A decadência dos sites de redes sociais

Fabio Ferrari
8 min readMar 13, 2017

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O Facebook vai desaparecer?

É… Parece que enfim começamos a perceber os primeiros sinais de que o futuro não será tranquilo para o Facebook, o Twitter e o Linkedin.

O sintoma mais evidente que encontramos hoje é exatamente a quantidade de lixo que rapidamente encontramos nos feeds de redes sociais. Neste caso lixo para mim são coisas que não são construtivas, como postagens políticas e religiosas, trivialidades engraçadas com gatos e cachorros, postagens sobre times de futebol, fotos de comida, etc.

Bom, todas as redes sociais são baseados num conceito simples: a construção de um feed de postagens ordenados dos mais recentes para os mais velhos, ou pelo menos era o que nos era prometido.

Só que como o lixo não parava de vir, de alguma maneira as redes sociais precisavam colocar o lixo para longe do consumo. E então a ordem e a garantia da publicação das postagens foram abandonadas, postagens que são avaliadas não interessantes acabam indo parar o fim do feed ou nem mais aparecendo.

O problema é que não existe uma maneira genérica de implementar mecanismos funcionais de curadoria de conteúdo. Os mecanismos são, em grande parte, mecanismos automatizados com base em medições do envolvimento dos leitores e pelas palavras chaves e links encontrados nas postagens, mecanismos esses que refletem mais o potencial de rentabilização, de engajamento e de retenção dos consumidores de conteúdo. E não permitindo que facilmente as próprias pessoas abandonassem assuntos não interessantes ou dispersivos, destruindo a produtividade das pessoas e as levando a sintomas de depressão associados ao comportamento viciante do conteúdo gerado com este objetivo de retenção.

E então agora estamos com este monstro quase intratável de informações confusas no nossos feed, e sem a menor ideia de que encontraremos todas as postagens que teríamos interesse. Ficamos então abrindo e relendo uma tonelada de postagens priorizadas pela rede social (especialmente anúncios pagos), para então só depois de algumas páginas encontrarmos as postagens que teríamos realmente interesse.

Ou seja… Estamos sendo enganados. Os feeds acabam sendo apenas publicações dinâmicas de coisas aleatórias, e ainda com várias postagens de coisas que nem assinamos mas que os nossos amigos curtiram e de anúncios pagos que não param de querer empurrar coisas nas formas mais superficiais possíveis.

Tem um anúncio que recebo regularmente que é o fim da picada: vendas de camisetas com dizeres associados ao meu perfil configurado na rede social! Vejo camisetas dizendo que o ano que eu nasci é o ano que nasceu os “melhores”, ou camisas promovendo a “engenharia” na qual me formei.

O engraçado de tudo isso é que as redes sociais como o Facebook estão rapidamente replicando tudo o que de ruim acabou acontecendo com a mídia impressa e televisiva. As mídias sociais possuem a tremenda vantagem de utilizarem conteúdos entregues de graça pelos usuários de forma colaborativa em vez de repórteres e agências que precisam ser pagas, e acabaram se tornando plataformas de mídia de atuação mundial capturando boa parte do capital usado para anúncios e propaganda. Apesar de toda esta vantagem, as redes sociais passaram a monetarizar o “canal” de forma ainda menos ética do que as mídias tradicionais.

A mídia tradicional só está um pouco na frente da mídia digital por ter se casado com os poderes da política antes, mas até nisso isso é questão de tempo. Toda esta celeuma associada aos “Fake News” são basicamente notícias contrárias aos interesses constituídos que já há muito tempo não conseguem aparecer nas mídias impressas e televisivas, mas que hoje conseguem se disseminarem pelas redes sociais enquanto os mecanismos automáticos de curadoria não evoluem na velocidade necessária para a proteção da fonte do poder: o estado.

Quanto chegarmos a este ponto, as redes sociais estarão dominadas e se tornarão ainda menos úteis que as antigas mídias tradicionais. Será questão de tempo para as pessoas perderem interesse no “lixo” disponibilizado.

O problema das redes sociais é que nasceram com o objetivo de construção de um “marketing pessoal” para os amigos e “inimigos”, e para divulgar eventos e interesses pessoais para o público de pessoas que fazem parte do relacionamento de “amizade”. Não é, não foi, e provavelmente não será um mecanismo de comunicação confiável com as pessoas da rede de relacionamento.

Os aplicativos de Chat

Entretanto estão surgindo de forma muito rápida alternativas de comunicação digital bem mais confiáveis. São serviços digitais aonde o “valor” oferecido é uma comunicação “não filtrada” pelo meio, ou seja, a aplicação ou serviço usado deixa de se meter e transporta a informação de forma mais burra.

Temos usado ferramentas deste tipo já há muito tempo. Plataformas como IRC, ICQ e GoogleChat estiveram em evidência mas nunca atingiram o nível de massificação para a população em geral. Somente o WhatsApp chegou ao nível de permitir que você chame um encanador qualquer por texto após ter recebido um contato também pelo WhatsApp de algum conhecido.

O apelo do WhatsApp nasceu como um substituto mais poderoso do serviço de SMS entre celulares, mas o que realmente ele capturou foi todo o poder da comunicação assíncrona proporcionada pelo texto e o consolidou ao público em geral em um nível muito mais amplo que todas as tecnologias do passado.

E não foi a toa que o Mark Zuckerberg do Facebook pagou 22 bilhões de dólares para comprar o WhatsApp em 2.014, uma empresa com apenas 55 funcionários. O poder de comunicação direta é disruptivo para o modelo de negócio do Facebook, o próprio Mark percebeu isso.

