Bridgemaker: Fazendo a ponte entre Universidade e Empresa no Joint Lab.

Lorenna F Leal
Bridge Ecosystem
6 min readMay 20, 2021

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Em nossos textos anteriores no tema de Joint Lab [O que é um Joint Lab ? e Quais os desafios de definição de portfólio e escopo de um Joint Lab?], apresentamos a definição e algumas caraterísticas dos Joint Labs, bem como alguns dos seus desafios de gestão, especialmente em torno da definição do portfólio e escopo do Joint Lab. Muitos desses desafios surgem pela dificuldade de conectar dois mundos completamente distintos (universidade e empresa) em busca de um objetivo comum de colaboração. Nesse sentido, um ator central para o funcionamento do Joint Lab, especialmente em seus estágios iniciais, é o Bridgemaker, que tem como responsabilidade manter o alinhamento e integração entre ambas as partes.

Retomando ainda o que foi apresentado nos textos anteriores, um Joint Lab é considerado uma meta-organização, ou seja, uma organização formada por outras organizações. Isso significa que, além da construção dos processos de gestão do Joint Lab, estes devem se integrar também aos processos das demais organizações (universidade e empresa) que o compõem.

Por exemplo, em um dos casos estudados em nossa pesquisa, os projetos inicialmente escolhidos pela equipe do Joint Lab eram submetidos em seguida por todo o processo interno de inovação da empresa para escolha e priorização de projetos, somando-se aos projetos internos de inovação, o que tornava o processo mais lento, além de criar uma certa competição por recursos com os projetos internos. Em outro caso, os recursos eram reservados especificamente para o Joint Lab e um comitê dentro da empresa era formado para participar da seleção e priorização dos projetos do Joint Lab. Ou seja, um novo processo foi desenvolvido pela empresa e adicionado às suas atribuições para garantir maior celeridade no processo de seleção de projetos para o Joint Lab. Do ponto de vista da universidade, um exemplo de alinhamento dos processos do Joint Lab aos da universidade é o alinhamento das entregas de pesquisa aos prazos de entrega de mestrados e doutorados.

O Bridgemaker, portanto, é o responsável por identificar ou até mesmo desenvolver esses “caminhos” e processos dentro da empresa e da universidade para que o Joint Lab consiga funcionar de maneira mais fluida e ágil.

Em geral, existem pelo menos dois Bridgemakers: um do lado da empresa e um do lado da universidade. Em muitos dos casos estudados em nossa pesquisa, os participantes dos Joint Labs apontavam os Bridgemakers como pessoas “sem as quais o Joint Lab nunca teria se tornado uma realidade”.

A aprovação e/ou atualização de projetos, equipes, recursos, pode ser tornar muito lenta quando submetidas às burocracias tanto do lado da universidade quanto do lado da empresa. Nesse sentido, em nossa pesquisa foi possível observar o desenvolvimento de alguns processos mais simplificados e ágeis (fast-tracks) para garantir o dinamismo do laboratório. Em geral esse processo também se torna mais fácil e rápido ao longo do tempo, quando empresa e universidade já desenvolveram um relacionamento mais próximo. Porém, especialmente nas primeiras vezes, cabe aos Bridgemakers de ambos os lados compreender, executar e até mesmo criar esses processos.

Os Bridgemakers possuem o papel também de auxiliar na busca de recursos e suporte, tanto dentro da empresa quanto da universidade, sempre que o Joint Lab demandar. Por exemplo, quando existe a percepção de que para um projeto avançar se faz necessária certa competência, o Bridgemaker do lado da universidade pode fazer a buscar cientistas e pesquisadores que possam ser incorporados ao projeto para solucionar essa lacuna de conhecimento. Da mesma forma, quando se torna relevante para o projeto entender melhor como seria a aplicação de seus resultados no dia a dia, o Bridgemaker do lado da empresa pode buscar a equipe interna daquela área de negócios para estabelecer a comunicação e possibilitar a contribuição com o projeto.

A busca por recursos e suporte pode envolver ainda outras fontes de financiamento para projetos (de maior risco, por exemplo) e ainda a busca pela manutenção do interesse e suporte institucional da universidade e empresa (especialmente alta gestão). Em alguns dos casos estudados, por exemplo, Bridgemakers da universidade mantinham relacionamento próximo com a alta gestão da empresa, atuando até mesmo com consultores em momentos pontuais, fortalecendo assim a confiança entre as partes. Nesse sentido, os Bridgemakers atuam ainda na conexão e integração com diferentes ecossistemas. Por exemplo, Bridgemakers da universidade podem fazer a conexão com o ecossistema de conhecimento, ou seja, pesquisadores, centros de pesquisa, instituições de financiamento, laboratórios, etc. Já os Bridgemakers da empresa podem fazer a conexão com os ecossistemas de inovação pertinentes, e até mesmo com o ecossistema empreendedor, ou seja, com startups que podem atuar principalmente nas aplicações de tecnologia e spin-offs do Joint Lab.

