6 passos para projetar o UX em uma startup (ou qualquer outro lugar)

Henrique Mirai
8 min readMay 18, 2017

Quando eu fiz a minha pós em Design de Interação (lá na PUC Minas), tive contato com diversas técnicas para fazer com que eu produzisse algo que fosse centrado no usuário. User stories, análise heurística, análise semiótica, testes de usabilidade, etc. E às vezes esse tanto de técnicas me deixavam meio confuso, sem saber por onde começar.

Até que um professor me falou algo que não esqueci até hoje: “O design de interação é como se fosse uma caixa de ferramentas. Você vai utilizando as técnicas de acordo com a necessidade”. Isso me fez perceber o óbvio: elas eram apenas ferramentas que poderiam ou não ser usadas dependendo do projeto e que o mais importante era a maneira de pensar — o mindset — a experiência do usuário.

Porém como seria esse mindset? Como abordar um projeto, independente do meio que se vá trabalhar ou das técnicas que vão ser utilizadas, com foco na experiência do usuário? Foi durante o Gama Experience, mais precisamente após a aula com o Caio Calado da Take sobre chatbots que consegui perceber como fazer isso:

Passo 1 — Defina o propósito

Produzir um site apenas para dizer que tem um, ou um app por app ou ainda ter um chatbot apenas por ter é inútil. Eles são apenas instrumentos para resolver um problema.

Portanto, antes de definir o que será feito, deixe bem claro (para você e/ou sua equipe) qual é o problema que vocês querem resolver.

Passo 2 — Defina por onde você quer começar a cumprir esse propósito

Digamos, por exemplo, que você queira ajudar pessoas que por alguma razão (curso, compromisso pessoal, etc) caem de paraquedas em alguma região e tenham dificuldade de achar um local para poder almoçar, lanchar, etc. Apesar disso ser um problema bem definido, ainda é muito amplo para começar. As pessoas vem de onde? Elas vão para qual região? Em qual horário do dia?

Portanto o melhor a fazer no começo é ajudar os seus vizinhos. Digamos que você esteja na região da Savassi, em Belo Horizonte. Como ajudar alguém que não conhece lá a encontrar o melhor restaurante/bar para almoçar/lanchar?

Passo 3 — Conheça as pessoas naquela região que tem esse problema que você quer resolver

Agora que você tem definido qual é o problema que você quer resolver (achar um bom restaurante/bar) e em qual local (na Savassi, em Belo Horizonte/MG) é preciso conhecer melhor quem você quer ajudar.

Até esse momento você trabalhou com hipóteses. Você percebeu um possível problema e supôs que ele acontece bastante com as pessoas que visitam a região na qual você está localizado. Agora você vai buscar a primeira validação para a sua ideia, ao conhecer melhor as pessoas que vão lá e se elas realmente enfrentam esse problema que você percebeu.

Numa situação ideal você teria semanas (ou meses) para fazer uma extensa pesquisa de campo, com uma série de entrevistas, testes e etc. Porém nesse mundo de startups a situação ideal é o que menos acontece, portanto temos que usar o que está disponível para colher a maior quantidade de informações possível.

E uma nota importante: Nunca, mas NUNCA assuma como as pessoas vão se comportar. Não importa quanto tempo você tenha, sempre separe um pouco para pesquisar mais sobre elas. Se você tem 1 hora, separe 20 minutos. Um pouco de informação é melhor do que nada, mas jamais inicie o trabalho sem informação alguma.

Duas ferramentas que estão sempre à mão são os formulários online (como o Google e o Typeform) e as redes sociais. Crie um formulário para colher informações sobre quem você vai ajudar e divulgue-o nas redes. Jogue em grupos, na sua timeline, peça para as pessoas compartilharem e acompanhe para ver se estão respondendo.

Mas não, não pergunte algo como “Você usaria um aplicativo que te ajudasse a encontrar restaurantes na região da Savassi?”. Essa pergunta nesse momento muito provavelmente geraria um falso positivo (“É claro que eu usaria!” disse a pessoa que não tem ideia do que você está falando) e daí você teria uma validação falsa que sua hipótese está certa.

As perguntas que devem ser feitas nesse momento são, por exemplo:

  • “Exceto por trabalho, estudo ou lazer, por quais motivos você almoçaria ou jantaria fora?”
  • “Quando você está numa região que desconhece, como você seleciona um local para comer?”
  • “Você costuma pesquisar restaurantes na área onde você vai, antes de sair de casa?”

Entre outras. Além delas você pergunta sobre faixa etária, profissão, formação, tipo de aparelho usado (para identificar se utiliza Android, iOS ou Windows, informação importante caso seja feito um app e/ou um site), qual é o seu navegador preferido (para saber caso seja um site) e redes sociais/apps de comunicação (bom para saber por onde divulgar o app e caso seja um chatbot em quais canais ele poderá ser acessado).

Ah, e não se esqueça de fazer esse formulário o mais simples possível. Muitas questões costumam assustar as pessoas.

Passo 4 — Identifique a jornada daquelas personas na resolução daquele problema

De posse dessas informações todas você pode validar a sua hipótese inicial (digamos que você tenha conseguido 1.000 respostas e 70% delas dizem que costumam pesquisar restaurantes na área onde vão antes de sair de casa. Isso quer dizer que apenas uma minoria usaria a sua solução, o que não justifica o investimento) e identificar uma persona.

