Estime seus erros, por Aaron Swartz

Guilherme Sagas
Medium Brasil
Published in
4 min readFeb 9, 2016

Este post é uma tradução de “Cherish Mistakes”, escrito por Aaron Swartz, em sua série de posts “Raw Nerve”, que eu traduzo aqui como “Dedo na Ferida”.

Esta é a história de duas ONGs.

Na primeira, eles odeiam cometer erros. Poderia ser diferente? “A gente nunca vai gostar de errar”, eles me disseram. Só que essa atitude traz uma série de consequências. Tudo o que eles fazem tem que passar por dezenas de camadas de aprovação pra garantir que nada saia errado. E, mesmo assim, quando alguém comete um equívoco, eles tentam esconder.

É muito natural — você sabe que vai ter problemas por ter cometido um erro, e então tenta consertar antes que alguém note. Se isso não funciona, e o problema vai parar nas mãos do diretor executivo, o próximo passo é tentar esconder da imprensa ou distorcer o assunto, de forma que o mundo nunca descubra o que aconteceu.

Na outra ONG, a equipe tem uma atitude muito diferente. Já dá pra notar na primeira vez que se visita o site deles. Na barra de navegação, no topo de cada página, existe um link chamado “Erros”. Se clicar nele, você vai encontrar uma lista de erros, começando pelo mais vergonhoso.

E a lista continua por outros, grandes e pequenos. Em alguns momentos, suas confissões soam como um adolescente castigado e obrigado a escrever uma desculpa, mas juntas elas se tornam um importante arquivo de todos os equívocos que alguém pode cometer quando começa algo novo.

Não é que este grupo goste de errar — é possível perceber a vergonha naquelas linhas — mas eles também não esquivam do que aconteceu. Procuram identificar os erros, admiti-los publicamente, e pensar em maneiras de evitar que aconteçam novamente. Usam-nos como uma oportunidade de melhorar.

Eu escrevi antes sobre os estudos de Carol Dweck sobre crianças bem-sucedidas e malsucedidas, mas tem uma parte que realmente me chamou a atenção: depois de receber um enigma complexo, uma criança com atitude mental de crescimento sorri e diz: “Erros são nossos amigos”.

Os erros são nossos amigos. Podem ser amigos desesperadores às vezes, do tipo que tem excentricidades que nos deixam envergonhados e incomodados, mas com o coração no lugar certo: eles querem ajudar. Não é uma boa ideia ignorar nossos amigos.

É uma atitude difícil a se tomar — nosso instinto natural é escondê-los. Mas esse é o caminho errado, porque eles estão apontando o caminho para melhorar e desenvolver.

Se a gente tentar ignorar, eles vão continuar nos incomodando. Eles vão aparecer de novo usando outros disfarces, e você vai dizer: “Não seja bobo, isso não era um erro — Eu queria fazer isso.” E então vai fazer a mesma coisa da próxima vez. Ou então dirá: “Sim, sim, claro que foi um erro — mas não vai acontecer de novo!”. Mas enquanto você corre pra dar continuidade, nada muda, e tudo acontece de novo.

O truque é enfrentar os erros, confessar o que saiu errado, e pensar no que você pode fazer pra evitar que continue acontecendo. Normalmente, apenas prometer não fazer de novo não é o bastante: você precisa cavar até encontrar as causas.

Sakichi Toyoda, o fundador da companhia Toyota, desenvolveu uma técnica chamada “Os 5 Porquês” para lidar com isso. Por exemplo, algumas vezes um carro saía da linha de produção da Toyota sem funcionar. Por quê? Bom, imagine que foi porque a cinta do alternador estava solta. Muitas companhias parariam a produção pra consertar a cinta do alternador. Mas Toyoda entendia que isso erra se esquivar do erro — e iria fazer com que acontecesse mais e mais. Então ele insistia em perguntar: “Por quê?”.

Por que a cinta do alternador estava solta? Porque não foi colocada corretamente. Por quê? Porque a pessoa responsável não testou pra ver se tinha encaixado. Por quê? Porque ela estava com muita pressa. Por quê? Porque teve que andar até o outro lado da linha de produção para pegar novas cintas e quando voltou não teve tempo de fazer o teste.

Aha! Então, no quinto porquê, encontramos a causa do problema. E a solução era simples: mover a caixa da cinta do alternador para perto. Mas, se tivéssemos parado na primeira questão, não teríamos realmente resolvido o problema. Ele aconteceria muitas vezes. Apenas ao procurar a raiz conseguimos perceber que a caixa precisava mudar de lugar. O erro apontou o caminho para a solução.

Da última vez que eu escrevi sobre essas ONGs, alguém comentou dizendo que estava enojado pelo meu post. “O website da empresa não é lugar pra demonstrar humildade e argumentar contra suas próprias conclusões. Tudo isso demonstraria ingenuidade e incompetência”. E talvez esteja certo: ter uma página de erros no topo do seu website é ir muito longe.

Já escrevi dizendo porque eu não concordo, mas mesmo se os comentaristas tiverem razão sobre você não dever contar para o mundo sobre os seus erros, pelo menos precisa dizer pra si mesmo. É muito fácil e conveniente esquecer sobre todos os equívocos cometidos. E assim, mesmo acontecendo sempre, você não vai notar o padrão.

Ao se forçar a escrever, pra manter um registro dos problemas que apareceram, você começa a notar os padrões. Começa a ver em que consegue melhorar e em que continua patinando. E então sabe o que fazer da próxima vez.

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