Qual é a solução para o sucateamento das periferias?

O coletivo A Cidade que Queremos responde e traz novos apontamentos para a discussão nesta entrevista ping-pong.

Caroline Musskopf
3 min readOct 20, 2017

Durante nossa apuração para falarmos sobre o trajeto da Restinga ao Centro, conversamos com um morador do bairro Bom Jesus e integrante do coletivo A Cidade que Queremos. Ele abordou possíveis alternativas para que a organização desigual das cidades desenvolva novas características através da participação popular, mas garantiu que o caminho é longo. O coletivo é formado por diversas associações e movimentos sociais de Porto Alegre.

Foto: Cristiane Moreira.

De quais formas o coletivo enxerga a construção de uma cidade melhor?

Hoje, parte do que chamamos de organização do trabalhador é aquela que se dá no local de moradia de cada um: a luta comunitária. O principal empecilho para ela é que os movimentos sociais costumam reivindicar apenas caminhos imediatos. Resolver o problema do esgoto entupido, da falta de iluminação em uma rua. Tudo isso é importante, mas não podemos esquecer de discutir o que causa a exclusão das periferias. O dia a dia e as demandas da realidade são necessários e a gente precisa sim envolver as comunidades nisso, mas também é necessario fazer uma lincagem com as consequências do modelo de cidade que temos. Do contrario, não renovamos a militância.

Quais são essas consequências que tu citou? Como isso pode ser observado no cotidiano das periferias?

As cidades são organizadas apenas para responder suas questões econômicas. Onde é possível ter um retorno econômico maior, é onde os investimentos em infraestrutura vão ser feitos. Nas periferias, é a desassistência. O posto de saúde que fica funcionando semanas e semanas sem médico, as escolas que ficam sem professores o semestre inteiro porque não tem ninguém pra repor. Isso acontece porque muito dessas desigualdades das cidades estão ligadas a um tipo de gestão da máquina pública. O que poderia e deveria acontecer é a população mais desassistida ser prioridade e nós temos uma inversão disso. O sucateamento da Fasc é um exemplo disso.

Qual é o nível de aderência da população aos debates realizados pelo coletivo A Cidade que Queremos, abertos ao público? Eles são efetivos?

Nós vivemos um esvaziamento da ação comunitária popular. As pessoas estão frustradas com a política e acham que nada vai resolver a situação. Durante esse processo, é muito difícil de fazer as pessoas se engajarem nesse tipo de movimento. Isso precisa ser revertido, porque associado a nossa conjuntura geral do país, no qual nada nos representa, o espaço de mobilização se torna mais necessário, sem soluções superficiais.

Dentro deste contexto atual, como vocês estão atuando?

Estamos diversificando nossas abordagens, saindo um pouco das assembleias e dos debates acadêmicos e indo para as feiras orgânicas, feiras de economia solidária, conversando com as pessoas e ampliando o diálogo. A população que a gente consegue alcançar está aceitando desenvolver o pensamento crítico e se juntar para pensar em soluções.

E quanto ao transporte público e o acesso da população periférica aos centro das cidades? Como vocês buscam atuar nessa demanda mais específica?

O transporte público vai ser mais acessível na medida em que for mais descentralizado. Por que fazer um itinerário que faz um caminho por dentro de várias vilas? Para que as pessoas não precisem ir até o centro e pegar dois ônibus para um local que poderia ter um trajeto com a metade do tempo. Se tivéssemos roteiros alternativos e um número de linhas maior de ônibus circulares, para alimentar uma comunidade à outra, a acessibilidade aumentaria.

Qual é a perspectiva de melhoria para os próximos meses?

O movimento atual da gestão da Prefeitura está sendo o de reduzir os trajetos dos ônibus, substituindo algumas linhas por ônibus alimentadores, que só passam em ruas principais e terminais. Estamos em um processo de inibir o uso do transporte público, dando vários passos para trás. As viagens que 20 minutos vão passar a ter uma hora. Antigamente, nós tínhamos comunidades aqui perto que, para pegar um ônibus, as pessoas tinham que caminhar um quilômetro e meio de barro. A pavimentaçao das ruas também é uma reivindicação ainda bastante importante. Muita coisa melhorou, mas parece que estamos regredindo.

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