LIDERANÇA INSPIRADORA

oscar calderon
6 min readFeb 24, 2020

Sobre navegar em oceanos humanos

É um substantivo feminino. A liderança. Já ‘líder’ é de dois gêneros. Deriva do inglês leader, que deriva de lead, palavra que pode ser substantivo, adjetivo ou verbo. Não sou da área da semântica, mas tenho a impressão de que flexibilidade, maleabilidade e dinamismo, são características de uma palavra que tem várias possibilidades. Aproveitar as possibilidades é o que me interessa.

Inspirar é um verbo que além de se referir ao ato de levar ar aos pulmões tem também a acepção de sugerir, de insinuar, que é o que interessa para introduzir o conceito de Liderança Inspiradora.

Estamos vivenciando mudanças em quase tudo ao que estávamos acostumados até pouco tempo atrás. A política está bastante agitada no mundo, jovens não desejam comprar carros, a Inteligência Artificial toma decisões por nós, etc. A liderança, nesse cenário, precisa ser também repensada. O estilo de liderança tradicional, hierárquico, piramidal, ficou obsoleto praticamente de um momento para outro, mas a grande maioria dos líderes ainda está prisioneira dos prazeres aos que sua posição os acostumou.

O fim da liderança como a conhecemos já vem sendo proposta faz anos, entre outros, por Maturana. A proposta dele, e da Ximena Dávila, é a de uma liderança coinspiradora, que seja capaz de abraçar os desafios da era pós-pós-moderna que estamos vivendo. É a era da recursividade — conceito que ele utiliza amplamente nas suas teorias — na qual os seres humanos sabemos que sabemos o que sabemos e entendemos o que entendemos que entendemos. Um líder inspirador não é aquele no qual os liderados se inspiram. É aquele que de forma intencional inspira a liderança dos liderados.

No contexto atual a liderança tradicional perde cada vez mais sentido. Precisamos de uma nova liderança que convoque as pessoas para serem participantes ativas e criativas nos projetos, e que crie um ambiente no qual elas tenham liberdade de propor, ao invés de serem liderados obedientes que não aspiram ou não podem usar sua criatividade no desenvolvimento do seu trabalho.

O líder inspirador é aquele capaz de estabelecer espaços de confiança e conversação entre os colaboradores. O termo ‘capaz’ neste caso se refere àquele que sabe entrar no meio e lidar com o que emerge nos relacionamentos profissionais, que tem capacidade de construir a partir do que os colaboradores colaboram. Aquele líder que tem as respostas prontas antes das perguntas — capacidade muito bem avaliada até pouco tempo atrás — está perdendo rapidamente espaço na complexidade do mercado atual.

Um líder desses, precisa cultivar habilidades — soft skills — que o ajudem a navegar em mares bem diferentes daqueles para os que se preparou. Algumas delas estão listadas a seguir.

Comunicação Generosa

Quando um líder consegue estabelecer um estilo de comunicação que abre espaço para que o estilo de comunicação do liderado seja contemplado, a Comunicação Generosa acontece. É necessário evoluir e deixar para atrás o conceito tradicional e arcaico de que a comunicação é composta de um emissor, a mensagem, o meio e o receptor. Muitas visões sobre o que uma boa comunicação demanda estão se popularizando: a Comunicação Não Violenta, a Ontologia da Linguagem, a Comunicação Colaborativa, por exemplo. O líder inspirador deve se capacitar para conseguir estabelecer protocolos de comunicação que sejam apropriados para cada situação. Ordens ‘top-down’ tendem a diminuir cada vez mais no mercado. A colaboração, a generosidade, a empatia, a doação, são conceitos que hoje fazem parte do dia a dia de todo líder. A Comunicação Generosa propõe um campo de coordenação de relacionamentos que não é o tradicional e hierárquico líder-subordinado, mas um de colaboração e aprendizagem mútua, constante e consciente. O líder atual precisa entender que esse é um modelo que traz soluções mais apropriadas para a economia atual, para a complexidade atual.

