3. Cultura indígena, artesanato, arte ou design?

Antes de tratar da cultura indígena vamos ser claros a partir de agora com relação à definição no artigo sobre cultura, arte e design.

É comum nos dias de hoje tratar os artefatos primitivos como objetos de arte, porém devemos ter um olhar além do ângulo comum em que a sociedade atual entende, e da descontextualizacão de tempo e espaço dos mesmos. É comum relacionar arte como algo criado sem um propósito, simplesmente para expressar o eu do artista e cultura ser definida como reflexos artísticos.

Em nossa sociedade, temos o hábito de desagregar as coisas, separando assim, as expressões e vertentes artísticas da ciência, da religião ou da história. Levi-Strauss fala que todas estas questões estão unificadas.

“Não creio que a arte ocorra como um fenômeno completamente separado como ele costuma ser em nossa sociedade. Nessa sociedade tudo tende a se separar: a ciência se desliga da religião, a religião se desliga da história, e a arte se desliga de todo o resto. Nas sociedades estudadas pelos etnólogos, evidentemente, tudo isso se encontra unificado”. (STRAUSS, 1982, o. 24).

3.1. Entendimento de cultura neste contexto

Um conceito essencial de cultura, no caso, é o de organização. A organização implica um esquema ou estrutura muito definida.

A cultura se desenvolve a partir das necessidades orgânicas e básicas do homem e da raça, nada mais é que uma construção de ambientes próprios de cada povo.

Este ambiente criado pelos humanos é que devemos entender como cultura no decorrer do artigo. Em cada cultura existe seu próprio jeito de ver o mundo, sua própria ética, rituais religiosos, costumes e leis. Este conjunto de tradições é transmitida de cada geração para a geração seguinte, trazendo esta leitura no design como uma concepção projetual, onde o como se projetar artefatos são transferidos pelos antepassados.

3.2. Nível projetual indígena e artesanato

O modo de se fazer um arco e flecha utilizado para a caça é um exemplo. Este objeto é uma ferramenta desenvolvida para satisfazer uma necessidade orgânica, cumpre bem seus objetivos, porém, foi sem sombras de dúvida, aprimorado geração após geração para satisfazer esta necessidade, sendo assim um artefato de design em sua ampla maneira de pensamento, apesar de ser defendido muitas vezes como objeto industrial que pode ser produzido em série. Vendo por outro lado, existem muitas definições que tangenciam design, como é o caso do artesanato, que por sua vez podemos eleger as peças indígenas, talvez, nessa categoria, já que se trata de utensílios feitos manualmente que marcam a cultura de determinado povo.

Figura 3 — Tipos de flechas indígenas. Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre. Disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/Flecha. Acesso em 27 de novembro de 2013.

3.3. Visão artística para a sociedade contemporânea

Figura 4 — Museu do Índio — Rio de Janeiro. Disponível em http://goo.gl/HNQaqB. Acesso em 1 de dezembro de 2013.

Atualmente é comum a sociedade definir como arte os objetos e rituais indígenas, o que de fato não deixa de ser verdade pela ótica contemporânea. As lanças, tacapes, ocas, fotografias, cocares, entre tantos outros objetos como canoas, são hoje admirados em museus e exposições móveis, logo acabam se tornando aos olhos da sociedade objetos de arte, até mesmo quando inserindo sons e vídeos mostrando os rituais. Porém devemos enxergar apenas por esta perspectiva como arte, já que mesmo as pinturas, pictogramas e simbologias tinham empiricamente necessidades culturais a serem atendidas.

Hoje existe uma valorização desacerbada dos artefatos desenvolvidos pelos índios, Levi-Strauss faz menção aos preços “extraordinariamente elevados” que alcançaram adornos plumários de índios do Brasil central nos leilões de Paris e de outras capitais e lamenta o saldo irrisório que contempla os produtores nesse tipo de mercantilização. Ele também se refere ao sentido “arte de expressão moderna”. Podemos ver um exemplo claro no Museu de Arqueologia e Etinologia da USP, como retrata as fotos do livro A plumária Indígena Brasileira — já citado anteriormente.

Figura 5 — Retirado do livro A plumária Indígena Brasileira. DORTA, SONIA FERRARO. A Plumária Indígena Brasileira no Museu de Arqueologia e etnologia da USP / Sonia Ferraro Dorta & Marília Xavier. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo: MAE/Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2000. (Uspiana-Brasil 500 anos).

3.4. Design na cultura indígena

Se, em suas diversas definições o design se propõe a gerar soluções para os mais diversos problemas ou cria necessidades, como vemos no processo industrial, podemos também definir os utensílios domésticos dos índios como design, que são replicados de acordo com a necessidade. São criados com uma finalidade e ainda carregam o viés estético com preocupações ergonômicas.

O design sistêmico inclui resumidamente a seleção da matéria prima apropriada para o propósito do utensílio, a projeção mental (no caso dos índios) de como a peça será quando terminada, a mão de obra para desenvolver o produto (para que fique o mais próximo da forma ensinada pelas gerações anteriores), até que fique pronta e utilizável para, por exemplo, cozinhar, como é o caso das panelas de barro, que incluíam o colhimento de argila, um processo chamado de sova, as pinturas, estas ricas em simbologias, dentre outros processos.

¹VIDAL, LUX B. Grafismo Indígena: estudos de antropologia estética, 1992. São Paulo: Studio Nobel, 2007. ²RIBEIRO, BERTA G. O índio na cultura brasileira. Rio de Janeiro: Editora Revan, Ed. 2, 1991. ³CANCLINI GARCIA, NESTOR. Culturas Híbridas — estratégias para entrar e sair da modernidade. Tradução de Ana Regina Lessa e Heloísa Pezza Cintrão. São Paulo: EDUSP, 1997.

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