Meu caro empreendedor, precisamos falar sobre o lucro…

Marcelo Dionisio
Business Drops

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Nos últimos anos o Brasil tem estado na lista de países mais empreendedores do mundo, ficando à frente de países como Argentina, México e dos países do BRICS (bloco econômico formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul). Principalmente em consequência da longa crise economica que o país enfrenta, muitas pessoas optam por empreender por uma questão de sobrevivência e contribuem para esse resultado expressivo, mas mesmo assim quando se fala em lucro percebe-se uma conotação negativa.

Segundo Jesús de Soto, desde a Grécia antiga as atividades comerciais e mercantis são vistas com desconfiança, e atualmente essa postura se reflete na posição de intelectuais, que em sua grande maioria são contrários à economia de mercado e ao capitalismo.

“Por que os intelectuais sistematicamente odeiam o capitalismo?”

Essa foi a pergunta que Bertrand de Jouvenel (1903–1987) fez a si próprio em seu artigo Os intelectuais europeus e o capitalismo, dessa forma, de Soto alerta: “ Vocês, futuros empreendedores, têm de entender isso e já irem se acostumando. Amanhã, quando estiverem no mercado, gerenciando suas próprias empresas, vocês sentirão uma incompreensão diária e contínua, um genuíno desprezo(…). Todos estarão contra vocês.”

Hoje podemos verificar esse tipo de reação quando vemos em plena campanha eleitoral um determinado candidato alegando que “empresas queriam liberar o uso de agrotóxicos reconhecidos por causarem cancer só para aumentar seus lucros”. Será verdade?? matar inocentes para enriquecer? não sei …

A motivação para empreender

Eder Bolson em seu livro “Tchau, Patrão!”, afirma que mais do que por ganância, empreendedores, na maioria das vezes, têm outras motivações como por exemplo a busca por realização pessoal ou prestígio social ou até pelo simples fato de gostarem de competir, vencer e saborear vitórias. São também citadas, em menor número, motivações sociais, ou de inspiração religiosa, como a necessidade de fazer algo que possa gerar emprego e renda para determinadas comunidades, o chamado empreendedorismo social, tema de outro artigo meu aqui no Business Drops.

Em seu artigo no site “Comunidade ADM” ele conclui “ Está na hora de separar o joio do trigo, sem arrancar o trigo. Está na hora da sociedade brasileira valorizar mais o êxito individual e deixar de abominar o lucro empresarial como algo pecaminoso. Por outro lado, os verdadeiros empresários não precisam mais falar de suas atividades lucrativas com qualquer tipo de constrangimento. Eles precisam se sentir como agentes ou motores do desenvolvimento, como sustentáculos da imensa pirâmide que é o mundo capitalista.”

Então, qual o problema do lucro?

O próprio conceito de lucro já promove polêmica, pois do ponto de vista econômico ele é definido como “ ganho auferido durante uma operação comercial ou no exercício de uma atividade econômica”, mas seu substantivo é definido como “ qualquer vantagem, benefício (material, intelectual ou moral) que se pode tirar de alguma coisa” o que claramente implica em uma conotação negativa, onde uma parte se beneficia de outra.

Embora seja constantemente visto como objetivo final de empresas e empresários, o lucro é uma questão de sobrevivência, por isso ele deve ser perseguido, pois empresas sem lucro com o tempo morrem, acabam pelo simples fato de não conseguirem cumprir com suas obrigações com fornecedores, funcionários e com o governo.

Sob essa perspectiva o lucro não é um fim e sim um meio, a maneira existente para uma empresa sobreviver, crescer e se manter. Lembrem-se que no Brasil a taxa de sobrevivência das empresas com até 2 anos é de 58% (Sebrae 2014, excluindo-se as MEIs), enquanto no resto do mundo, países como a Nova Zelândia apresentam taxas de 63%, Noruega 66%, Portugal 52% e Estados Unidos 79% (OECD, dados de 2007), ou seja, o desafio da sobrevivência é grande para qualquer empresário.

