A Arte da Aprendizagem Autodirigida — Blake Boles

Alex Bretas
A Arte da Aprendizagem Autodirigida
7 min readAug 30, 2016

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Tradução de Alex Bretas

Acesse o texto preliminar e o sumário do livro traduzidos clicando aqui.

Introdução

O que aprendi no Acampamento de Verão

Quando eu tinha 11 anos, fui a um acampamento de verão pela primeira vez. Não escovei meus dentes por duas semanas. Foi fantástico.

No verão seguinte, tive uma namorada no acampamento. Ela tinha 14 anos. Eu disse a ela que tinha 13. Nós andamos de mãos dadas durante uma pegajosa semana. Depois ela descobriu que na verdade eu tinha 12, e eu aprendi que mentir para fazer alguém gostar de você não funciona.

Alguns verões depois, participei da viagem de mochilão mais difícil do acampamento. Ajudei a planejar o trajeto, embalar a comida e liderar o grupo. Nós escalamos até chegar a um rio bastante alto, brincamos em escorregadores aquáticos naturais e comemos pó de suco de laranja direto da mochila. Nossa vida era boa.

Depois da viagem, como eu fazia toda vez que chegava o mês de agosto, voltei à escola — e a vida parecia perder sua cor.

Eu ia bem na escola. Mas isso não fazia com que a situação melhorasse, porque o acampamento e a escola pareciam dois mundos totalmente diferentes:

  • No acampamento, eu tinha controle sobre meu tempo. Na escola, toda a agenda já era predeterminada;
  • No acampamento, eu podia ir a fundo nos meus interesses. Na escola, eu só podia alisar a superfície;
  • No acampamento, eu era um “freelancer” social. Na escola, ter sua identidade dada por um grupo era fundamental;
  • No acampamento, os adultos me tratavam como uma pessoa. Na escola, eles me confundiam com as notas que eu tirava na prova;
  • No acampamento, eu fui porque quis. Na escola, eu ia porque era obrigado a ir.

A escola me ensinou como memorizar um fato até sexta-feira e como alterar as margens de um documento no Word para engordar o número de páginas; o acampamento me ensinou como descobrir o que eu quero, tomar iniciativa, vencer meus medos, me apropriar das minhas vitórias e aprender a partir dos meus erros.

Para a minha percepção de adolescente, a proporção de acampamentos por ano em relação às idas para a escola não fazia sentido. Por que eu não podia ir aos acampamentos na maior parte do ano e depois dar uma passada na escola por alguns meses para aprender gramática, álgebra e todas as outras coisas que o acampamento não ensinava?

Descendo pela Toca do Coelho

Minha frustração silenciosa em relação à escola não encontrou ressonâncias até na metade do meu caminho na faculdade quando, por sorte, um amigo me emprestou um livro do professor novaiorquino John Taylor Gatto.

Gatto lecionou por 30 anos em algumas das melhores e piores escolas públicas de Manhattan. Ele ganhou diversos prêmios por seu “currículo de guerrilha” baseado em atividades comunitárias e mão na massa. Depois ele parou de lecionar porque não queria mais “machucar crianças para ganhar a vida”, e então começou a escrever — e palestrar ao redor do mundo — a respeito de alternativas às escolas tradicionais.

Subitamente uma chave virou para mim. O currículo de guerrilha de Gatto e suas críticas devastadoras uniram-se à minha frustração em relação à escola. Tudo isso junto causou um golpe na minha cabeça e conspirou para levar minha vida numa direção totalmente nova.

Dentro de um mês eu tinha abandonado o curso que havia escolhido na faculdade para projetar um novo que me permitisse estudar as teorias da educação full-time. Desisti do meu sonho de me tornar um pesquisador científico para passar minhas horas frequentando pequenas escolas experimentais, lendo todos os livros sobre alternativas à educação tradicional que eu conseguia encontrar e organizando uma aula para os calouros chamada “Nunca Fui Ensinado a Aprender”. Minha mente estava em chamas. Na época eu não tinha ideia que dentro dos próximos cinco anos, minhas experiências me levariam para o meu próprio caminho autodirigido de carreira.

Depois de me formar em 2004, voltei à zona selvagem da minha infância para trabalhar em acampamentos de verão e acabei me envolvendo em uma nova proposta, o “Acampamento de Quem Não Volta à Escola”, projetado para adolescentes unschoolers (homeschoolers que não seguem um currículo tradicional em favor de uma abordagem mais autodirigida).

Os jovens do Acampamento de Quem Não Volta à Escola — alguns deles abandonaram o ensino médio e muitos nunca sequer foram à escola — eram maduros, entusiasmados e conheciam bem a si mesmos. Eles se comunicavam claramente, questionavam ativamente o mundo ao seu redor e levavam em conta seus sonhos e objetivos de forma cuidadosa. Eu então percebi que eles eram exatamente as pessoas com as quais eu queria trabalhar. Nos anos seguintes, decidi construir minha carreira convivendo com jovens adultos unschoolers o tempo todo por meio da minha pequena empresa de educação e viagens, a Unschool Adventures.

