Innovation Letters: 2. PoC Machine

Daniel Lugondi
8 min readJun 12, 2020

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O ouro da eficiência está nas folgas da operação

Otimizar recursos! A busca pela eficiência contra a eficácia — Fundação Vanzolini Blog

Se você chegou até aqui, espero que você tenha o buy in “real e oficial” para pode seguir em frente na concepção da estratégia. Se não, fique tranquilo, pode ser que eu contribua um pouquinho com na sua trajetória, tendo em vista que mostrar resultados rápidos pode ser o melhor caminho para se conquistar este espaço. Quem começou a ler agora e não entendeu, leia este artigo antes.

Durante a minha passagem pela Nextel, tive a oportunidade de conquistar este espaço a partir de uma abordagem bastante similar ao que uma consultoria exerceria — diagnóstico, reenquadramento de problema, research, análise & síntese e vários workshops de ideação para geração de oportunidades — e fizemos isso em pelo menos duas oportunidades. Porém, conquistar o espaço é tão relevante quanto mantê-lo, sendo assim, neste post, trataremos o caso que nos ajudou a consolidar não somente o modelo de gestão da inovação que adotamos, como também a contribuição e impacto que este tipo de atividade pode exercer nos negócios.

Entre os caminhos possíveis a se percorrer, estabelecidos a partir de um diagnóstico que concebemos com base em uma análise extensa e detalhada, verificamos vulnerabilidades diversas, mas dentre eles — iniciativas de P&D, relacionamento com o ecossistema de startups, disseminação do design thinking como principal ferramenta no enquadramento e resolução de problemas e, ainda, um programa de educação e cultura — o que chamei de PoC Machine veio a ser nosso máquina motriz e ponto de partida.

Folgas no Sistema

Antes de falar do modelo adotado, vale ressaltar que não basta ter recursos e vontade; é preciso também técnica e embasamento para que se possa evitar desperdícios além, é claro, de se evitar o mal uso ou a apropriação errônea de métodos constantementes divulgados por aí, porém, de forma superficial. Neste sentido, recomendo a leitura deste artigo que escrevi sobre Os Paradigmas de Gestão da Inovação e suas Idiossincrasias: Uma Revisão da Literatura onde me baseei no argumento de alguns autores como Christensen et al (2015), Chesbrough (2012) e West et al (2014), que propõem que o uso indevido de uma determinada teoria, fora do contexto em que se destina, geralmente oferecem resultados desastrosos e, portanto, ocasiona uma má reputação à teoria da gestão da inovação como um todo.

Isto posto, vale lembrar o espectro da inovação, proposto por Vijay Govindarajan — Profº da Harvard Business School — onde a iniciativas de inovação podem ser adotadas de três formas, o modelo S (Simples), o modelo R (Repetível) e por fim, o modelo C (Customizado) conforme a figura a seguir.

O modelo S reconhece que até mesmo as máquinas de desempenho mais eficientes ficam aquém da perfeição, portanto, a estratégia central deste modelo é tentar comprimir a inovação na folga. Já o modelo R tenta fazer a inovação tão repetível e previsível quanto possível, à semelhança do ciclo contínuo, se tornando mais complexo que o modelo anterior já que aqui é necessário uma série de iniciativas de inovação similares. Por fim, iniciativas grandes demais para se enquadrarem no modelo S, ou diferentes demais dos esforços de repetição do modelo R, exigem um modelo customizado, o modelo C. Neste, as incompatibilidades fundamentais entre inovação e operações contínuas são sérias, e só podem ser abordadas pela distinção entre atividades necessárias a inovação das operações de rotina.

Como você deve ter percebido, unimos o útil ao agradável, o modelo S tende a ser mais fácil de aplicar se você conhece as folgas e, desta forma, comprimindo ali sua base para impulsionar a inovação.

Contexto: Alinhamento vs Autonomia

A transformação digital pela qual a empresa passava já demonstrava folgas mesmo na área responsável, uma vez que seu crescimento exponencial — por ser a principal aposta naqueles momentos difíceis a fim de estabelecer uma rápida vantagem competitiva — lhe possibilitou a gordura de uma estratégia significativamente rasa. Havia uma mentalidade para gestão de produtos, times promissores e muita, muita gente boa; porém e contudo, o crescimento repentino não lhes fornecera a cultura e o senso de equipe necessários para suportar as mudanças desejadas e, no tempo esperado pela atual gestão, para manter o time motivado.

Dois fatores foram determinantes para o movimento que descreveremos a frente. Primeiramente, houve uma mudança drástica na diretoria e também no nivelamento hierárquico, desta forma, em pouco tempo, eu passara a ter acesso direto ao CEO sem aquele velho telefone sem fio que transmite a estratégia repleto de vieses inconscientes e, muitas vezes, interesses próprios (que quase sempre se sobrepõem ao propósito da companhia). Com esta mudança nas cadeiras, passamos a ter uma liderança muita mais orientada a processos claros e disciplinados. Isto nos leva ao segundo fator, já que também passamos a ter um olhar sobre eficiência operacional e, daí, finalmente, tínhamos uma indicação que a área responsável pela revolução poderia ir mais além se autonomia e alinhamento estivessem devidamente equilibrados.

Neste sentido, acho válido expor aqui um modelo que muito provavelmente você conheça, mas na prática, em muitas empresas, é amplamente negligenciado. A imagem a seguir não tem muito segredo, mas uma boa descrição se resume em que o alinhamento ocorre quando líderes e equipes compartilham os mesmos valores e trabalham em torno de um objetivo comum. Desta forma, a autonomia permite que as equipes trabalhem independentemente dos líderes e entre si.

