Culpa.

Gustavo Assis
5 min readNov 18, 2016

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Igreja Matriz São Sebastião de Inhapim

Antes de falar de culpa, é importante notar como os preceitos passados por gerações pela sociedade, construída com base na fé Cristã, interferem em nossa criação.

Tendo ciência que mais da metade da nossa personalidade é baseada em valores construídos na infância, sabemos que, desde quando éramos apenas crianças, se você foi uma que como eu, vem de uma família religiosa, entende o que são os ensinamentos da Bíblia e o peso que eles inserem no que aprendemos do que é certo ou errado.

Imagine que uma criança cresceu ouvindo durante toda a sua vida, que aquilo que ela gosta, que ela quer ou que ela pensa, é errado, de acordo com um livro escrito há mais de dois mil anos atrás, em uma língua totalmente diferente da nossa e que foi adaptado e traduzido por humanos que possivelmente, cometem/cometeram falhas. Mas que ainda assim, é o que a sociedade se baseia e julga ser o certo (ainda que nesse livro, seja ensinado que julgamento só pode ser feito pelo Criador), e é o que devemos respeitar, ou do contrário, estaremos desrespeitando essa autoridade maior. E o caminho final para quem comete tamanha atitude, é um mar de coisas ruins eternas, conhecidas como Inferno.

Ao chegar na adolescência, o jovem que teve esses valores inseridos em sua vida, passa a se questionar de porque sentir aquelas coisas consideradas proibidas, e ainda que como ato de rebeldia ou privilégio, ele cometa algum dos chamados pecados estabelecidos pelo “Livro Sagrado”, ele sente uma dor no peito, um medo, uma angústia… É a chamada culpa.

Após essa introdução, comecei a me questionar sobre várias atitudes que tomei, por medo do sentimento de culpa.

Passei mais da metade da minha vida, com medo do julgamento da sociedade, que me ensinou que ser o que sou, é algo errado. Sentir o que eu sinto, é proibido. Querer o que eu quero, é caminho para o Inferno. Por isso me escondi…

Escondi não só das pessoas, mas passei a esconder de mim, coisas que eu realmente desejava sentir.

Tentei de todas as formas controlar meus sentimentos, para que eu pudesse me encaixar no que a sociedade, dizia ser o padrão do que é correto. E por mais que hoje eu entenda que não é possível ter o controle do que sentimos, por tantos anos pratiquei tal atitude, que isso se tornou um vício programado em minha mente, difícil de ser parado.

A tentativa de controlar os sentimentos, algo que no fundo já sabemos ser impossível, é uma porta de entrada pra pensamentos ruins, os quais despertam a ansiedade, depressão, entre outros.

A sociedade emprega um padrão de comportamento. E essa é a razão pela qual padrões são ruins.

Digamos que a sociedade seja um eixo, linear. E que quem esteja fora desse eixo, é porque está tentando se livrar dos ensinamentos padrões que nos foram impostos.

Uma vez que você faça isso, você está suscetível a julgamentos, não só externos como também, e (por experiência digo) mais perigoso que este, o interno.

Você se julga, se culpa, se rejeita, flagela seus sentimentos, por não conseguir se encaixar no eixo que te impuseram dentro de uma vida toda.

Toda essa culpa que você transfere pra si, não é sua.

Uma vez na terapia, em plena análise, cheguei ao ponto de refletir que quem não consegue se enquadrar nessa linha reta onde está a busca padronizada da nossa sociedade, fica doente, como eu.

E cada vez mais é possível observar que estamos todos na pior, transtornados.

Fazemos parte de uma sociedade que se encontra doente, tentando a todo modo fazer com que padrões sejam impostos e respeitados. Com valores construídos por religiões falhas e livros antigos, que basicamente não funcionam no dia de hoje.

Nos tornamos a geração dos inseguros.

E como forma de se mostrar menos inseguro perante o que vão pensar, você provavelmente comete o maior dos erros da insegurança: Tenta parecer forte, quando dentro de você, há algum sentimento a ponto de transbordar, querendo sair, como um grito.

Quem nunca sentiu vontade de mandar uma mensagem para alguém, mas no meio do caminho bateu a insegurança de pensar se estaria demonstrando sentimento demais, e aí, se segurou, tentando parecer forte, e esperando que o outro fosse mais fraco, e fizesse isso primeiro?

E o outro, que também quis parecer ainda mais forte-porém-inseguro, revidou.

Isso acontece pois mais uma vez, desde criança, aprendemos a cultura do bateu-levou. Se o coleguinha da escola te xingar, xingue de volta… E por aí, vai. No fim, ambos acabam perdendo.

Há o que se refletir, sobre os valores que pretendemos passar para as próximas gerações, ou cada vez mais, viveremos doentes e amedrontados. Esperando o amor do outro, mas com medo de oferecer em troca. Nos culpando por sentirmos algo, mas ao mesmo tempo tentando controlar isso para que não haja julgamento do outro. E no fim, nós nos julgamos.

Talvez você tenha lido tudo isso e não se identificou com nada do que foi dito. E se você é esta pessoa, parabenizo, por ser alguém que não só teve uma fantástica criação, como é seguro o suficiente de si. É o que eu chamo de life goals (metas de vida, mas em inglês parece chique).

Caso tenha se identificado, lembre-se que para todos os padrões, inseguranças e culpas, há desconstrução. E por isso, desconstruir é algo tão importante e tão debatido nos dias de hoje.

Esteja sempre aberto a ouvir o que é dito, a falar o que realmente sente, a sentir o que realmente quer e fazer o que tem vontade.

Sei o quanto é fácil escrever (nem tanto), e o quanto é difícil botar em prática, afinal são anos de valores errados inseridos em nossa criação e este é apenas um texto para refletir.

Mas, da minha parte, eu comecei essa busca de tirar de mim, essa dor que é esconder o que sou e me culpar por ser algo que eu realmente quero ser e viver.

Você também pode e tem o direito de se dar essa chance.

Quer vir comigo?

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