cortar cabeças de quem não acaba aderindo ao Islã, aos gritos de “Allahu akbar!”) e o conservadorismo da sociedade brasileira. Também de praxe, Bolsonaro, Feliciano, Malafaia, Eduardo Cunha e a bancada evangélica no Congresso acabam servindo de “bonecos de Judas” para serem espancados virtualmente (o dia da “malhação” está chegando aí, falta pouco). Mas bastaram surgir mais relatos do caso, como o da suposta existência de um aneurisma cerebral, para que a tese de crime de ódio revelar-se frágil.

Bem, agora que a luz foi trazida aos fatos e que “mais um crime de homofobia” virou apenas mais uma fatalidade causada por fatores completamente alheios a isso, pergunto aos leitores: vocês viram pelo menos uma nota de mea culpa, se retratando pelas declarações no mínimo precipitadas diante da situação? Não? Pois bem, eu também não vi.

Até aí tudo bem, se não fosse o fato de que não é a primeira vez que essa histeria seguida de um silêncio absoluto — como se essa mesma histeria jamais tivesse acontecido — ocorre. E é bem provável que não será a última. Dois exemplos disso são o caso Kaique (morto em janeiro do ano passado), em que a jornalista Eliane Brum, de forma extremamente irresponsável, comparou a situação com a repressão aos rolezinhos (inclusive foi tema de um comentário meu no blog), e o caso Donati (morto em setembro daquele mesmo ano). Dá até para montar uma rotina:

1 — O caso de assassinato é divulgado;

2 — Descobre-se que quem morreu era gay (o mesmo vale para ser bi, lésbica, trans ou qualquer uma das 6,02 x 10^23 classificações que não sejam macho e fêmea héteros);

3 — Imediatamente o caso, até então trivial, torna-se crime de homofobia;

4 — Faz-se então uma campanha histérica contra o “conservadorismo”, o “fundamentalismo evangélico”, escolhem alguns políticos e personalidades ligadas às duas coisas (Bolsonaro, Feliciano, Malafaia, etc.) para servirem de “bonecos de Judas”. Obviamente, pede-se uma lei anti-homofobia, que criminalize a questão (como se tacar lâmpada em alguém não fosse crime, e como se matar alguém por algo estúpido como orientação sexual não pudesse servir como agravante, situação que poderia muito bem ser prevista no Código Penal);

5 — Descobre-se que a morte por homofobia, na verdade, foi causada por qualquer coisa exceto homofobia. No caso Kaique, ele se matou em um viaduto homofóbico. No caso Donati, ele foi morto por alguém que teve uma transa homossexual (e homofóbica) com ele antes de matá-lo. Por fim, no caso mais recente que causou a histeria, uma cardiopatia homofóbica, por sinal, levou o garoto a uma situação fatal;

6 — Tão logo o item 5 é acionado, os histéricos do item 4 desaparecem. Não há uma retratação ou confissão de mea culpa. Espera-se, obviamente, que se repita o item 1 para reiniciar o ciclo.

Antes de eu entrar na comparação que dá razão do título deste post, é importante frisar algo não menos importante: no caso do filho adotivo de um casal gay morto recentemente, nem se esperou o item 5 para a situação ir para o limbo da imprensa nacional. E no período que o caso ainda tinha atenção lancei uma hipótese, que era a do fato dos agressores do garoto serem menores de idade. E, por razões óbvias, uma lei anti-homofobia não enquadraria os agressores, a não ser que…Claro, a maioridade penal fosse reduzida! Só que as bancadas esquerdistas no Legislativo (PT, PC do B, PSOL, entre outros) rejeitam veementemente esta questão, uma vez que se trata de “uma pauta conservadora que não vai resolver a violência”. Se reduzir a maioridade penal não é útil no combate à violência, por que alguém acredita que uma lei específica no combate à homofobia diminuiria os crimes de ódio a homos, bis, trans, entre outros? Qual a lógica disso? Não, não existe.

Finalizada a observação, vamos lá: por que chamo Jean Wyllys, Eliane Brum e outros high heads (!) da opinião esquerdista brasileira de “urubólogos do bem” (lembrando que não é a primeira vez que adoto essa expressão, basta você conferir aqui e aqui)? Pois bem, pensemos um pouco nos hábitos de alimentação dos urubus: eles encontram alguma carne de animal morto para comer, aproveitam o momento que ela ainda está disponível para se alimentar, e, tão logo esse esteja satisfeito ou a carne podre acabe, este acaba voando e levando sua vida até a hora da próxima refeição.

Toda vez que vejo a sequência dos seis passos (descritos mais acima) que mostram a rotina de histeria que se cria em torno de um suposto caso de assassinato por homofobia, eu não consigo ver outra figura que melhor se associe à situação que não seja a da nojenta cena de urubus sobrevoando alguma carniça para alimentar-se dela. É um tanto pesado para alguns isso que irei dizer, mas os mortos são a “carniça” e os opinadores histéricos são os “urubus”. Tão logo estejam fartos da histeria gerada ou tão logo os fatos desconstruam de forma avassaladora a narrativa criada, os “urubus” resolvem levantar voo e levar suas vidas normalmente, até que apareça a próxima “carniça”.

Eu até gostaria de estar muito equivocado a respeito, mas tenho uma convicção cada vez maior de que o que importa a Wyllys, Brum e outras figuras que representam o ápice de intelectualidade da galera esquerdista, seja por convicção ou por osmose ideológica no meio acadêmico, não é se no futuro haverá um mundo de fato mais tolerante, sem preconceitos por raça, cor, religião, orientação sexual ou por qualquer outro motivo, e sim que continuem havendo mortos e que tão logo se descubra que eles pertençam a grupos tidos como “oprimidos” pela sociedade, para que, junto a outros “urubus”, crie-se a histeria em torno de diversos espantalhos que podem representar qualquer coisa que seja oposição às suas ideias. Tão logo a “carniça” não dê conta ou quando os fatos vão de encontro à narrativa criada, eles sumirão e quem concordou, também. Até que apareçam mais mortos na mesma condição.

Não, não estou aqui para dizer que homofobia não existe. Tal como o racismo, ela é real e deve ser combatida pela sociedade, inclusive no aspecto legal. O que não deve ser visto como aceitável é que formadores de opinião atropelem repetidamente os fatos em nome de uma narrativa conveniente. E é igualmente inaceitável que estes não façam pelo menos um mea culpa quando contrariados pelos fatos. E, muito menos ainda, que pessoas que curtem e concordam com os posicionamentos desses formadores de opinião simplesmente não coloquem a mão na cabeça para pensar e ter um mínimo de crítica em relação a essa postura.

Como diz um ditado por aí: quem cala, consente. E quem consente com isso apoia uma postura digna de um urubu, não de um ser humano.

Por Marcos Jr.

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