Rapidamente eu me vi trabalhando em dois acampamentos de verão e propondo meus próprios programas de liderança, retiros de escrita e viagens internacionais todos os anos, concretizando meu sonho de infância de me lançar em aventuras como as dos acampamentos o ano todo. Achei que havia encontrado a terra prometida, mas alguma coisa continuava me incomodando.

Voltando à Superfície

Na medida em que eu entrava fundo na desescolarização, percebi que eu estava cavalgando nos terrenos mais selvagens da educação alternativa. A desescolarização era um movimento aberto e distribuído, e como qualquer movimento desse tipo, tanto as melhores quanto as piores coisas rapidamente vieram à tona.

Em seus melhores momentos, a filosofia da desescolarização promovia a escuta profunda das crianças, tratando-as como pessoas merecedoras do mesmo respeito que temos em relação aos adultos, e fornecendo um amplo leque de opções educacionais. Se a escolha da criança incluísse a escola ou a faculdade, assim seria. Nessa visão de mundo, tudo (inclusive modos de aprendizagem mais estruturados) era visto como uma experimentação a partir da qual podia se aprender.

Em seus piores momentos, a desescolarização considerava como vilão todo o universo da escola, suas estruturas, os professores, o ensino, as aulas, rotulando qualquer tipo de educação formal como essencialmente coercitiva.

A primeira visão me pareceu verdadeira, ao passo que a segunda não. Minhas próprias experiências de acampamento de verão e na faculdade envolviam bastante ensino, aulas e estruturas das quais eu e outras pessoas sinceramente nos beneficiamos.

Infelizmente, a segunda visão da desescolarização tinha a semântica ao seu favor. Afinal, o que era a desescolarização senão algo contra a escola? Isso se provou uma armadilha difícil de escapar, e nas minhas falas sobre desescolarização eu, também, me peguei indo contra a escola.

Foi aí que decidi que eu precisava encontrar uma visão positiva a respeito do que eu acreditava. Comecei, então, a buscar nos Estados Unidos e no mundo de forma mais ampla as raízes do que eu admirava na desescolarização, nos acampamentos de verão, nas viagens internacionais, no empreendedorismo e em certas escolas e faculdades.

O que Encontrei

Em 2009, eu já tinha me enfiado em lugares radicalmente diferentes entre si, desde os salões de tango em Buenos Aires até a Escola de Design de Stanford. Na minha jornada, entrevistei pessoas que decidiram sair do ensino formal e pessoas que estudavam nas melhores universidades, banqueiros e artistas, punks e programadores, hippies fora da curva e empreendedores educacionais obcecados por tecnologia. Conheci inúmeros pais incrivelmente inteligentes e cuidadosos de diferentes espectros filosóficos e políticos. E refleti profundamente sobre minha própria educação, tanto formal quanto informal.

Na medida em que conduzia minha pesquisa, um padrão emergiu. Parecia que praticamente todo mundo queria ajudar os mais jovens a fazer as mesmas coisas:

  • Resolverem seus próprios problemas;
  • Tornarem-se professores de si mesmos;
  • Trabalharem em desafios interessantes;
  • Colaborarem e se conectarem com outras pessoas;
  • Serem líderes em suas próprias vidas.

Professores queriam isso, unschoolers queriam isso, pais queriam isso e os próprios jovens queriam isso. Todos eles concordavam que essas habilidades seriam úteis tanto no nível pessoal quanto no nível profissional. O único problema? Ninguém concordava em como chamar esse pacote.

Mas pra mim, um termo despontava claramente: aprendizagem autodirigida. Trata-se de uma expressão que representa liberdade, escolha e a postura de se abraçar a aprendizagem em qualquer lugar em que se esteja. Era o melhor sinônimo de aprendizagem independente no século XXI e senti que o termo precisava de mais entusiastas.

Esta leitura contém as melhores aventuras, insights, lições e histórias que eu reuni no meu percurso de aprendizado. Este livro também é uma carta de amor para os aprendizes autodirigidos ao redor do mundo: os unschoolers, as pessoas que aprendem de forma independente dentro das escolas, os frequentadores de acampamentos de verão, os aventureiros, os empreendedores, pais e viajantes que continuamente me inspiram a trabalhar nessa vibrante fronteira do mundo da educação.

Se você gostar do que leu aqui, e especialmente se você tiver uma história para compartilhar, espero que me escreva no e-mail yourstruly@blakeboles.com.

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Alex Bretas
A Arte da Aprendizagem Autodirigida

Alex Bretas é escritor, palestrante e fundador do Mol, a maior comunidade de aprendizagem autodirigida do Brasil. Saiba mais em www.alexbretas.com.