A “comunidade virtual” por Howard Rheingold

Jornalismo ESPM 2017.1
4 min readJun 10, 2018

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Por Fernanda Andrade

Howard Rheingold é um crítico, professor e escritor norte-americano que é autor de um dos primeiros trabalhos sobre relacionamentos online. A obra foi escrita em 1994 e se chama “A Comunidade Virtual”, termo criado por ele. A partir da organização dos seres humanos levando em consideração as condições materiais de vida, eles se reuniram em comunidades onde os próprios integrantes possuíam alguns interesses e traços em comum. Com o surgimento da internet e das mídias digitais, foram criados espaços de interação online entre as pessoas, onde novos laços entre elas foram estabelecidos.

Segundo Rheingold, as comunidades virtuais são diversas relações pessoais que estão ligadas e esses vínculos são formados e mantidos a partir de um computador, tablet, smartphone, etc. Essas associações virtuais são criadas a partir de interações com trocas de informações, interesses e opiniões (que geralmente são em comum). As comunidades virtuais se destacam por suas intenções, vontades e conhecimentos compartilhados. É isso que acontece com o grupo privado LDRV (Lana Del Ray Vevo) no Facebook.

Grupo LDRV no Facebook / Print por Fernanda Andrade

Dado que a interação humana é a razão de existência das comunidades virtuais e, logo, do LDRV, esse grupo no Facebook possui mais de 900 mil membros de diversos estados brasileiros. O propósito dele é o compartilhamento com humor de experiências pessoais diversas (as chamadas tours), interesses, desejos, aspirações, conhecimentos, etc. Para fazer parte dele, é preciso ser convidado por algum “amigo” do Facebook e ter a aprovação dos administradores, mas também deve concordar com as regras impostas, como não publicar ou comentar sobre política. Caso faça algo considerado proibido, o membro é banido do grupo.

Uma das características das comunidades virtuais é acabar com as fronteiras de espaço entre seus integrantes, já que as relações pessoais até meados do século XIX eram limitadas pela distância entre as pessoas. Estar no grupo LDRV não significa proximidade física com o resto dos membros, já que eles estão espalhados por todo o Brasil e até mesmo, em alguns casos, em outros países. Sendo assim, a tecnologia deu mais facilidade para encontrar pessoas com interesses em comum do que poderia ocorrer nos espaços físicos. Mesmo assim, em alguns meses do ano, os administradores do grupo promovem um grande encontro entre os membros (que quiserem ir) para interagir pessoalmente. Além disso, outra característica dessas associações virtuais é poder ter a escolha de com quem dividir esses interesses, já que nesses grupos é possível encontrar uma identificação (traços em comum) entre os próprios membros, como é visto em algumas tours.

Publicação que aborda sobre apropriação cultural e virou uma tour por possuir mais de mil comentários e reações / Print por Fernanda Andrade
Comentários na mesma publicação, alguns membros do grupo deram sua opinião sobre o assunto / Print por Fernanda Andrade

Para Howard, a terceira característica das comunidades virtuais é a possibilidade de construção e reconstrução de identidade, já que pode ocorrer a omissão de algumas características pessoais e, em alguns casos, manter o anonimato. O escritor afirma que “a gramática da realidade virtual envolve a criação de novas sintaxes da identidade”. Sendo assim, como no LDRV, distinguir o verdadeiro e o falso (nas publicações e comentários) é difícil. Garantir a autenticidade de alguém não é fácil nessa associação virtual.

Dois princípios básicos são levados em consideração para o estabelecimento de interações entre os membros de uma comunidade virtual: o interesse e a troca. A simpatia por mais de uma pessoa em um assunto, ideia ou tema é geralmente um dos primeiros fatores que leva os seres humanos a se integrarem em uma comunidade, porém, dentro da virtual, ter também uma participação significativa baseada na troca (de informações) é fundamental. No LDRV, alguns membros compartilham seus interesses e recebem comentários de pessoas que encontram uma afinidade pelo assunto da publicação ou querem expor sua opinião sobre. Em troca, esses integrantes que fizeram publicações esperam que, quando precisarem, encontrarão alguém que faça o mesmo e os papéis serão invertidos, o que é definido como economia baseada na troca, diferentemente da economia pautada na produção, que visa o consumo e o lucro. No grupo Lana Del Ray Vevo, podem ser percebidas as duas economias pois mesmo sendo uma associação virtual e tendo uma economia baseada na troca, alguns membros se aproveitam da visibilidade que a publicação de alguns assuntos possui e se aproveitam para se divulgar na comunidade virtual, sabendo que a publicação renderá muito “consumo” e “lucro”.

Apesar disso, a circulação de informações gratuitas nessas comunidades (mesmo que seja com humor, como acontece na maioria das vezes no LDRV) ilustra alternativas diferentes de distribuição de conhecimento sem relação com algum tipo de poder. São espaços de troca de opiniões e debates, o que mostra o potencial das associações virtuais. Mesmo que as intuições e definições de Howard Rheingold foram feitas em uma época que as tecnologias que promoviam a interação se resumiam à troca de textos, os conceitos definidos por ele são aptos a analisar as comunidades virtuais que surgiram após o estouro das mídias digitais, como é o caso do LDRV.

♀ Confira também a série de três podcasts sobre representatividade feminina feito pelo Empodera, que aborda sobre mulheres no esporte, feminismo e preconceito de gênero e mulheres vítimas de relacionamentos abusivos.

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Jornalismo ESPM 2017.1

Plataforma para divulgação dos textos do trabalho de Tecnologia da Informação e Comunicação baseado no livro "Teoria das Mídias Digitais" de Luís M. S. Martino