Aprender e praticar a Comunicação Generosa é imprescindível para levar organizações adiante. Criar espaços emocionalmente seguros, que inspirem a Agilidade Emocional, é um dos pilares para uma liderança saudável e capaz de trazer resultados duradouros.

Lidar com a Complexidade

A complexidade é uma das características mais visíveis destes tempos. Entender que o nosso mundo atual é rizomático se tornou uma das habilidades que o líder moderno precisa. Cada vez menos questões lineares e sequenciais serão relevantes na construção de uma nova economia. Ter uma visão de que ao mesmo tempo que as coisas são caóticas podem ser calmas, de que uma relação não depende somente do histórico, mas também do contexto, da emocionalidade, do futuro, da espiritualidade, e de outros vários fatores, é uma habilidade que precisa ser desenvolvida. Líderes que não vislumbram isso vão parar de evoluir profissionalmente.

Pessoas que possuem a capacidade de entender que o mundo não é mais linear — característica que presenciamos desde o início da revolução industrial até hoje — estão na vanguarda da liderança moderna. Se a Teoria da Complexidade é algo que não está no radar do líder, as chances de ser substituído por alguém que entende disso são altas.

É necessário que o líder inspirador navegue nessas águas, e saiba tirar proveito da riqueza que existe na complexidade para poder entrar com seus liderados, e sua organização, no mar de oportunidades que está aberto na sua frente. Perder negócios pela limitação de um pensamento fechado, serial, que tenta predizer o futuro baseado exclusivamente no passado é o risco que o líder vive hoje. É indispensável se atualizar.

Saber dizer não

Sabe aquelas palestras motivacionais? Aquelas mesmas? Dificilmente encontraremos alguma motivando os líderes a dizer ‘não posso’. Mas a capacidade de poder focar naquilo que é importante e que só o líder pode fazer é uma soft skill que precisa ser priorizada. Quando o líder diz sim porque pensa que só ele é capaz de resolver bem, ou para não contrariar — algo mais do que normal no Brasil –, perde tempo para se recuperar do desgaste. Três dias, uma semana, dez dias… não importa: o tempo necessário para voltar ao rumo após dizer sim para aquilo que outras pessoas podem resolver é muito valioso para ser desperdiçado.

O líder inspirador sabe confiar e inspira aqueles que podem realizar, executar, cumprir, a fazer o que não depende exclusivamente do líder. Essa é uma das grandes dificuldades dos líderes tradicionais: confiar na capacidade dos outros. Será que vai sair do jeitinho que eu faria? Será que meus liderados sabem fazer? Será que dão conta?… Confiar na capacidade dos outros pode trazer — e geralmente traz — novas soluções, melhores, mais sustentáveis, baseadas naquilo que outros enxergaram, mas que o líder não viu, que incorporam experiências que o líder não tem. Saber dizer não é uma habilidade que líderes tradicionais dificilmente têm, e não querem ter por medo de serem julgados, mas que é muito necessária para inspirar a liderança dos outros.

Estar líder é diferente de ser líder. Quem chegou e está na liderança sem ter se preparado para ela precisará de esforço para ser líder.

Quem desenvolveu soft skills que suportam sua presença nesse lugar de liderança são os verdadeiros líderes: aqueles que sabem da sua temporariedade, que entendem de comunicação, que conseguem focar e dizer não, que lidam com as emoções sem ignorá-las, que sabem despertar nos liderados a própria liderança. Estes, e não os outros, serão os que construirão equipes de alto desempenho. São os que sabem navegar em diversos tipos de mar.

Habilidade. Um substantivo feminino que denota capacidade, inteligência, destreza, astúcia, manha, aptidão, engenho. Sem desenvolver cada vez mais suas habilidades comportamentais — as soft skills — o líder terá muita dificuldade em exercer uma liderança moderna e inspiradora. Meu desejo é que você possa se preparar para navegar nos mais diversos oceanos de gente que estão na sua frente.

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