O grande dilema para o Facebook agora será descobrir como que o Facebook fará para gerar renda em cima da plataforma do WhatsApp e do mecanismo de Chat próprio do Facebook chamado Facebook Messenger, pois se meter na comunicação entre as pessoas destruirá o valor intrínseco de uma ferramenta de Chat, mas isso não quer dizer que não vão tentar.

Os paradigmas de Feed e de Chat

Ferramentas de Feed como o Facebook, o Twitter, o Instagram ou o Linkedin colocam as publicações mais recentes (ou às vezes mais “relevantes” depois que começaram a manipular o feed) na frente.

Isso é um mecanismo interessante se o objetivo for se entreter com o conteúdo, sem nenhuma preocupação sobre sequência e contexto, de forma que cada conteúdo ou postagem precisa ser autossuficiente para ser consumida. Nada muito diferente de um artigo de jornal ou um programa de TV que precisa contextualizar e explicar cada vez que inicia o artigo ou o programa, e contar com um certo nível de atualização do consumidor da informação.

O paradigma de Feed é naturalmente desenhado para o relacionamento 1:N, ou seja, para a disseminação de informação de forma independente e auto-contida e atingir o maior público possível e o envolver.

Neste momento já é possível perceber a razão do Feed ser tão ineficiente para o aculturamento ou elevação do padrão da comunicação: é repetitiva, descontextualizada e emburrecida para as massas.

O paradigma de Chat é completamente invertido: é sequencial e apresenta as publicações na ordem que aconteceram no tempo. Marcar o ponto exato aonde o conteúdo já foi lido é imprescindível para não perdemos tempo relendo, mas ao mesmo tempo é bem simples rolar para o passado e reler e buscar caso for do interesse da pessoa.

O paradigma de Chat é 1:1, fazendo a comunicação ser o quão focado for possível para o consumidor da informação.

Isso não quer dizer que não seja possível a disseminação de informações. O próprio WhatsApp permite a criação de qualquer quantidade de grupos de pessoas com interesses específicos, ou seja, permitindo a customização massificada de conteúdos.

Como cada comunicação possui a sua sequência, é essencial a separação e a identificação de cada “chat”, o que facilita ainda mais para o consumidor escolher os melhores momentos para o consumo de cada conteúdo.

O paradigma de “chat” é bem parecido com o do “email” com respeito a comunicação assíncrona, ao ordenamento e ao controle do que foi lido, mas apresenta dificuldades relacionadas a gestão da comunicação ao longo do tempo por causa do uso da analogia de correspondência escrita que não garante ordem e nem contexto.

O caso particular da China

O WeChat é o maior exemplo de sucesso das plataformas de chat, só que explodiu apenas na China, em parte pela reserva de mercado provocada pelos controles estatais e em parte por causa da disseminação massiva de smartphones usando Internet.

O WeChat, apesar de que na aparência parecer apenas mais um WhatsApp, esconde uma série de funcionalidades que facilitam e potencializam a comunicação 1:1.

De início existe o conceito chamado de Moments, que nada mais são do que espaços para publicação de imagens e textos para consumo a todos os contatos ou a grupos de contatos, e está sendo utilizado para substituir o Facebook e o Instagram praticamente com os mesmos recursos.

Starbucks no WeChat

Além disso, diferentemente do WhatsApp, é trivial a criação de contas de empresas e organizações, permitindo uma série de funcionalidades relacionadas a promoção de produtos e de pagamentos. É como se no Instagram de hoje eu pudesse clicar numa roupa de uma Instacelebridade, ver o preço, fazer alguma pergunta por texto para um atendente e então pagar (Alipay e WePay), tudo isso de dentro do mesmo aplicativo WeChat.

O futuro

É evidente que estamos progressivamente deixando de utilizar as redes sociais para a comunicação. Apesar da gestão de identidade que o Facebook implementou, o uso do número de telefone como a referência de identidade adotada pelo WhatsApp, Telegram, WeChat e outros é uma solução menos íntima e menos pública, facilitando comunicação de caráter mais profissional.

Além disso deveremos passar por um período aonde questionaremos seriamente a utilidade de expormos nossas vidas para o resto do mundo. Isso tem sido interessante até hoje porque até agora não tínhamos desenvolvidos personas públicas digitais, e estamos agora pecando pelo excesso devido ao egocentrismo natural das pessoas.

Da mesma forma que quando compramos um carro novo gostamos de expor a aquisição para as pessoas próximas com o objetivo de satisfazer o nosso ego e depois de alguns meses percebemos como isso é irrelevante no grande esquema das coisas, provavelmente isso rapidamente acontecerá com a exposição excessiva que vemos hoje.

Isso quer dizer que, se as pessoas conseguirem estabelecer personas digitais públicas através de meios menos intrusivos como as ferramentas de chat, teremos progressivamente a desertificação dos espaços digitais das redes sociais.

Mark Zuckerberg vai fazer de tudo para preservar a associação da identidade da rede social para a identidade dos outros produtos WhatsApp e Instagram como hoje faz com o Facebook Messenger, o que provavelmente terá algum sucesso.

A grande dúvida é se ele conseguirá fazer a transição do modelo de negócio baseado na venda de anúncios para outros modelos de negócios baseados na gestão da identidade digital das empresas e da intermediação financeira envolvida nas aplicações.

A receita anual por usuário do Facebook é estimada em 10 centavos de dólar, enquanto isso, o WeChat está conseguindo tirar cerca de 7 dólares por ano em média de cada usuário. Ou seja, viver de anúncio como o Facebook pode ser uma estratégia interessante a curto prazo, mas o “dilema do inovador” leva a crer que teremos mais chances de ver um novo entrante atacando por fora.

— Experimento prático: Canal do Telegram sobre Marketing de Relacionamento

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