O meu lucro não é meu

Uma grande ilusão em relação ao mundo empresarial e erro cometido por alguns empresários iniciantes é o de que todo o lucro vai para os bolsos dos dono. Grande erro…

Teóricos da administração, como Chandler (1977), afirmam que, para ter sucesso, uma empresa deve adotar uma propensão à autoperpetuação, uma relação dinâmica entre a existência contínua e seu crescimento, ideia compartilhada por Penrose (1959), que argumenta que é papel da administração encontrar de maneira eficiente as melhores maneiras de utilizar os recursos disponíveis e buscar oportunidades de expansão, incorrendo em um processo que estimula o crescimento e, portanto, a existência contínua.

Nesse contexto mais do que lucro, autoperpetuação significa evoluir e se manter de forma saudável no mercado e essa evolução tem um custo, que sai do lucro. O que eu quero dizer é que em qualquer negócio bem administrado, em empresas de qualquer porte, grande parte do lucro tem várias destinações, diferentes do bolso do dono, eles devem ser separados em vários fundos que garantam sua existência, tais como:

Fundo de marketing, necessário para realizar atividades que gerem o conhecimento das marcas, promovam o lançamentos de produtos e campanhas visando o aumento das vendas.

Fundo de desenvolvimento, permite a empresa no futuro realizar reformas, modernizar suas operações (novos computadores, comunicação visual, etc.).

Fundo de contingência, reserva para um evento incerto no futuro, que irá absorver perdas prováveis e estimáveis, como calamidades naturais ou greves, visando reduzir perdas, evitando que um prejuízo muito grande impacte na continuação da empresa.

Fundo de Pessoal, fundamental para gerar reservas que permitam arcar com despesas de pessoal imprevistas (demissões, processo trabalhistas, etc.) e como provisão para o pagamento de férias e benefícios (13º salário).

Isso tudo sem contar outras despesas e necessidades de qualquer empresa, como por exemplo, o pagamento de dividendos aos seus investidores, que fornecem subsidios para empresa crescer e por isso devem ser remunerados, e o correto pagamento de salários e benefícios, fundamental para que a empresa tenha a mão de obra adequada que a permita sobreviver e atingir seus objetivos, ou seja, são muitos gastos, muitas reservas, muitos investimentos que impactam nos resultados de uma empresa antes que seu empreendedor possa embolsar alguma coisa.

Conclusão

O empreendedorismo é diretamente responsável por produzir as riquezas de um país, implicando na abertura de novos negócios e consequente geração de empregos, na implementação de novas ideias, tecnologias e soluções para vários tipos de problemas. Na sua obra clássica , Teoria do Desenvolvimento Econômico, Schumpeter argumenta que os empreendedores são a força motriz do crescimento econômico, ao introduzir no mercado inovações que tornam obsoletos os produtos e as tecnologias existentes (destruição criativa), portanto sua importância não deve ser reduzida por conta de falácias ou preconceitos quanto ao sistema capitalista.

Qualquer empreendedor tem a necessidade de montar um negócio lucrativo, o que permitirá que ele se estabeleça, cresça e se sclidifique no seu mercado, e deste resultado é claro que ele deverá retirar sua remuneração, e isso não é, e nem deve ser um problema.

Chester Barnard (1968) em seu clássico livro sobre teoria organizacional afirma que empresas são um sistema formal de cooperação que para funcionar requerem um objetivo e um propósito que em alguns casos diferem entre os interesses da empresa e do indivíduo, ou seja, ela é formada por pessoas que são passíveis de erros que podem comprometer seus negócios, mas cada vez mais, o próprio mercado pune empresas que usam práticas condenáveis como trabalho escravo, aumento injustificado de preços, oportunismo, etc. e apoia a grande maioria de empresas, marcas e empreendedores que abraçam sua importante função social.

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Marcelo Dionisio
Business Drops

Coordenador Acadêmico da Scholar Corporate, Professor de Varejo, Marketing e Sustentabilidade & Doutorando do Coppead/UFRJ em Inovação Social.