Família da Carla e do Edison Reis, que vivem em Kelowna. A foto é de alguns anos atrás, atualmente a gurizada não é de tirar fotos.

Brasileiros no Canadá e EUA revelam outros lados da quarentena

Amigos contam o que têm feito e como os países estão enfrentando a pandemia

Sílvia Marcuzzo
7 min readMar 31, 2020

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Vou mostrar hoje alguns lados da realidade de amigos que moram na América do Norte durante a quarentena. Lá, apesar do calendário já indicar a primavera, o clima ainda tem cara de inverno. Vou contar o que as famílias da Carla e do Edison Reis, que vivem em Kelowna, no Canadá; da Carla Rigon, que foi em 1989 para Nova York; e o que a novíssima amiga Fernanda Todeschini que também vive no epicentro da crise nos Estados Unidos estão fazendo durante esses tempos de coronacrise. Carla e Edison se conheceram por meu intermédio, em 1989, no ano que vim para Porto Alegre. Ela era minha amiga de Cachoeira e ele, amigo do meu primo Régis. Carla Rigon foi companheira de naipe das sopranos do coral da Univale, também de Cachoeira e a Fernanda conheci este ano através do POA INquieta.

Confira também as postagens anteriores, sobre a situação de amigos na Itália e na China; na Alemanha, na Dinamarca e Groelândia. (clique em cima que dá o link para os textos).

Cartaz do supermercado. E os corredores tem mão única.

A família da Carla e do Edison já está há três semanas em casa. Meu amigo Edison, que nos velhos tempos de “Porto de Elis” era chamado de Caveira, conta que a experiência tem também proporcionado bons momentos. “Já moramos aqui há 24 anos e nunca vimos nada nem perto disso. Estamos bem, com saúde, e só saímos de casa para ir no supermercado. Felizmente, eu posso trabalhar de casa. Tem o lado positivo, pois essa quarentena está proporcionando ficar mais perto dos filhos. Normalmente eles não querem ficar muito conosco (o Raul tem 25 e a Juliana 16).” Raul mora em Vancouver há cinco anos.

Carla diz que está aproveitando para arrumar prateleiras, decorar o quarto da filha, pintar paredes (um exemplo da pintura feita está ao lado) e ver fotos com os filhos. Porém eles lamentam a situação econômica do país. “Várias pessoas perderam o emprego (ou estão em férias coletivas). O comércio está fechado (lojas, bares, restaurantes, etc). Muita gente não tem dinheiro para pagar aluguel ou o financiamento das casas ou até comprar comida. Felizmente, o governo anunciou 89 bilhões de dólares em ajuda para as pessoas desempregadas. Os bancos estão permitindo que as pessoas paguem as contas em até seis meses (não estão perdoando as dívidas ou prestações porém estão estendendo o prazo de pagamento e acrescentando juros em cima),” comenta Edison, que é gerente de qualidade e segurança na SGS.

Imagem da janela da casa dos Reis.

“Uma coisa legal que estamos vendo é como a comunidade está se ajudando. Tem várias pessoas ligando para os velhinhos da vizinhança para saber se eles estão bem, gente se oferecendo para ir ao supermercado, se preocupando com as pessoas doentes ou oferecendo comida. Nessas horas difíceis temos que nos elevar e demonstrar amor, suporte, carinho e o senso prático para ajudar o próximo. Estamos esperando que a coisa piore nas próximas semanas porém continuamos otimistas com relação ao futuro”, disse o casal, que tem cidadania canadense desde 2000.

Fotos da Carla Rigon, de NY, as flores que plantou no jardim, a vista da sua janela e a prática de exercícios junto com uma de suas filhas.

Já nos Estados Unidos, cujo presidente Trump demorou para reconhecer os riscos da pandemia, a situação é bem mais complexa, só em NY, já são mais de 40 mil casos de coronavírus.

A Carla Rigon, que mora no Queens, o bairro onde há um grande número de casos, me mandou o seguinte texto:

“NY é hoje o epicentro da crise nos EUA. A cidade que nunca dorme está mais quieta do que nunca. As restrições vieram rápido. Quando os alunos das escolas publicas foram pra casa na sexta-feira,13 de março, já havia especulações que iriam fechar. O governo estava resistindo à essa ideia porque a escola tem um turno que vai das 8h até às 14h45, proporcionando liberdade para os pais trabalharem, cafe da manhã e lanche para as crianças.

