Por que os caras me mandam nudes no Inbox?

Redes Sociais, consentimento e desejo.

_erinhoos
Animais Taxidermizados
3 min readSep 22, 2020

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«Não adianta nada encher a boca pra falar de empoderamento, consentimento, luta LGBTQIA+ e importância do feminismo agindo como um babaca, punhetizando conversas sem o menor contexto e objetificando as outras pessoas. É necessário fazer um sério balanço a respeito de como as redes sociais estão transformando as relações, e como vêm fazendo isso para pior». Fonte.

Aproveitando o ensejo dos debates trazidos pelo Dilema das Redes (Netflix, 2020), vamos voltar a fazer alguma coisa de útil! A quarentena, o desemprego, o Brasil, o cancelamento, tudo isso faz a gente agir na direção da desmobilização. O que nos sobra de ócio é neutralizado em grande parte pela dinâmica das redes sociais, as mesmas que, de acordo com esse documentário, cada vez mais desfiguram subjetividades e vilipendiando democracias.

Pois bem: nem que seja para superar o desencanto que o “cancelamento” da Carta de um cliente gay à SmartFit me causou. Nem que seja para deixar aqui textos mais fragmentados e curtos. Quero continuar ocupando o Medium como um espaço de resistência. Resistência à twitterização da comunicação, à neutralização do ócio criativo, à mediocrização do cotidiano.

Enfim, a pequena reflexão do dia de hoje é: de onde vem o hábito, no mínimo perturbador, comum entre muit@s gays e queers, de mandar fotos de volumes, paus e cus para pessoas que el@s mal conversam, colegas, semi-amigos e mesmo crushes, sem nenhum indício prévio de contexto?

aí uma coisa que eu sempre me pergunto: de onde vem essa ideia desastrada? Tipo, a pessoa dá em cima de você, e você não retribui. Velho, isso deveria ser mais do que suficiente pra pessoa se tocar, mas não; ela me aparece do nada com uma foto de pinto, às vezes até tirada na hora.

Primeiro: mano!, o que faz uma pessoa pensar que uma foto de pica à queima-roupa vai fazer eu mudar de ideia sobre ela?

Segundo: que raio de flerte é esse? Na rua, num bar, num karaokê, numa esquina, num Bar da Loka da vida, quando você tá interessado numa pessoa você tira o seu pau pra fora? Definitivamente não! E definitivamente eu mudaria de ideia a respeito de uma pessoa se ela fizesse isso, especialmente porque eu consideraria — e considero — isso uma forma de assédio, um exibicionismo creepy — e não é sexy agir como um tarado!

Não adianta nada encher a boca pra falar de empoderamento, consentimento, luta LGBTQIA+ e importância do feminismo agindo como um babaca, punhetizando conversas sem o menor contexto e objetificando as outras pessoas.

É necessário fazer um sério balanço a respeito de como as redes sociais estão transformando as relações, e como vêm fazendo isso para pior. Também é preciso fazer uma reflexão crítica a respeito das políticas do afeto, ética, responsabilidade e consentimento nas redes sociais. Eu sei que por detrás de muitos gestos como “mandar uma nude” num clima meio unilateral, existe uma cascata de questões que pode envolver não apenas desvios de caráter e/ou comportamento assediador, mas que pode muitas vezes envolver também dor, problemas de auto-imagem, ressentimento, medo da rejeição — aspectos que são retroalimentados fortemente pela própria dinâmica das redes, inclusive.

Enfim, é necessário que se faça uma revisão séria e honesta de certos comportamentos rumo a um ideal comunitário que expresse liberdade e saúde. Definitivamente: não é mandando fotos de pintos, cus e malas sem contexto que estaremos dando o nosso melhor para a construção de relações e subjetividades sadias.

Bom, se tudo der certo, hoje eu vou ser cancelado.

Confira também a versão em vídeo no Instagram.

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_erinhoos
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_antropólogo, barista informal, errante incorrigível, cantor de karaokê, sérião nas horas vagas