32. Que beleza de domingo
Sentada na varanda, puxava as folhinhas secas do manjericão. Refrescar, com cerveja, a melancolia de janeiro, pensou. E, ainda por cima, domingo.
Na sala, a gata dormia de barriga pra cima diante do ventilador, único som no ambiente. Na geladeira, duas longnecks e um vinho branco.
Ou dissolver em suor a melancolia?
Colocou uma música no celular. Adriana Calcanhoto cantou: “amarrado no mastro tapando as orelhas / eu resisti ao encanto das sereias”. Dançou, sentindo na sola dos pés o piso fresco da cozinha, uma taça de vinho na mão. Digitou a mensagem: abri um vinho branco, querem?
Estava sentada no chão, alisando os pelos da gata, quando ouviu as batidas na porta. Alice, de cabelos úmidos, a camiseta branca colada no biquíni.
— Eu tava tomando sol no terraço — ela disse.
— Tá tão quente. Entrem — Jennifer respondeu, puxando os cabelos pra cima com as duas mãos, prendendo num coque.
Davi segurava uma assadeira coberta com um pano de prato.
— Bolo. Fiz ontem. Não combina com vinho, mas… De repente, pra mais tarde.
Jeniffer apontou a mesa, ele deixou a assadeira. Ela buscou a garrafa na geladeira, encheu as três taças. Brindaram. Alice sentou ao lado da gata. Jeniffer abriu mais as cortinas da varanda e mostrou o manjericão:
— Até que não tá de todo mal…
Davi tocou as folhas:
— Acho que coloquei pouca água.
— Vocês cuidaram bem. Brócolis nem sentiu minha falta — Jeniffer sorriu.
No chão, a gata ronronava. Alice abandonou os carinhos e caminhou até a varanda:
— E como foi a viagem?
Jeniffer contou das festas em família, das comidas, dos dias de descanso. Davi buscou a garrafa, ela colocou a mão sobre a abertura da taça, recusando mais uma dose.
— Eu tava bêbada aquele dia e queria lembrar melhor. Eu lembro, mas pouco, e parece que foi bom, não foi?
Sentiu a mão de Davi encaixar na sua nuca. A língua fresca. A mão de Alice pousou sobre a sua, entrelaçou os dedos e puxou para dentro da sala. Sentiu a alça do vestido deslizando pelo ombro, o peito ficando descoberto, que bom, estava tão quente. Ouviu uma taça tombando no chão, percebeu Brócolis correndo para a cozinha. Incrível como a boca de Alice era sempre quente, ainda pensou, antes de não pensar mais nada.
Quando a noite subia no horizonte e o cheiro de café passeava pela casa, agradeceu Davi por ter trazido o bolo. Amarrando o biquíni, Alice sorriu:
— Que beleza de domingo, não?
*
CAPÍTULO 33
Este texto faz parte da história “O mundo é pequeno para quem é piranha”. Clique aqui para ler o primeiro capítulo.