No dia 15, domingo, foi anunciado o fechamento das escolas, e seguiram planos para continuarem as aulas online. Nessa semana começaram as aulas pelo computador. A Secretaria de Educação deverá fornecer computadores e serviço de internet par os estudantes que não tem. Não está sendo possível isso ainda. Apesar de fechadsas, algumas escolas ainda oferecem café da manhã e lanche para levar.

Existem lugares para cuidar dos filhos de pessoas que trabalham com a crise atual (first responders). Atualmente somente os serviços considerados essenciais estão funcionando. Os restaurantes só podem fazer entregas. O número de pessoas que entram nos supermercados é limitado e as primeiras horas do dia são para os idosos. Produtos como massa e molho de tomate acabaram em vários mercados.

Aqui entramos pela porta da frente nos ônibus para pagar automaticamente num dispositivo. Atualmente as pessoas tem que entrar e sair pela porta de trás para evitar chegar perto do motorista. Os parques ainda estão abertos, mas o governo pede para manter distância entre as pessoas. Temos que levar em consideração que a maioria das pessoas mora em apartamentos pequenos, e prédios sem área ao ar livre. Há um projeto para fecharem algumas ruas, já que o tráfico é bem menos agora, para as pessoas poderem caminhar, fazer exercício e brincar, mantendo a distância necessária.

O governador Andrew Cuomo (confira a matéria do NY Times aqui) pediu para o presidente mandar a guarda nacional para cá. Vamos precisar de 30 mil respiradores. O pior da crise está prevista para daqui duas a três semanas. O governador ofereceu apoio financeiro para empresas que produzirem material hospitalar como luvas, uniformes e máscaras. Sugeriu um acordo para que uma fábrica produza mais respiradores que seriam comprados pelo governo, e assim que a curva começar a diminuir em NY, ele transportaria para outros estados.

Nas últimas semanas, a maior parte de população está tentando se adaptar com essa nova realidade. Estou dando aulas adaptadas de Gyrotonic, fazendo aulas de dança, minhas filhas com aulas diárias e até ensaio de coral, tudo pela internet. Apesar de frustrante, acho uma ótima oportunidade para tentarmos coisas novas e fazermos coisas que não tínhamos tempo antes. Talvez porque estou envolvida com artes e trabalho com o corpo, valorizamos a liberdade e estamos fazendo o possível para remediar essa situação.

Carla se exercitando no terraço do seu prédio.

Atualmente existem infinitas aulas que estão sendo oferecidas gratuitamente. É uma necessidade para nós continuarmos em movimento e, de certa forma, permanecer em contato. Acredito que aqui, por ser uma sociedade onde as pessoas naturalmente vivem mais isoladas, estão respeitando mais as regras de saúde. Acho importante as pessoas se informarem sobre essa crise através de fontes confiáveis. Infelizmente, somos bombardeados de vídeos que não valem o tempo que desperdiçamos para olhar.

Como meu esposo tem uma floricultura que teve que ser fechada, temos lindas flores no apartamento, dei algumas para os vizinhos e plantamos na frente do prédio. Fomos andar de bicicleta numa ilha próxima, sem nenhum contato com outras pessoas. Também subimos em cima do prédio para fazer exercício. Enfim, continuamos nos adaptando, reinventado essa realidade. Aqui em casa, ninguém parou.

Ainda não chegamos no pico da crise em NY. O navio hospital da marinha chegou em NY. E vale destacar algumas boas ações. O famoso hotel de luxo Four Seasons, localizado numa área privilegiada da cidade, também próximo de alguns hospitais, ofereceu seus quartos para os enfermeiros não precisarem ir para suas casas mais distantes e colocarem suas famílias em risco.”

Fernanda Todeschini, uma querida que conheci através de um grupo de WhattsApp do POA INquieta.

Outra gaúcha que vive em NY há menos tempo, a pouco mais de um ano, também tem trabalhado em casa e saído só para o essencial. É a relações públicas Fernanda Todeschini. Ela está planejando comemorar os 10 anos de relação com o marido Rafael em casa. “Vamos abrir uma garrafa de vinho, eu vou botar roupa bonita e me maquiar, como se a gente fosse sair, vamos botar uma música e dançar na sala.
Também vamos convidar alguns amigos para um brinde online. Ela observa que no sábado também se arrumou, mas que hoje está esculhambada de novo. Ela terminou o papo dizendo em estava indo para a aula de salsa. Tudo on line.

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