Como Desmotivar Pessoas — capítulo 1

Adriano Lodi
Juntos Podemos Mudar o Mundo

--

Vou iniciar uma serie de textos para contar as minhas experiências mais desmotivadoras no ambiente profissional, e quero começar esse capítulo 1 pelo modo de desmotivação que mais me incomodou durante meu período no setor corporativo. A desmotivação ou “motivação” pelo crachá.

A desmotivação ou “motivação” pelo crachá é uma metáfora muito utilizada no ambiente corporativo para relacionar o poder da hierarquia dentro das empresas. De forma figurativa, seria utilizar o nome de outra pessoa com maiores poderes para atingir os objetivos.

Quando você trabalha em empresas geralmente tem mais de um chefe. Você tem o seu Chefe direto dentro da hierarquia estabelecida na organização, mas também tem os “Chefes-Clientes”. Aqueles que conduzem outras equipes, outros departamentos porém que dependem ou demandam tarefas/serviços para você.

Tive um Chefe-Cliente que personificava bem um profissional movido pela “motivação” do crachá. Toda vez que ele iniciava um pedido para alguém ele colocava na frente da frase o nome de uma pessoa da alta hierarquia da empresa. “Olha, o Diretor solicitou esse material e análise para nós”, “ O Vice Presidente falou na reunião, que precisamos evoluir com esse estudo”, “Vamos olhar o quanto antes, pois o Diretor deve nos cobrar em breve”.

Por vezes ele fazia isso de forma mais sutil, mas sem perder a chance de “usar o crachá” de um superior para dar o tom do incentivo. Por exemplo, quando debatíamos por uma hora, em uma reunião produtiva, e no final ele soltava a frase para todos presentes “Que bom que evoluímos com o trabalho, sei que o Diretor quer ver isso rápido”.

Eu acredito que ele sempre agia dessa forma por convicção que isso realmente motivava as pessoas. E essa crença provavelmente estava enraizada na sua mente, no seu comportamento por tudo aquilo que ele viveu, pela sua criação, pelo exemplos que teve, e contextos onde ele sempre esteve inserido. Somos em grande parte frutos do meio em que vivemos.

Nesse momento alguns de vocês podem estar lembrando de casos que a “utilização do crachá” de um superior ajudou a entregar um produto, ou retornou um projeto para o prazo, ou aumentou as vendas de uma equipe. Sim, todos nós temos exemplos onde esse tipo de motivação surtiu efeito no resultado. Evidente que é um tipo de motivação que funciona, até porque muitos de nós aprendemos isso desde da infância “Se você não estudar, vai apanhar!” “Reprova de ano na escola pra você ver o que acontece!”. Imagina o quanto esse tipo de motivação já nos influenciou em nossa formação como indivíduo.

O problema é que esse tipo de motivação tem como base o MEDO. E uma ação que foi impulsionada pelo medo pode até trazer resultados imediatos, mas não será sustentável ao longo do tempo. Essa ação não tem um PORQUÊ forte para se manter constante. E provavelmente não ocorrerá novamente sem que o processo do medo volte a aparecer.

Para mim a passagem mais emblemática que tive com esse Chefe-Cliente foi em uma reunião que tivemos com um VP (Vice Presidente). Foi um encontro incrível, onde esse VP olhou em detalhes alguns mapeamentos e análises que fazíamos, e com uma simplicidade genuína ele percebeu um maior benefício naquele trabalho, sugerindo uma alteração no formato que apresentávamos os dados. Para uma visão mais próxima do cliente, ao invés do modelo que estávamos utilizando. São daqueles encontros que saímos nos perguntando: “Por que não pensamos nisso antes?”

Aquela ideia que você admira. E naquele momento que você entende por qual motivo ele é o Vice Presidente da empresa.

Saímos motivados da reunião, com a certeza que poderíamos entregar algo com maior valor para empresa e clientes. E com a convicção que o nosso trabalho tinha um propósito maior.

Após a reunião o Chefe-Cliente criou uma rotina semanal de nos cobrar em relação ao novo material, sempre nos lembrando que deveríamos retornar com o Vice Presidente.

Foi aí, que em uma reorganização estrutural na empresa, mudamos de Vice Presidente. Sem esperar muito, no dia seguinte recebemos um e-mail do Chefe-Cliente em relação ao trabalho e as cobranças que vinha fazendo.

A mensagem era mais ou menos assim: “ Bom, devido a mudança de ontem, vou parar a cobrança em relação ao novo material. Entendo que não temos mais essa pendência. Vamos aguardar para ver se o novo VP irá solicitar algo nesse formato também”.

Não, mil vezes não.

Se entendemos que um trabalho irá trazer maior benefício para a empresa e para os clientes, por qual motivo não faremos? Vamos sempre aguardar que um novo “crachá” venha nos solicitar?

Respondi ao e-mail agradecendo a parceria, e dizendo que continuaríamos com o trabalho independente do VP, pois certamente essa nova visão nos traria benefícios como empresa.

Repare que mesmo para agir, executar, fazer o que entendemos como o correto, muitas vezes necessitamos de uma aprovação ou solicitação de algum superior na hierarquia dentro da empresa.

Esse cenário é um resultado ainda da forte presença da cultura do Comando e Controle. Onde passamos a trabalhar para atender apenas o Chefe em detrimento aos objetivos e metas das empresas. Onde o pensar e questionar ficam a segundo plano em detrimento a satisfação do Chefes (isso pelo medo de errar, medo de perder o emprego, medo de não ser aceito).

Mas qual tipo de motivação devemos utilizar?

Para mim não há nada melhor que a motivação pelo PROPÓSITO.

Declarar e ter um propósito para realização de uma tarefa dá sentido de PORQUÊ para as atividades. Permite que todos envolvidos tenham o mesmo entendimento do benefícios do resultado. Melhora significativamente a qualidade das entregas, já que expande as possibilidades das pessoas para definirem melhor os objetivos e como irão executar as atividades. Desenvolve a reflexão e a capacidade de crítica dos profissionais. Pode gerar surpresas positivas, pois quem irá executar não estará somente preocupado a responder à um Chefe, estará também engajado a desenvolver/entregar algo melhor.

Essa é uma ótima forma de combater os danos causados pela desmotivação pelo crachá. Quando você tem um propósito, você toma consciência do que precisa fazer hoje, amanhã e depois de amanhã. Sabe que aquilo vai trazer um benefício maior. As atividades passam a acontecer naturalmente, e os resultados passam a ser bem mais SUSTENTÁVEIS.

Realizar uma atividade com propósito gera uma AÇÃO IMPULSIONADA pela busca de algo melhor, e não uma ação empurrada pelo medo e cobrança.

E por fim deixo uma pergunta pra você líder, gestor, chefe, pai, mãe, marido, esposa, amigo.

- Quanto você se utiliza da motivação pela hierarquia (medo) no seu dia-a-dia? Quanto você se utiliza desse artifício em seus relacionamentos?

Notas finais:

Em relação a cultura do Comando e Controle, segue o link de outro texto onde falo um pouco mais sobre esse modelo de gestão.

--

--

Adriano Lodi
Juntos Podemos Mudar o Mundo

…entusiasta no desenvolvimento de pessoas pela Educação, Capacitação, Treinamento e Palestras… Professional Coach + Leader Coach + Analista Comportamental