[Entenda melhor a diferença entre um ecossistema de conhecimento e um ecossistema de inovação em nosso texto “Conheça os tipos de Ecossistema em negócios”]

A conexão entre estes diferentes ecossistemas pode potencializar a pesquisa, desenvolvimento e aplicação de tecnologias não apenas no âmbito do Joint Lab, mas também na geração de novos negócios. Para tal, é importante que o Joint Lab desenvolva uma estrutura não apenas de pesquisa, mas de inovação, ou seja, de aplicação de pesquisa para aproveitar o potencial de spin-offs e também para o desenvolvimento de fornecedores ou negócios complementares que sejam relevantes para a entrega de valor que a empresa deseja desenvolver.

Ainda no sentido de potencialização de negócios, é importante que a equipe de inovação e P&D interna da empresa se conectem também com o Joint Lab, de maneira evitar a sobreposição de atividades e alinhar pesquisas e desenvolvimentos realizados internamente e externamente. De maneira recorrente em nossa pesquisa foi apontado como fator de sucesso em termos de aplicação dos resultados do Joint Lab, o fato de haver pessoas dentro da empresa que conseguem “compreender e falar a mesma língua da academia”, pessoas altamente qualificadas que já estiveram na academia, em geral no nível de doutorado. Esses atores internos atuam também como Bridgemakers “secundários”, fazendo a ponte entre a equipe externa do Joint Lab e a equipe interna de P&D e unidades de negócios.

Além dos papéis anteriormente detalhados, considerando a característica dinâmica da pesquisa e desenvolvimento, as incertezas envolvidas nesse processo e as necessidades que podem emergir de mudança e adaptação, outro papel importante dos Bridgemakers é o de manter fluxos de comunicação para garantir o alinhamento entre ambas as partes, e ainda o alinhamento do próprio laboratório com as estratégias da empresa e da universidade. Esse alinhamento é essencial para que o Joint Lab se mantenha flexível, adaptável e ágil em suas atividades e na tomada de decisão.

Além disso, os Bridgemakers tem ainda o papel de fazer a regulação no Joint Lab, tanto no nível de projeto quanto no nível de portfólio, de maneira a equilibrar esforços de pesquisa e desenvolvimento, garantindo que o Joint Lab gere resultados de pesquisa satisfatórios do ponto de vista da universidade, mas também aplicações desses resultados para a empresa, quando pertinente. Em alguns casos a regulação pode ser menos desafiadora, especialmente quando o laboratório está ligado à estratégia de longo prazo da empresa, e o maior interesse da mesma é exatamente em resultados acadêmicos que, em um futuro ainda distante, possam ser úteis para a empresa. Em laboratórios mais voltados à aplicação de tecnologia, desenvolvimento de produto, etc., mais de curto prazo e, principalmente, nos laboratórios que combinam pesquisa e desenvolvimento de curto e longo prazo, a regulação pode ser mais desafiadora.

Em resumo, identificamos a partir de nossas pesquisa que os Bridgemakers da universidade e da empresa possuem papel relevante na construção e funcionamento de Joint Labs, realizando os papéis de:

  • Desenvolver os processos de gestão específicos do Joint Lab;
  • Alinhar os processos do Joint Lab aos processos da universidade e da empresa, quando relevante, ou seja, desenvolver os “caminhos” dentro da empresa e da universidade;
  • Auxiliar na busca por recursos e suporte dentro e fora da universidade e da empresa, sempre que necessário;
  • Manter a comunicação e conexão com ecossistemas de inovação, de conhecimento e ecossistemas empreendedores;
  • Alinhar a comunicação entre o Joint Lab, a universidade e a empresa;
  • Alimentar o relacionamento com potenciais “patrocinadores” do Joint Lab e seus projetos na alta gestão de ambas as instituições, sempre que possível;
  • Alinhar a estratégia do Joint Lab às estratégias de da universidade e da empresa;
  • Fazer a ponte entre o Joint Lab e as unidades de P&D e negócios da empresas, desenvolvendo Bridgemakers “secundários”;
  • Fazer a regulação no Joint Lab, tanto no nível de projeto quanto no nível de portfólio, de maneira a equilibrar esforços de pesquisa e desenvolvimento;

Para compreender melhor a regulação no contexto de Joint Labs, confira o nosso próximo texto:

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Lorenna F Leal
Bridge Ecosystem

Eng. de Produção pela UERJ, mestre pela USP. Linkedin: lorennafleal