Mas o que é uma persona? Uma persona é a representação semi-fictícia (porque ela não existe, mas é baseada em pessoas reais) do seu público-alvo. Digamos que na pesquisa você descubra que os interessados têm entre 20 e 35 anos, são na sua maioria mulheres, profissionais liberais, que moram na região metropolitana de Belo Horizonte e que normalmente almoçam na Savassi quando tem que ir no médico.

Sabendo assim, podemos dizer que a nossa persona é a Maria, 27 anos, profissional liberal, moradora de Nova Lima que foi para a Savassi porque tinha uma consulta médica, e ao sair dela percebeu que estava com fome porém não conseguia ver nenhum restaurante na região que a agradasse.

No que criar uma persona ajuda? Ela nos dá um foco. Se pensarmos em público-alvo apenas, teremos dificuldade de definir algo já que os dados são muito amplos (“E se for um homem? E se for uma mulher? E se ela conhecer a região? E se não conhecer?”). Com uma persona nós sabemos quem vamos ajudar e qual é o problema dela.

Com a persona identificada, podemos partir para a próxima etapa que é definir a jornada que ela faz pra resolver o seu problema. Vamos pegar a Maria do exemplo:

  1. Ela sai da consulta médica e percebe que está com fome
  2. Ao chegar fora do consultório ela não vê nenhum restaurante ou lanchonete perto do local
  3. Ela resolve caminhar em volta do quarteirão para tentar achar algo
  4. Ao fazer isso ela passa por várias lanchonetes, mas nenhuma delas mostra exatamente o que servem
  5. Ela opta por tentar entrar na primeira que lhe agrada e faz o seu lanche.

Ou seja, até aqui nós definimos um possível problema, escolhemos uma região onde vamos começar a resolvê-lo, validamos que esse problema é real, ficamos sabendo quem é a pessoa que tem esse problema e com isso podemos concluir como normalmente eles fazem para resolver isso sem a sua ajuda.

Com isso tudo em mãos podemos criar uma possível solução.

Passo 5 — Crie um protótipo que ajude na jornada e defina métricas para medir o uso dele

Agora nessa fase que podemos começar a pensar em sites, apps, chatbots, etc. Digamos que você faça parte de uma empresa como a Take, que faz chatbots. Daí na sua pesquisa você identificou que a Maria, sua persona, utiliza bastante o Facebook para se comunicar. Com esses dois detalhes mais a jornada que ela faz você pode criar um chatbot que a ajude naquilo.

Ou se você fosse uma produtora de apps como a Ioasys, sabendo que a sua persona usa Android em vez de iOS já saberia pra qual plataforma deveria produzir primeiro e com a jornada saberia quais funções o app precisaria ter e qual seria o fluxo da informação (na forma das telas) para levar a Maria até a solução que ela precisa.

“Então é nessa hora que eu sento e faço o melhor produto que eu consigo?”. Não … exatamente. Agora é o momento que você faz um protótipo. Você constrói algo que tenha apenas o essencial para levar a persona de A à B. Não é o momento de pensar no refinamento, nos detalhes. Com o protótipo você faz a segunda validação: Se a sua solução vai atender quem você quer ajudar.

E além de fazer um protótipo, você deve estabelecer métricas para medir o sucesso (ou fracasso) dele. Mas tome cuidado em não definir métricas inúteis. Pense no momento que você está e se pergunte o que você precisa saber para poder partir para a próxima etapa.

Digamos que você tenha resolvido criar um app. O que é mais importante nesse primeiro momento: saber quantas pessoas fizeram o download ou quantas pessoas passaram por todas as telas até selecionar um restaurante? E sim, a métrica poderia ser uma combinação das duas, entre outras.

Além dessas métricas, tente ir a campo (nem que o campo seja uns 20 minutos no happy hour e o usuário seja uma pessoa que você conheça) e observe como as pessoas utilizam a sua solução. Não os ajude, só observe e anote. Isso, juntamente com as outras métricas vai permitir você ver o sucesso (ou fracasso) da sua solução e os gargalos que ela ainda tem.

Passo 6 — Pegue o feedback e melhore o protótipo. Repita o processo.

Agora que você sabe que a sua solução foi bem aceita e onde ela deve melhorar, aplique essas melhorias no protótipo, dê mais uma refinada e jogue uma nova versão no mercado para mais análises. Observe novamente as métricas, faça novos testes, vá a campo novamente. Pegue todo o feedback nessa segunda rodada, aplique no protótipo e lance a 3ª versão, mais refinada ainda. Repita o processo por tempo indeterminado.

Conclusão

Quem leu A Startup Enxuta (o que, você ainda não leu? Feche a janela do navegador e vá ler agora!) deve ter percebido que os 6 passos que eu apresentei são basicamente uma versão mais estendida do ciclo Construir-Medir-Aprender. Porém cada vez mais que eu me aprofundo nesse universo percebo que UX e Startups estão conectadas.

Por isso que dá até pra falar que UX não devia ser um cargo e sim um mindset para a empresa como um todo. Afinal de contas, sem o foco primeiro no ser humano não há produto ou serviço (e com isso um negócio) que valha a pena.

Esse artigo foi publicado originalmente no blog Faca na Carreira. Dá uma olhada lá!

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Henrique Mirai

Designer web, fotógrafo nas horas vagas, nerd/geek fã de Doctor Who e Star Trek. Você também pode achá-lo em henriquemirai.com.br