Quanto maior o alinhamento, mais autonomia podemos conceder. O trabalho do líder é comunicar qual problema precisa ser resolvido e por quê. O trabalho da equipe é colaborar entre si para encontrar a melhor solução. Entrementes, é preciso tomar muito cuidado para saber em qual terreno se está pisando, as pessoas podem estar felizes pela autonomia no ambiente de trabalho, mas os resultados do trabalho delas podem não estar alinhados a estratégia e, consequentemente, não necessariamente gerando o valor esperado/investido.

PoC Machine Nextel

Uma vez estabelecido o contexto, falemos do assunto do post. PoC ou prova de conceito, em inglês, Proof of Concept; é uma terminologia bastante utilizada no mundo dos negócios e diz respeito, como o próprio nome diz, a estabelecer uma prova de que algo realmente funciona. Na Nextel, foi um ótimo ponto de partida pois na área de Digital pairavam todo e qualquer tipo de ideia sobre as quais poderiam estar as novas vantagens competitivas a serem desenvolvidas para colocar a empresa de volta em um cenário de competitividade (exploraremos melhor em outro post qual estratégia adotamos para este cenário). Por outro lado, como mencionei, as folgas já eram percebidas e uma delas culminou no nosso primeiro (e bem sucedido) experimento.

Em meio aos vários times organizados (squads) que possuíamos, um deles se destacava por sua consistência e espírito de equipe, contudo, a natureza do seu trabalho nos forneciam indícios que poderiam operar com menos recursos. Esse time era responsável por suportar a nossa jornada de atendimento com ferramenta digitais, que até ali, se resumia em nossa URA (Unidade de Resposta Audível) — aquele sistema que precede um atendente humano e lhe diz 1 para isso e 2 para aquilo — mas que, certamente, tinha potencial para desenvolver outras frentes, em nossas suposições, por exemplo, o uso de chatbots assim como inteligência artificial e foi este caminho que adotamos a fim de explorar e evoluir a jornada supracitada, buscando eficiência operacional e também uma experiência do cliente diferenciada.

Desta forma, destacamos alguns profissionais do time mencionado para atuar, juntamente com os profissionais dedicados a iniciativas de inovação, constituindo assim, o grupo que teria como missão transformar nossas suposições em previsões confiáveis (figura 1).

Eles também seriam responsáveis no futuro por levar todo o conhecimento adquirido e aprendizados para aquela que viria a ser a nossa nova squad de atendimento digital, responsável pelo aprendizado de máquina (NLP) e também pelo design da interface de voz que nossos clientes utilizariam dali pra frente (vide figura 2).

Após 54 dias úteis (período que compôs o Q3 de 2018), estabelecemos 9 provas de conceito com diferentes fornecedores — já que a nossa proposta não era escrever do zero um chatbot e sim garantir nossa autonomia e controle ao nos apossar dessa nova tecnologia — além de termos 12 chatbots resolvendo problemas de clientes reais.

Conclusão

O case em questão nos fornece uma boa percepção, talvez menos glamourosa, de que a inovação pode ser realmente simples e, também, se comprimir em um contexto nem sempre tão propício para era ela se estabelecer, como é o caso de cenários completamente voltados a máquina responsável pela operação, e repetição, da vantagem competitiva vigente nas empresas. Vale perceber que nosso grande mérito foi conceber um plano factível para este contexto e, ainda, projetar um plano de negócio que conforme amadurecesse nos renderia um rápido payback, assim como, gradativamente, nos renderia um saving anual na ordem de grandeza de centenas de milhares de reais.

A inovação tem várias facetas e possui diversas formas de se arranjar, por isso, é válido desenvolver um repertório amplo a fim de se conceber rapidamente qual modelo terá mais aderência ao contexto no qual você e seu time estão inseridos, caso errem na aplicação do mesmo, considerem parte do aprendizado, mas como citamos acima, não se esqueça de contar com pessoas e/ou um time que possa lhe suprir o arcabouço necessário a fim de se evitar desperdícios, afinal, gestão da inovação é uma ciência vasta, não precisamos reinventar a roda.

E isto traz à tona o esforço significativo, e mais do que fundamental, para que, em meio a essa dicotomia — máquina de desempenho vs iniciativas de inovação — fique claro que o primeiro possui orientação a resultados e o segundo se volta para o aprendizado, respectivamente, conforme elucidamos no post anterior.

Referências

CHESBROUGH, H. Open Business Models: How to Thrive in the New Innovation Landscape. Harvard Business School Press. Boston 2006.

CHRISTENSEN, C., RAYNOR, M., McDONALD, R. What is disruptive Innovation? HBR — Harvard Business Review. Dez, 2015.

GOVINDARAJAN, Vijay. TRIMBLE, Chris. O Desafio da Inovação: Fundamentos para Construir Empresas Inovadoras em Meio a Incertezas. Elsevier, 2014.

WEST, J., SALTER, A., VANHAVERBEKE, W., CHESBROUGH, H.. (2014) Open Innovation: The Next Decade. Science Direct Elsevier, V. 43, Issue 5, Pages 805–811.

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Daniel Lugondi

Innovation and Change Management Consultant. Founder, vocalist, and guitarplayer at @HammurabiBrasil